Читать книгу Marido e mulher - Lindsay Armstrong - Страница 5
Capítulo 1
ОглавлениеDamien Moore era alto, moreno e não parecia impressionado, pensou Lee Westwood ao ver como Damien arqueava uma sobrancelha, depois de a estudar exaustivamente. Enquanto se sentava numa cadeira que ele apontava com um gesto displicente, pensou que o seu movimento não era tão elegante como o dos que trabalhavam no refeitório da Moore & Moore. Trazia umas calças novas, apertadas, umas botas castanhas e uma blusa verde que tinha escolhido cuidadosamente para combinar com os seus olhos. O cabelo, brilhante, estava apanhado, como sempre. Há muito tempo que não se preocupava em se arranjar.
A única nota discordante era a sua velha mala, que pendurou nas costas da cadeira. Tinha-se esquecido de a trocar por outra mais elegante.
Por outro lado, também esperava que o sócio maioritário da Moore & Moore fosse mais velho. Aquele homem devia ter trinta e poucos anos, pensou. Também não esperava que fosse tão atraente. Magro, ombros largos, vivos, olhos escuros, expressão inteligente e um inegável ar de autoridade. Embora a autoridade fosse algo de esperar, pensou, enquanto ele se sentava atrás da mesa.
De todas as formas, não ia permitir que aquele homem a intimidasse.
– Preciso de apoio legal, senhor Moore – disse Lee, calmamente.
Ele recostou-se na cadeira e cruzou os dedos.
– Pelo que me apercebi, foi isso que comunicou à minha secretária em repetidas ocasiões – comentou ele, secamente.
– Não é fácil marcar um encontro consigo – replicou Lee. – É óbvio que se valoriza demasiado, senhor Moore – acrescentou de uma forma cortante.
Um leve brilho de diversão iluminou os escuros olhos do homem, por um momento.
– Os meus honorários não são baixos, desde logo, mas se isso é um problema, não entendo por que é que insistiu tantas vezes em ver-me, senhora… – disse consultando a ficha que tinha em frente – Westwood.
– O caso, senhor… Moore – disse Lee burlescamente, – é que investiguei e parece que você é o melhor. Tão simples quanto isso – concluiu e encolheu os ombros. – No que se refere a honorários, tenho poupanças que devem ser suficientes – acrescentou.
Damien Moore resistiu à tentação de sorrir, enquanto estudava a ruiva atrevida que tinha diante de si. É verdade que tinha tornado a sua secretária louca, pelo que deduziu que o mais sábio seria desfazer-se dela antes que o deixasse a ele também louco. Mas como ia fazer isso a uma rapariga com uns 23 anos que parecia ter todas as suas poupanças numa carteira velha?
Damien ergueu-se na cadeira.
– De acordo, senhora Westwood. Conte-me o problema em que se meteu.
– Não me meti em nenhum problema – disse Lee, dorida. – Cumpro sempre a lei.
– Então, por que é que está aqui? – perguntou ele com impaciência.
– Os meus avós… – começou ela, mas deteve-se para ordenar as ideias. – Convenceram-nos que investissem todas as suas poupanças num plano de investimento duvidoso. Não só não receberam nada em troca do seu dinheiro, como também o responsável desapareceu.
Damien Moore pegou na sua caneta de prata. Parecia céptico.
– Em primeiro lugar, por que é que não vieram os seus avós em pessoa?
– Eles… são boa gente. Quando os meus pais morreram num acidente de carro, eles encarregaram-se de mim. Eu tinha seis anos. Mas… são pouco vividos – explicou ela. – Suponho que foi essa a razão pela qual se deixaram enganar. No entanto, tenho a intenção de recuperar todas as suas poupanças.
– Já vejo. Aí é onde eu entro, suponho.
– Para ser sincera – admitiu Lee, – esperava consegui-lo sozinha. Mas não tive sucesso.
– Que meios usou para recuperar as poupanças dos seus avós? – perguntou ele.
Lee entrelaçou os dedos e demorou algum tempo a responder.
– Primeiro fui à polícia, mas disseram-me que era um assunto civil. O contrato protegia o responsável do plano, por isso eu… acampei um par de vezes à porta da sua casa com uma tabuleta.
«Não te rias, Damien Moore», disse a si mesmo.
– Na porta da casa do homem que supostamente enganou os seus avós?
Lee concordou.
– O que dizia a tabuleta?
Lee afastou o olhar.
– Tinha comentários pouco abonatórios acerca da sua integridade.
– E ele o que fez?
Lee olhou para Damien novamente. «Tenta não parecer envergonhada», pensou ele, «mas também projecta uma imagem de dignidade juvenil».
– Um membro da sua equipa ameaçou-me com uma ordem de restrição.
Damien não conseguiu evitar um sorriso.
– Não me surpreende! Pensava que tinha dito que você cumpria a lei, senhora Westwood. Não sabe que não pode andar por aí com uma tabuleta a pôr em causa a integridade das pessoas?
– Sei que é um burlão – disse Lee. – E um ladrão! Como se sentiria se os seus avós estivessem na mesma situação? – perguntou furiosa.
– De acordo – disse Damien, escrevendo algumas notas no caderno que tinha à sua frente. – Quem é o homem em questão?
– Cyril Delaney.
Damien soltou a caneta e engasgou-se surpreendido.
– Está a brincar?
– Não.
– Senhora Westwood, Cyril Delaney é um homem de negócios muito respeitado e com um historial impecável. É pouco provável que se dedique a enganar indefensos pensionistas.
– Tenho um documento assinado por um C. Delaney. Os meus avós garantiram que o homem se chamava Cyril Delaney e asseguraram que foi o historial impecável – disse Lee ironicamente, – o que os enganou. O que tem a dizer em relação a isto, senhor Moore?
– Que provavelmente foi alguém disfarçado de Cyril Delaney – respondeu ele.
– Então, tem um sósia – replicou Lee.
Damien franziu a sobrancelha.
– Está a falar a sério, senhora Westwood?
– Realmente pensa que teria ficado tão incomodada se assim não fosse, senhor Moore? Só para marcar um encontro consigo gastei uma fortuna em chamadas telefónicas.
Damien observou-a em silêncio durante um bocado e, depois, encolheu os ombros.
– Nunca chegou a conhecer Cyril?
– Não.
– Mandou-lhe alguma nota escrita?
– Sim, mas não recebi resposta. Apesar de que, se for culpado, não responderia, certo?
Damien Moore brincou pensativamente com a caneta sobre a mesa.
– Talvez a tenham interpretado como uma acusação falsa – disse ele. Pareceu tomar uma decisão. – De acordo, mostre-me o documento.
Lee tirou-o da mala e entregou-o.
– O que está a pensar? – perguntou ansiosa quando acabou ele de o ler.
– Que noventa por cento da população nunca lê a letra pequena. No entanto, acredito que haja indícios de fraude, por isso vou escrever a Cyril Delaney informando-o da existência deste documento, tal como da presumível fraude.
– E depois?
– É tudo o que posso fazer de momento – disse Damien.
– E se o ignora como me ignorou a mim?
Damien arqueou as sobrancelhas.
– Duvido que isso aconteça, senhora Westwood.
Lee não parecia convencida.
– Realmente quero enfrentar-lo e esclarecer tudo isto – disse ela com veemência.
– Sim. Não sei por que é que não me surpreende, mas terá que ter um pouco de paciência. Iremos passo a passo, a não ser que queira contratar outro advogado. Por isso, dê-me mais pormenores, como por exemplo como devo contactá-la…
Lee acedeu, até que lhe pareceu óbvio que ele queria conhecer praticamente toda a história da sua vida.
– Não me vou embora da cidade sem pagar os seus honorários – disse orgulhosa.
– Deus nos livre! – murmurou ele e levantou-se. – De momento, deixe isto comigo. Entrarei em contacto consigo quando tiver uma resposta.
Lee também se levantou, mas não lhe apertou a mão que ele oferecia.
– Isso é tudo?
Damien arqueou uma sobrancelha e fez uma pausa.
– Tinha algo em mente?
Por um momento, Lee interpretou mal o significado. Inclusive, abriu a boca para lhe dizer que tinham provas mais que suficientes para escrever a Cyril Delaney, mas apercebeu-se que ele passeava o olhar pelo seu corpo de uma forma inconfundível.
Ao compreender o verdadeiro significado da pergunta, Lee foi fulminada por uma poderosa sensação de impotência que se apoderou dela. Como se atrevia aquele homem a pensar que ela estava a sugerir algo, ou que tivesse algum interesse pessoal nele?
– Enganou-se na mulher, senhor Moore – disse friamente. – Se está a insinuar o que penso.
Damien parecia divertido.
– Não seria a primeira vez que acontece, senhora Westwood. E, agora, se me desculpa, tenho um encontro para jantar – disse ele e chamou a sua secretária, que imediatamente abriu a porta convidando Lee a sair.
Duas semanas mais tarde, Damien Moore estacionou o seu Porsche azul metalizado à porta do seu restaurante favorito, num bairro residencial de Brisbane. Ao sair do carro, uma rapariga vestida com umas jardineiras e um gorro preto atravessou-se no caminho. Só quando a jovem tirou o gorro e o cabelo caiu sobre os seus ombros é que Damien se apercebeu que era Lee Westwood.
Ele parou e suspirou.
– Ah, é você? Do grupo de Operações Especiais?
– Se se refere à minha figura – disse Lee com dignidade, – é a minha roupa de trabalho. Sou jardineira, lembra-se? E, no que respeita à minha presença – continuou ela olhando à sua volta – como não podia contactar consigo por telefone, decidi investigar um pouco e averiguei que hoje vinha aqui.
Damien Moore amaldiçoou-a em voz baixa.
– A razão pela qual não conseguiu contactar-me é porque não tenho notícias para si, como a minha secretária lhe deve ter dito.
– Já lá vão duas semanas! – protestou Lee. – Se Cyril Delaney pensasse responder, já o teria feito.
– Ouça…
– Não. Ouça-me você, senhor Moore – interrompeu ela. – Os meus avós tiveram que hipotecar a casa para aumentar a pensão e está a ser complicado para eles pagarem as duas coisas. Se não faço nada, perdem a casa, enquanto você come em restaurantes caros, sem nenhuma preocupação. À custa dos honorários que estou a pagar.
– Duvido – disse ele com uma mistura de impaciência e resignada diversão. De repente, pareceu tomar uma decisão. – De acordo. Venha comer comigo.
Lee olhou por cima do ombro. Parecia que ele se dirigia a um restaurante caro e de luxo.
– Aqui? – perguntou com cautela.
– Sim. Tenho uma mesa reservada.
– Mas não trago roupa adequada. Um pouco mais abaixo há um restaurante de comida rápida…
– Nem pensar, senhora Westwood. Ou aqui, ou nada.
Lee mordeu o lábio e olhou para Damien. Pareceu-lhe ver que os seus escuros e inteligentes olhos a desafiavam…
– De acordo – disse ela. – Com uma condição: eu pago a minha comida.
– Porquê?
– Não quero dever-lhe nada, senhor Moore.
– Já veremos – disse ele, sorrindo.
Lee duvidou, mas teve a sensação de que se continuasse a discutir com ele, deixá-la-ia ali sozinha.
– É um homem teimoso – disse ela e, inspirando profundamente, entrou à frente dele no restaurante.
Cinco minutos mais tarde, Lee tinha um copo de vinho na mão e tinha pedido torta com espinafres e salada, o mais barato do menu.
– Tem a certeza? – perguntou ele. – Não precisa ficar com fome…
– Tenho a certeza – disse ela com firmeza. – Gosto de torta de espinafres e adoro salada.
Damien encolheu os ombros e pediu carne assada.
– É um sítio muito bonito – comentou Lee, olhando à sua volta. – Não tenho a certeza se foi por ter entrado consigo, mas parece que ninguém se fixou na minha roupa.
Ele olhou para ela ironicamente.
– Sou um cliente habitual.
– Se tivesse vindo sozinha, a situação teria sido diferente – disse ela divertida.
– Para dizer a verdade, você entrou de uma forma impressionante, como se fosse a rainha de Saba – disse ele. Lee sorriu.
Enquanto comiam, Damien passou habilmente pelo tema que tanto fascinava Lee: a horticultura. Durante um bocado falaram sobre isso, até que o telemóvel de Damien soou discretamente. Ele pareceu angustiado, mas respondeu à chamada. Quando acabou de falar, olhou para Lee de forma enigmática.
– É o seu dia de sorte, senhora Westwood.
– Porquê?
– Acabam de me comunicar que Cyril Delaney concorda em realizar uma reunião connosco.
Aquilo teve um efeito imediato sobre Lee. Ergueu-se na sua cadeira e olhou para ele.
– Finalmente, chegamos a algo! Quando? Onde?
Antes de responder, Damien Moore surpreendeu-se a si mesmo sentindo-se de novo intrigado por aqueles olhos verdes. De facto, admitiu que havia algo mais naquela ruiva do que inicialmente tinha outorgado. Apesar de ser teimosa e persistente, não era aborrecida, pensou. Tinha vitalidade, sentido de humor e, em certas ocasiões, uma dignidade que emocionava. Mas aquilo não devia significar um tratamento distinto em relação a outros clientes. Ou sim? Não…
– Dentro de dois dias na sua casa – disse ele, interrompendo os seus próprios pensamentos. – Não se encontra bem, daí a demora da resposta. Também solicitou a sua presença na reunião – acrescentou, olhando para a comida pensativamente.
Lee afastou o seu prato.
– Por que é que você parece não estar de acordo? – perguntou, franzindo a sobrancelha. Damien olhou-a nos olhos.
– Porque você tem um historial de comportamento difamatório para com ele, por isso tenho a minhas reservas. Tenho sérias dúvidas de que saiba comportar-se na reunião, senhora Westwood.
– Senhor Moore. Isso dependerá do comportamento de Cyril Delaney.
– Temia precisamente isso – disse ele com um tom burlesco. – O seu historial só servirá para a colocar numa situação mais vulnerável.
– Não se preocupe. Há sempre um momento em que é preciso falar sem rodeios. Por isso, não serei mal educada, serei sincera.
– Mal posso esperar – murmurou Damien e acabou a sua comida.
Serviram o café e um prato com quatro esquisitos bombons. Lee escolheu um e comeu-o com deleite. Depois, deu umas palmadas no estômago e suspirou satisfeita.
– Desde logo, foi melhor do que tinha pensado comer hoje. Mas temo que tenho de o abandonar, senhor Moore – disse ela olhando para o relógio. – A minha hora para comer está quase a terminar. Importava-se de pedir contas separadas?
– Claro que me importo.
– Mas tínhamos combinado…
– Não tínhamos combinado nada – interrompeu ele.
– A sério, quero pagar o meu almoço.
– Talvez sim – disse ele. – Mas pense na minha reputação, por um momento.
– O que tem isso a ver?
– Não costumo permitir que os meus convidados paguem. Sobretudo se são mulheres.
Damien tinha uma expressão séria, mas os seus olhos espelhavam um sentimento completamente oposto.
– Para começar, acho que não pertenço à categoria de convidada – disse ela, após pensar um momento.
– Eu convidei-a.
– Não lhe dei opção – disse e fez um gesto de impaciência com a mão.
– Bem, isso é algo que não esperava de si.
– Deixe-me terminar – ordenou. – Em segundo lugar, não sou…
– Uma mulher?
Lee rangeu os dentes perante aquele comentário.
– Claro que sou, o que não sou é um encontro. Ouça, o que não gosto é que me trate com condescendência.
– Bem pelo contrário – disse Damien arrastando as palavras. – Desfrutei da minha comida mais do que tinha imaginado, graças a si. Por isso, o mínimo que posso fazer é convidá-la.
Lee olhou para ele sem saber o que dizer. Os seus verdes olhos espelhavam confusão.
– A sério?
– Dou-lhe a minha palavra.
– E por que é que desfrutou tanto?
– Você é uma caixa de surpresas – contestou Damien, encolhendo os ombros. – Gosto de si. Mas não discutamos mais sobre quem paga – terminou e levantou-se.
Mas Lee tardou uns instantes em fazer o mesmo, porque, enquanto observava a imponente figura de Damien Moore, um pensamento surpreendeu-a, algo que quase lhe tirou o alento: podia uma mulher apaixonar-se por um homem enquanto comiam num restaurante?
Às duas horas da madrugada, Lee desistiu de tentar dormir e preparou uma chávena de chá. Ainda estava surpreendida e sem poder compreender o pensamento que a tinha assaltado, justamente antes de sair do restaurante. De onde surgia? O que o tinha propiciado? Se apenas tinha visto aquele homem duas vezes!
Mas apesar de poder encontrar respostas para aquelas perguntas, de que é que serviria? Interrogou-se.
Nada mudaria o facto de que tinha ficado sem palavras, enquanto saiam para o exterior e ele lhe perguntava onde tinha estacionado. Ela apontou para o carro e Damien escoltou-a até ele.
Agradeceu pela refeição e combinaram encontrar-se dois dias depois para falarem com Cyril Delaney, mas a espontaneidade tinha-a abandonado. Só estava consciente do homem que tinha a seu lado.
Tinha desfrutado da comida e da companhia muito mais do que tinha imaginado, porque ele tinha feito um esforço visível para lhe agradar.
Mas, por outro lado, seria tão surpreendente que ele provocasse aquela sensação nela? Que rapariga não teria sentido o mesmo com um homem de imponente figura, atraente e encantador?
Aí estava o problema, pensou Lee. Ela era apenas mais uma da longa lista, sem dúvida alguma.
Suspirou e decidiu que a última coisa que devia fazer era permitir que Damien Moore pensasse que tinha razão como no primeiro dia no seu escritório. Mentalmente pensou que aquela era a segunda vez em que ficava alerta.
– Está melhor?
– Sim. Obrigado – disse Lee aguardando o lenço.
Estavam num hotel próximo da casa de Cyril Delaney e ela estava a beber um conhaque.
Apesar de não ter desatado a chorar à porta da casa de Cyril, não tinha dúvidas de que tinha os olhos carregados de lágrimas e estava profundamente consternada. Até ao ponto que Damien teve de a meter no carro e tinha procurado aquele café tranquilo.
– Lamento – disse ela, bebendo o seu conhaque. – Além do desgosto, sinto-me culpada. Parecia tão velho e frágil… não acredito que tenha sido ele, mas acusei-o – disse e ficou muda. Moveu a cabeça em sinal de desespero.
– Entendo – murmurou Damien. – Mas tens razão. Não pode ter sido ele, embora não o soubesses.
– Então, quem foi? – inquiriu ela, olhando-o fixamente. – E por que é que tive a sensação, no último momento, de que algo do que disse o fez parar para pensar?
Damien olhou para o seu copo pensativamente e franziu a sobrancelha.
– A mim também me pareceu, mas… – interrompeu, encolhendo os ombros. – Talvez nunca saibamos quem foi.
– E, agora, o que fazemos?
– Só podemos fazer uma coisa: passar o caso para a polícia.
– Disse-lhe que já o tentei.
– Sim, mas agora sabemos que a pessoa que fez o contrato utilizou um nome falso. Isso poderia ajudar.
Lee não respondeu.
– Se quiseres eu faço isso – ofereceu-se Damien.
Ela olhou para ele e sorriu. Ao mesmo tempo, um dos últimos raios de sol entrava pela janela e formava uma aureola de luz à volta da sua cabeça. Ainda estava pálida, reparou Damien, por isso a mágoa notava-se mais.
Lee cruzou os braços e inspirou profundamente.
– Obrigado. Mas a verdade é que não posso continuar a pagar os seus honorários, por isso faço-o eu mesma, senhor Moore.
– Chama-me Damien – contestou ele. – Não te preocupes, não te vou cobrar.
– Não quero caridade. Mas obrigado de qualquer forma.
– Não podes fazer nada para me impedir.
Ela olhou para ele fixamente.
– O que queres dizer? – perguntou Lee com cautela.
– Os cidadãos têm a obrigação de denunciar delitos graves. E é isso que farei – contestou ele e encolheu os ombros. Além disso, algo no olhar disse a Lee que não aceitaria um «não» como resposta. – Assim, não precisas sentir que me deves algo, Lee.
Ela abriu a boca para discutir, mas ele sorriu de forma tão sincera que sentiu perder todas as suas forças e não conseguiu pensar em mais nada.
– Solucionado – disse Damien e olhou para o relógio. – Se te sentes melhor, levo-te até ao carro. Ainda não está tudo perdido, Lee. – acrescentou depois de olhar fixamente para ela, por um momento.
– Estás a fazer isto tudo porque Cyril te pediu que cuidasses de mim? – perguntou ela. – E por que é que disse isso?
Damien arqueou uma sobrancelha.
– Quem sabe? Eu diria que admirava a tua valentia e sentiu pena das dificuldades dos teus avós. – acrescentou depois de hesitar por um instante.
Damien levantou-se e Lee fez o mesmo. Parecia aturdida.
Enquanto passava uma mão à volta do braço de Lee e saíam dali, Damien Moore analisou aquele momento de dúvida e apercebeu-se de que não tinha a certeza de que o que acabara de dizer, fosse toda a verdade.
Pareceu-lhe que depois das afirmações de Cyril, enquanto se iam embora, havia algo mais. Pareceu-lhe que tomava uma decisão em relação a Lee e a ele próprio, mas não imaginava do que se tratava.
A não ser que… Cyril se tivesse apercebido do ligeiro sentimento de protecção que ele, Damien, tinha começado a sentir pela sua cliente.
Uma vez na rua, Damien parou e observou Lee à luz do dia. Obviamente tinha recobrado a compostura e, apesar de continuar pálida, interrogou-se quanto tempo mais permaneceria tão calada. Não teve que esperar muito.
– Muito obrigado por tudo, senhor Moore – começou a dizer Lee. – Eu…
– Chama-me Damien.
Um fugaz reflexo de exasperação nublou o olhar de Lee.
– Agradeço a tua ajuda – continuou, – mas…
– Entra no carro, já estou atrasado – disse ele abrindo a porta do Porsche.
– Mas é que…
– Não tens que dizer nada. Volta para as tuas flores e deixa que me encarregue disto – afirmou Damien, acariciando-lhe a cabeça.
Lee mordeu o lábio. Sentia-se exasperada e confusa. Cinco minutos mais tarde, estava metida no seu próprio carro e quase a partir.
– Estaremos em contacto – disse Damien e foi-se embora, deixando-a cheia de sentimentos desencontrados.
Damien manteve a sua palavra.
Ao longo das semanas seguintes, telefonou várias vezes e, numa ocasião, convidou-a para tomar o pequeno-almoço no seu apartamento para a deixar ao corrente dos progressos que estava a fazer.
Também a convidou para jantar e explicou-lhe que seria um processo longo, porque quem quer que tenha utilizado o nome de Cyril Delaney, tinha tido o cuidado de não deixar pistas.
Durante aqueles encontros, Lee conseguiu ocultar os distintos sentimentos que Damien lhe inspirava. Inclusive, pareceu-lhe que tinha conseguido voltar ao seu papel de ruiva perspicaz e deixado para trás a rapariga triste e confusa da reunião com Cyril. A mulher que se tinha sentido exasperada pela prepotência de Damien e, ao mesmo tempo, tinha imaginado o maravilhoso que seria que Damien cuidasse dela…
Um mês mais tarde, Lee leu que Cyril Delaney tinha morrido após doença prolongada, sentiu-se triste. Mas três dias depois, quando Damien telefonou para comunicar que os dois figuravam no testamento de Cyril, não soube definir os seus sentimentos.