Читать книгу Razão Para Se Apavorar - Блейк Пирс - Страница 9

CAPÍTULO TRÊS

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Nos dias seguintes, Avery seguiu tocando a área embaixo de seu queixo onde havia colocado a arma. Sua pele parecia irritada, como quando picada por um inseto. Sempre que se deitava para dormir e seu pescoço esticava quando sua cabeça encostava no travesseiro, aquela área parecia ficar exposta e vulnerável.

Ela precisava encarar o fato de que havia chegado ao fundo do poço. Mesmo que tivesse conseguido escapar, ela havia chegado lá. Para sempre, aquela seria uma lembrança, e parecia que seu corpo não queria que ela se esquecesse daquilo.

Nos três dias seguintes ao seu quase suicídio, Avery esteve mais depressiva do que nunca em sua vida. Passou aqueles dias jogada no sofá. Tentou ler, mas não conseguia se concentrar. Tentou motivar-se para correr, mas sentiu-se muito cansada. Seguiu lendo o bilhete de Howard, segurando-o por tanto tempo que o papel já estava gasto.

Avery parou de beber tanto após receber a carta de Howard. Devagar, como uma larva, começou a sair do seu casulo de auto-pena. Aos poucos, começou a se exercitar. Também fez palavras cruzadas e Sudoku, apenas para trabalhar a mente. Sem trabalho, e sabendo que tinha dinheiro suficiente para passar um ano sem se preocupar com nada, seria muito fácil tornar-se preguiçosa.

Mas a encomenda de Howard havia apagado sua letargia. Avery agora tinha um mistério para resolver, algo que se tornou uma tarefa. E quando Avery Black tinha uma tarefa, ela não parava até resolvê-la.

Uma semana depois de receber a carta, seus dias começaram a ter uma rotina. Ainda era a rotina de um eremita, mas ela estava se sentindo melhor. Avery estava sentindo que poderia haver algo pelo qual ela poderia viver. Desafios mentais sempre a inspiravam, e estavam lhe inspirando para as semanas por vir.

Suas manhãs começavam às sete. Ela saía para correr, fazendo um trajeto de três quilômetros ao redor da casa na primeira semana. Voltava para casa, tomava café da manhã e relia os arquivos de seus casos antigos. Tinha mais de cem em seu arquivo pessoal, todos resolvidos. Mas ela os relia apenas para se manter ocupada e para lembrar a si mesma que, mesmo com algumas falhas, ela havia tido sucesso na maioria dos casos.

Também passava uma hora por dia tirando suas coisas das caixas e as organizando. Depois, almoçava e fazia palavras cruzadas ou outro tipo de desafio. Então, fazia um circuito de exercícios no quarto—uma sessão rápida de abdominais, flexões, prancha e outros exercícios de core. Passava algum tempo vendo os arquivos de seu último caso—o caso que acabara com a morte de Jack e Ramirez. Alguns dias, olhava-os por dez minutos. Outros, por duas horas.

O que havia dado errado? O que ela tinha deixado passar? Ela teria sobrevivido ao caso se não fosse pela interferência de Howard Randall?

Então, era hora de jantar, ler um pouco, limpar um pouco mais a casa e, então, dormir. Era uma rotina sem muitos acontecimentos, mas ainda assim, uma rotina.

Avery levou dois meses para deixar a casa limpa e em ordem. Por fim, suas corridas de três quilômetros já haviam se tornado oito. Ela já não estava mais lendo os arquivos antigos ou os relatórios do último caso. Ao invés disso, estava lendo livros que tinha comprado na Amazon, com dramas e crimes da vida real e obras policiais de não-ficção. Também havia escolhido alguns livros com avaliações psicológicas dos assassinos em série mais famosos da história.

Avery não estava completamente ciente de que aquela era sua maneira de preencher o vazio que seu trabalho deixara. Quanto mais o tempo passava, mais ela imagina o que seria de seu futuro.

Em uma manhã, enquanto corria em volta do lago Walden, com o frio queimando seus pulmões e trazendo uma sensação mais prazerosa do que qualquer outra coisa, aquele pensamento a atingiu mais forte do que nunca. Sua mente estava cheia de perguntas sobre a encomenda de Howard Randall.

Primeiro, como ele sabia onde ela estava morando? Por quanto tempo ele sabia? Antes da encomenda, Avery imaginava que ele tinha morrido ao cair na água na noite que finalizou aquele terrível caso. Seu corpo nunca fora encontrado, mas a polícia acreditava que ele havia sido atingido por um tiro de um dos policiais antes de cair na água. Enquanto corria, Avery tentou pensar em uma lista de próximas passos para descobrir onde ele estava e porque ele tinha enviado aquela mensagem estranha: Quem é você?

A encomenda veio de Nova York, mas obviamente ele está perto de Boston. Como ele saberia que eu me mudei? Como ele saberia onde ou moro?

Aquilo, é claro, trouxe à sua mente imagens de Randall escondido entre as árvores e olhando para sua casa.

Que sorte a minha, ela pensou. Todo mundo na minha vida morreu ou me expulsou. Faz sentido que um assassino seja o único que pareça se importar comigo.

Ela sabia que a encomenda em si não traria respostas. Já sabia quando e de onde a caixa havia sido enviada. Era apenas Randall a provocando, fazendo-a saber que ele ainda estava vivo, à solta, e interessado nela de um jeito ou de outro.

A encomenda estava em sua mente quando Avery voltou da corrida. Ao tirar as luvas e a touca, com a bochecha rosa do frio, caminhou até onde havia deixado a caixa. Ela já tinha olhado a caixa inteira, procurando por pistas ou por significados escondidos deixados por Randall, mas não encontrara nada. Também não encontrara nada nas folhas de jornal amassadas. Havia lido todos os artigos no papel amassado, e nada parecia fazer sentido. Era apenas papel amassado. Mesmo assim, Avery havia lido e relido cada linha dos artigos várias vezes.

Ela estava mexendo ansiosamente na caixa quando seu telefone tocou. Pegou-o da mesa da cozinha e olhou o número na tela por um momento. Sorriu hesitantemente e tentou ignorar a alegria que tomou conta de seu coração.

Era Connelly.

Seus dedos congelaram por um momento porque, na verdade, ela não sabia o que fazer. Se ele tivesse ligado duas ou três semanas antes, Avery teria simplesmente ignorado a ligação. Mas agora... bom, algo era diferente agora, certo? E por mais que ela odiasse admitir, sabia que precisava agradecer a Howard Randall e sua carta por aquilo.

No último toque antes que a chamada caísse na caixa de mensagens, Avery atendeu.

- Ei, Connelly – ela disse.

Houve um silêncio do outro lado da linha antes que Connelly respondesse.

- Ei, Black. Eu... bom, eu vou ser sincero. Eu estava esperando falar com sua caixa de mensagens.

- Desculpe te decepcionar.

- Não, nada disso. Estou feliz em ouvir sua voz. Já faz um tempo.

- Sim, tem sido estranho.

- Devo entender que você se arrependeu de se aposentar tão cedo?

- Não, eu não diria tanto. Como vão as coisas?

- Vão... vão bem. Digo, tem um vazio na equipe que costumava ser preenchido por você e Ramirez, mas estamos nos virando. Finley está melhorando muito. Ele tem trabalhado muito próximo ao O’Malley. Acho que Finley, cá entre nós, levou a sério quando você saiu. Ele decidiu que se alguém fosse pegar seu lugar, seria ele.

- Bom ouvir isso. Diga a ele que eu sinto falta dele.

- Bom, eu esperava que você pudesse vir e dizer isso a ele pessoalmente – Connelly disse.

- Acho que ainda não estou pronta para uma visita – ela respondeu.

- Bom, eu nunca fui bom em conversa fiada – Connelly disse. – Vou direto ao ponto.

- É o que você faz de melhor – Avery disse.

- Olhe... temos um caso—

- Pode parar – ela disse. – Não vou voltar. Não agora. Provavelmente nunca, ainda que eu não possa negar totalmente essa possibilidade.

- Só me ouça, Black – ele disse. – Espere até ouvir os detalhes. Na verdade, você provavelmente já ouviu sobre ele. Está nos jornais todo dia.

- Não assisto jornal – ela disse. – Cara, eu só uso o computador para entrar na Amazon. Não me lembro da última vez que li uma notícia.

- Bem, é estranho demais e nós não estamos conseguindo entender. Eu e O’Malley bebemos até tarde ontem e decidimos que precisávamos ligar para você. Isso não se trata somente de eu puxando seu saco e tentando te convencer... mas você é a única pessoa em quem nós pensamos que poderia resolver essa. Se você não viu nos jornais, eu posso te contar o que—

- A resposta é não, Connelly – Avery disse, interrompendo. – Eu agradeço a ideia e o convite, mas não. Se um dia eu estiver pronta para pensar em voltar, eu vou te ligar.

- Um homem está morto, Avery, e o assassino pode não ter acabado seu serviço – ele disse.

Por algum motivo, ouvi-lo dizer seu primeiro nome a chamou atenção.

- Desculpe, Connelly. Por favor mande um oi para o Finley.

E então, ela desligou. Olhou para o telefone, perguntando-se se havia cometido um erro. Avery estaria mentindo se dissesse a si mesma que a ideia de voltar ao trabalho não era animadora. Até o fato de ouvir a voz de Connelly a fez ter saudades daquela parte de sua antiga vida.

Você não pode, disse a si mesma. Se você voltar ao trabalho agora, basicamente você estará dizendo a Rose que você não está nem aí para ela. E você estará correndo para os braços da criatura que te colocou onde você está agora.

Avery levantou-se e olhou pela janela. Olhou as árvores, as sombras, e então pensou na carta de Howard Randall.

E na pergunta de Howard Randall.

Quem é você?

Ela estava começando a achar que não sabia a resposta. E talvez estar longe do trabalho fosse o motivo.

***

Avery mudou sua rotina naquela tarde pela primeira vez desde que havia a estabelecido. Dirigiu até o sul de Boston, no cemitério de St. Augustine. Era um lugar que ela vinha evitando desde a mudança, não só pela culpa, mas também porque o destino parecia ter sido manipulado para forçar aquele golpe em sua vida. Ramirez e Jack estavam enterrados naquele cemitério, e ainda que estivesse a várias filas de distância, aquilo não importava para Avery. Para ela, o resultado de suas falhas estava representado no mesmo pedaço de grama.

Por isso aquela era sua primeira visita ao local desde os funerais. Ela ficou no carro por um momento, olhando para a lápide de Ramirez. Saiu do carro devagar e caminhou até onde o homem com quem ela teria se casado descansava. O túmulo era modesto. Alguém havia recentemente colocado um buquê de flores ali—provavelmente a mãe dele. Flores que morreriam no frio em poucos dias.

Avery não sabia o que dizer, mas imaginou que fosse normal. Se Ramirez soubesse que ela estava ali e se ele pudesse ouvir suas palavras (e Avery realmente acreditava naquilo), ele saberia que ela nunca fora a melhor com sentimentos. Provavelmente, seja lá onde ele estivesse, ele estava surpreso por ela estar ali.

Ela colocou a mão no bolso e puxou o anel que Ramirez pretendia entregá-la.

- Saudades de você – disse. – Sinto sua falta e estou... perdida. Não preciso mentir para você... não é só porque você se foi. Não sei o que fazer. Minha vida está destruída e a única coisa que poderia deixar tudo estável de novo—o trabalho—é provavelmente a pior ideia.

Avery tentou imaginar ele ali, a seu lado. O que ele diria? Ela sorriu ao imaginar ele franzindo a testa, de seu jeito sarcástico. Ligue o foda-se e entre nessa. Ele diria isso. Volte ao trabalho e faça o que você quer da sua vida.

- Você não está ajudando – Avery disse com sua própria expressão de sarcasmo. Ela assustou-se um pouco ao perceber o quão natural era conversar com a lápide de Ramirez. – Você me diria para voltar ao trabalho e ver o que acontece, não é?

Avery olhou para o túmulo, como se estivesse esperando uma resposta. Uma lágrima caiu de seu olho direito. Ela a secou e virou-se, na direção do túmulo de Jack. Ele havia sido enterrado no outro lado do cemitério, em uma lugar que ela mal podia ver dali. Caminhou pelo caminho estreito e aproveitou o silêncio. Não deu atenção às outras poucas pessoas que estavam ali, deixando-os também aproveitar sua privacidade.

No entanto, ao se aproximar do túmulo de Jack, Avery viu alguém parado ali. Era uma mulher, pequena e com a cabeça baixa. Com mais alguns passos, Avery viu que era Rose. Suas mãos estavam nos bolsos e ela vestia um moletom com touca, que cobria seu rosto.

Avery não queria chamá-la, esperando poder chegar perto o suficiente para que elas pudessem conversar. Mas depois de mais alguns passos, Rose pareceu sentir que alguém estava se aproximando. Ela virou-se, viu Avery, e imediatamente começou a se afastar.

- Rose, não seja assim – Avery disse. – Podemos conversar só um minuto?

- Não, mãe. Senhor, como você consegue estragar até isso?

- Rose!

Mas Rose não tinha mais nada a dizer. Ela acelerou seus passos e Avery fez o possível para não segui-la. Mais lágrimas caíram de seu rosto quando ela virou sua atenção para o túmulo de Jack.

- De quem ela puxou essa teimosia? – Avery perguntou ao túmulo.

Assim como Ramirez, obviamente a lápide de Jack estava em silêncio. Avery virou-se para a direita e viu Rose se distanciando. Ela caminhou rapidamente, até sumir completamente ao longe.

Razão Para Se Apavorar

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