Читать книгу Vida De Hospedeira - Marina Iuvara - Страница 12
ОглавлениеA adolescência
Desde jovem, o facto de ter sempre pouco tempo à minha disposição foi motivo de sofrimento porque me sentia como prisioneira dos poucos espaços pessoais e dos breves momentos de liberdade concedidos, pois que devia atentamente e absolutamente respeitar os horários impostos.
Não era dona do meu tempo.
Recordei que até aos dezoitos anos o meu horário de regresso, nos poucos sábados de noite em que me tinha permitido de sair, era no máximo as vinte e duas e trinta.
Os meus amigos reuniram-se as vinte e uma para decidir onde ir comer, implacavelmente estávamos todos sentados à mesa não antes das vinte e duas.
Tinha sempre pressa, ficava nervosa se o empregado de mesa demorava chegar, não conseguia desfrutar da companhia dos outros porque sabia que deveria regressar muito cedo.
Tinha-me concedido apenas o tempo para fazer o pedido, esperando num célere serviço que me permitisse pelo menos de saborear aquela pizza, ainda que tinha perdido o apetite porque o meu estômago começava a ficar tenso e os sucos gástricos a misturar-se de novo pela agitação.
Seja como for, eu levantava-me da mesa já perfeitamente atrasado para chegar em casa à hora combinada.
Era sempre difícil convencer alguém para acompanhar-me interrompendo o jantar, mas o horário de regressar era incontornável e categórico e eu não possuía nenhum meio de transporte.
Durante o trajecto até a casa não era observado nenhuma proibição de velocidade, sob o meu inconsciente suplicável pedido.
Muitas vezes a luz vermelha dos semáforos era superada com desconsiderada inconsciência.
Tinha pavor da velocidade no carro, e tudo até agora. Via passar rápido como uma flecha, como dentro de um pesadelo, aquelas luzes nocturnas; os faróis dos outros carros e aqueles lampiões passavam muito veloz aos meus olhos.
Era o preço a pagar para evitar as humilhações e ferozes reprimendas ao meu regresso; se apenas tivesse arriscado em falhar, teria encontrado a porta de casa fechada por dentro e eu teria sido forçada a inventar alguma desculpa para tentar de não ver aquela careta ameaçadora no rosto do meu pai, irritado pela minha desobediência, da falta de respeito, mas também preocupado certamente.
Intimidação, punição e censura manifestavam-se repetidamente com gritos, bofetadas e novas mais rígidas proibições.
Tudo isto mesmo até mesmo por atraso de poucos minutos.
Poucos minutos.
Sem dúvida papá foi bastante severo.
Lembrei o dia em que estava felicíssima de ter tido a permissão para poder participar à festa de aniversário da minha melhor amiga, foram dias que procurava persuadi-lo.
Lá terei encontrado um miúdo, um colega da turma que me agradava muito.
Mesmo prestando atenção que o meu vestuário tomasse em consideração as preferências paternas, ou talvez seria melhor dizer rigores, pois a saia não muito curta, roupas não justas e sapatos sem o salto alto, resolvi de experimentar uma bolsinha de toilette para maquilhagem que me tinham oferecido.
As minhas mãos inexperientes exageraram ao pincelar nas bochechas aquele pó de arroz tão rosa e tão agradável aos meus olhos, e aquele batom tão brilhante, tão vermelho nos meus lábios deixava sentir-me mais linda, um toque de rímel teria completado a obra.
Tinha dezasseis anos e aquela maquilhagem resultou horrível aos olhos do papá, inadequado para a sua filha que tinha tentado de transparecer à uma miúda bastante sedutora.
Irritado, friccionou a sua mão com força sobre a minha boca distribuindo o batom sobre as bochechas para tentar desfazer aquilo que tinha cuidadosamente pintado na minha cara.
Os meus olhos começaram a lacrimejar e uma auréola negra formou-se nas minhas pálpebras já inchadas pelo choro; espelhei-me na casa de banho e vi a máscara de um palhaço.
Depois de me ter lavado com sabão que queimava os olhos, mas que tirou todas as manchas residuais do rímel e do batom, tive finalmente a permissão para poder participar e fui àquela muito esperada festa um pouco avermelhada e tímida, mas desprovida de maquilhagem.
Não consegui divertir-me.
Naquele período de adolescência que eu teria desejado fugir, ir para longe, partir, viajar, viver sozinha.
Os sonhos, armados de teimosia e força de vontade, realizar-se-ão, não sempre, mas percebi naquele dia, onde e quando nascem.
Pouco a pouco, dia após dia, mês após mês, ano após ano, sabia notícias importantes e experiencias necessárias para conseguir relacionar-me melhor com os meus colegas e com os passageiros que tinham personalidade e características multiformes e heterogéneas.
Imediatamente compreendi, todavia, que a organização base da minha vida decidia-se no fim do mês, através da esperada, sempre com muita impaciência, folha de turnos: uma tabela aparentemente anónima e fria que torna notável a programação laboral do mês sucessivo.
A companhia aérea inseria as comunicações oficiais nas caixas pessoais, uma espécie de fileira de infinitas caixinhas postais colocadas numa sala digna de um filme policial junto do aeroporto, ultimamente substituído através dos e-mails.
A folha de turnos, almejado mês após mês, causava-me ânsia, muitas vezes entusiasmo e grandes expectativas, as vezes desilusões por aqueles repousos, aqueles voos requeridos, aquelas ambiciosas férias pedidas que não eram sempre aceites.
Todos os compromissos, as dedicações, os casamentos dos quais poderia ser mesmo a testemunha, as eventuais finais das partidas de futebol de salão, os bilhetes reservados para a primeira fila no teatro, o adeus à vida de solteira da minha melhor amiga, o aniversário de um eventual namorado, o almoço de Natal, o aniversário dos meus pais, a semana de time sharing na montanha, o curso de tango das quintas-feiras a tarde tinham com frequência muito poucas possibilidades: a participação em todos os eventos devia de cada vez adequar-se às decisões tomadas pelo computador da Companhia do grupo de trabalho.
A partir daquele momento era possível aceitar ou declinar convites, tomar notas importantes, estabelecer horários desestabilizadores para ir ao ginásio, dar saltos mortais para chegar a tempo em qualquer lugar, ou chegar, mesmo atrasado, na reunião do condomínio, dizer adeus ao torneio de trunfo, mas em compensação ter a satisfação de ver Gigi Marzullo, acordados como lebres dado o fuso horário.
Os dias de descanso num mês eram mais ou menos dez, enquanto para os residuais vinte usava-se uniforme.
Eu, Eva, Valentina e Ludovica esperávamos sempre de ter horários e dias de partidas escalonados um do outro, seja para ter maior espaço em casa, como para uma melhor organização dos tempos sobre o principal inconveniente: estadia prolongada na casa de banho.
Era fácil que um voo iniciasse muito cedo de manhã e o despertador, à madrugada, programava-se habitualmente uma hora antes.
Depois do café da manhã rapidíssimo e um bom duche fortalecedor, usava-se o uniforme preparado no dia anterior, verificando se os sapatos estivessem polidos e as meias não estivessem desbotadas pelas lavagens ou danificadas.
Grande parte de nós tinha um segredo inconfessável: a camisa era usada dentro das horríveis meias calças, frequentemente graduadas para evitar o surgimento das veias varicosas e inchaços devidos à pressurização, porque só assim se podia evitar a saída da blusa da saia quando eram levantados os braços para arrumar as bagagens ajudando os passageiros.
Por baixo da saia era invisível!
Ajeitada a roupa, passava-se à maquilhagem cuidada, nos preocupava que os cabelos estivessem em ordem, depois se controlavam os documentos.
Na carteira de mão não deviam faltar o escapulário de voo, lanterna, caderneta de anúncios, manual operativo, meias de reserva, sapatos com salto raso para os percursos mais longos, luvas de pele para calçar. No aeroporto em Crew Briefing Center, centro de recolha de todas as tripulações, em cada uma das salinhas reservadas começava precisamente o briefing.
Reunia-se para conhecer a tripulação, apresentava-se, discutia-se sobre as questões críticas que manifestam uma crise do voo, sobre as condições meteorológicas, vínhamos informados sobre os aspectos comerciais, sobre o tipo de serviço e sobre os passageiros que estariam a bordo.
O enquadramento era quase tipo militar, existia uma hierarquia e como tal devia ser respeitada.
O chefe de toda a tripulação era o comandante, depois o co-piloto, a seguir os assistentes de bordo, no que diz respeito ao serviço fornecido e a relação com os passageiros, tinham como ponto de referência o responsável do próprio sector de trabalho que colaborava com o chefe da cabina, o qual dirigia o andamento do voo e mantinha os contactos com o cockpit, a cabina de pilotagem, isto é os pilotos.
No fim do voo, cada assistente era submetido a um juízo escrito e comparado, onde eram avaliados o profissionalismo, as competências técnicas, o conhecimento da língua estrangeira, a assistência dada aos passageiros e se o aspecto estético estava em conformidade com as normas.
E foi desta forma que os anos passaram, voo após voo, encontros acima de encontros, fusos horários e noites sem dormir, línguas diferentes entre elas, países tórridos e continentes gélidos, comidas condimentadas com especiarias e sabores delicados, céus serenos e turbulências impensáveis.