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(† 3 de Novembro de 1897.)

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Dedicando á memoria do barão d'Itajubá este ensaio, o primeiro de uma serie sobre a nossa historia no exterior, desejo relembrar esse amigo, que durante trez saudosos annos foi meu chefe na Legação em Berlim, e cuja morte prematura significou para a diplomacia brazileira, n'aquelle momento, a perda do seu mais completo representante.


Digo completo, porque elle reunia á finura da intelligencia e á pratica dos negocios, a distincção das maneiras e a formosura do caracter. Pode-se de certo ser um grande diplomata sem o ultimo predicado: o já classico exemplo de Talleyrand ahi está para proval-o. A experiencia dos negocios pode ser supprida pelos rasgos de genio: Napoleão, aos 28 annos, dirigia as negociações de Campo Formio com a pericia consummada que Albert Sorel nos descreveu em um bello trabalho. Itajubá era porem o equilibrio moral em pessoa. N'elle algumas qualidades se não haviam desenvolvido extraordinariamente á custa d'outras. Methodico em extremo, a chancellaria era o seu templo, o expediente o seu sacerdocio, sem que comtudo a rotina o tornasse imbecil, ou sequer a burocracia lhe desmanchasse a linha fidalga. A certa hora aquelle funccionario modelo convertia-se muito naturalmente—porque n'elle nada havia de affectado—no homem de sociedade mais correcto e mais attrahente. Á banca de trabalho nunca conheci intelligencia mais viva, percepção mais prompta dos diversos lados de uma questão. Em um salão nunca conheci pessoa mais á sua vontade, tendo uma resposta finamente espirituosa, nunca maldosa, para tudo, igualmente amavel para com todos.


Esta amabilidade era tanto mais captivante, quanto derivava não só da sua educação, como do seu coração. Itajubá era, além de intelligente e distincto, bom, fundamentalmente bom, de uma bondade simples e tocante. A sua alma rejubilava discretamente á idéa do bem que n'um dado momento podia praticar, e atormentava-se com o mal—para outrem—que não podia evitar. Para outrem note-se, porque, no que lhe dizia respeito, mostrava uma impassibilidade que dava a medida do seu espirito superior. Não que fosse indifferente aos ataques ou á má vontade. Sua sensibilidade era em demasia delicada para permittir-lh'o, mas sabia como genuino mundano esconder a sua contrariedade, sem, christão verdadeiro, guardar o mais leve rancor.


Repito, Itajubá era o equilibrio moral em pessoa: igualmente solicito no desempenho dos seus deveres officiaes e sociaes, polido até o requinte, generoso de verdadeiras attenções—que é bem mais difficil do que ser generoso de dinheiro—affectuoso até a ternura para os seus, que o adoravam, e para os amigos, que o estremeciam.


O nome do barão d'Itajubá não ficou ligado em nossa historia diplomatica a nenhuma convenção particularmente notavel, mas a um sem numero de pequenas negociações delicadas e a algumas espinhosas, que elle sabia guiar com mão segura e resolver com um tacto perfeito. Ministro em Madrid, em Washington, em Roma, em Pariz e em Berlim, nunca se lhe deparou occasião para diplomacias de alta escola, nem elle a procurava. Achava com razão que, no caminhar diario dos negocios, ha farto ensejo de prestar serviços para quem os não visa como meio de chamar a attenção. A sua excellente posição social em todas aquellas capitaes facilitava-lhe, de resto, a solução de qualquer questão, reflectindo-se toda em lustre do paiz que elle personificava.


Nos ultimos annos o facto que poz mais em evidencia a capacidade diplomatica do barão d'Itajubá foi o reconhecimento da Republica Brazileira pelo Governo Francez a 20 de Junho de 1890, obtido exclusivamente por sua influencia pessoal, trez mezes antes de fazel-o qualquer outra nação européa, sem aguardar a França o resultado das eleições para a Constituinte do Rio de Janeiro. Fizeram-lhe d'isso um crime por ser elle um representante vindo do antigo regimen e um amigo do Imperador deposto; quando o crime, aliás commum a centenares de outros, significava apenas que, com a sua visão sempre clara dos acontecimentos e dedicação á nação que servia, Itajubá comprehendêra perfeitamente que a monarchia americana cahira para sempre, e que o dever dos brazileiros residia muito mais na defeza do bom nome do paiz, em promover a continuidade das suas tradições de honra e de civilização, do que na dedicação platonica e improficua a uma dynastia que mais se suicidára do que fôra derrubada. Elle serviu a Republica com a lealdade que foi a regra da sua vida publica e privada, que foi a melhor arma, a unica mesmo, da qual se serviu victoriosamente contra os seus detractores e, usemos do termo proprio, os seus invejosos. A sua norma, a sua justificação, consistiam em antepôr sempre e em tudo ás formulas que passam, alguma cousa que fica—a Patria.


Oliveira Lima.

Londres, 25 de Janeiro de 1901.



Historia diplomatica do Brazil: O Reconhecimento do Imperio

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