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Capítulo 2

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Cinco meses depois

– Grávida?

Pia Alexandrina San Giacomo Combe olhou para Matteo, o irmão mais velho, com toda a falta de paixão que pôde. Ensaiara esse olhar durante alguns meses, mas ainda não sabia se o fazia bem.

– Foi o que disse, Matteo – confirmou ela, tentando parecer imperturbável, como também ensaiara.

– Não podes estar a falar a sério – queixou-se o irmão, com uma expressão de espanto absoluto no rosto.

No entanto, Pia estava à frente da mesa ampla da biblioteca da mansão que pertencia à família do pai desde que aquele antepassado Combe valente abrira caminho entre as fábricas têxteis e a construíra. Pelo menos, era o que ela achava, visto que nunca prestara muita atenção às conversas sobre as histórias grandiosas de ambas as partes da sua família. Os pais sempre tinham adorado falar das suas famílias, como se as suas histórias pugnassem pela supremacia.

Efetivamente, ali estava, à frente do irmão, com um vestido mais apertado do que teria gostado e que a incomodou mais ainda quando o olhar de incredulidade de Matteo se fixou na sua barriga. Um vestido preto por causa do luto rigoroso que cumpria há seis semanas, desde que a mãe morrera, e que não conseguia disfarçar o vulto leve da barriga.

Não podia mudar aquilo.

A mãe apercebera-se, uma semana antes da sua morte, de que Pia estava a ficar… gordinha e Pia sabia há muitíssimo tempo o que tinha de fazer para evitar a língua afiada da mãe. A mãe vira imediatamente que aumentara de peso, como via quando a filha era uma jovem tímida e com a cara redonda.

– Só as pobres sem perspetivas são gordas.

A lendária Alexandrina San Giacomo dissera aquilo à filha abatida de doze anos sem alterar a expressão, o que piorara tudo.

– És uma San Giacomo e os San Giacomo não têm bochechas. Aconselho-te a largar os doces.

Depois, Pia tentara por todos os meios evitar os desprezos da mãe, já que nunca poderia estar à altura dos seus critérios de beleza e elegância naturais.

Estivera de dieta durante toda a adolescência, mas as bochechas tinham-se mantido obstinadamente no seu lugar. Até, uma manhã, com vinte e dois anos, acordar e terem desaparecido.

Pouco depois, e infelizmente, fizera a viagem fatídica a Nova Iorque e Pia não sabia porque a mãe fizera aquilo.

Não podia afirmar categoricamente que fora porque descobrira que a filha solteira estava grávida e prestes a protagonizar um escândalo dos que a mãe achava que eram exclusivos dela. Não passara a infância a pôr-lhe na cabeça que tinha de andar direita, que tinha de ser incomparável e permanecer sem máculas? Tinha de ser, acima de tudo, a Branca de Neve, tinha de ser pura como a neve virgem ou ela, Alexandrina, saberia o motivo.

A verdade era que Alexandrina não gostara do motivo.

Não podia garantir que a mãe a mimara mais do que o habitual, como fizera e com esse resultado trágico, por causa da notícia de já não ser virgem e, além disso, de estar grávida de um desconhecido que não sabia como se chamava. No entanto, também não podia garantir que não fora o motivo.

Seis semanas depois, Alexandrina morrera e deixara a pequena família desolada, assim como a sua legião imensa de admiradores. Então, há três dias, o pai, o insolente e incombustível Eddie Combe, que ela considerava imortal, sofrera um ataque de coração e morrera nessa mesma noite… e ela já tinha a certeza. Fora tudo por causa dela.

– Falas a sério – comentou Matteo, num tom sombrio.

Tentou manter o rosto inexpressivo como a mãe fazia sempre, sobretudo, quando a situação era mais grave.

– Receio que sim.

– Saberás que o enterro do nosso pai é dentro de uns minutos?

Pia decidiu que não era uma pergunta real e esperou com as mãos cruzadas à frente dela, como se pudesse ficar assim todo o dia. Olhou para trás do irmão para observar as colinas verdes de Yorkshire por baixo do céu plúmbeo. Matteo observou-a com uns olhos cinzentos e mais escuros do que esse céu.

– Pareces grávida, Pia – continuou Matteo, como se ela não se tivesse apercebido.

– Estou.

– Haverá imprensa e fotógrafos por todos os lados. Não conseguimos evitá-los há seis semanas e, hoje, será ainda pior. Consegues imaginar o choque que uma gravidez evidente causará.

Tinha de reconhecer, em sua honra, que estava a tentar falar sem cerrar muito os dentes.

– O que propões que faça?

Pia perguntou-o sem se alterar, como se não estivesse acordada desde a noite em que o pai morrera. Seria pior se não fosse ao enterro?

– Pode saber-se como aconteceu? – resmungou Matteo.

Pia sempre se considerara unida ao irmão. Ao fim e ao cabo, tinham estado os dois sozinhos, com uma diferença de dez anos, no meio da história de amor tempestuosa e exagerada dos pais.

Eddie Combe fora famoso por ser implacável com os seus adversários e pela sua própria empresa, a Indústrias Combe, que era o fruto desses Combe aguerridos que tinham saído das fábricas têxteis.

Alexandrina San Giacomo, pelo contrário, fora a mulher mais bonita do mundo. Fora o que tinham dito dela desde que fizera dezoito anos. Estrelas da pop tinham cantado louvores no seu enterro e todos tinham visto a transmissão na televisão. Era raro haver um dia em que Pia não encontrasse alguma biografia onde lhe chamavam «a bela» ou «o anjo do nosso tempo» e isso quando eram moderados.

A história de amor dos pais fascinara uma geração e ela também se vira transportada, sobretudo, quando o que conhecera do seu amor fora os gritos, a louça partida, esses… barulhos atrás das portas fechadas à chave e a fixação absoluta um com outro, independentemente de quem estivesse no quarto.

Matteo, com uma beleza sombria e intensa, dedicava-se ao seu papel como herdeiro dos San Giacomo e como sucessor da empresa familiar do pai e era o tipo de filho que podia esperar-se de uma união assim.

Pia, pelo contrário, fora protegida durante quase toda a sua vida e atribuíra-o sempre às suas bochechas. Tinham-na mandado para um convento e para uma escola para refinar as meninas e toda a família chegara a limites inconcebíveis para que não fosse vista em público.

Todos diziam que era para a proteger e para o seu próprio bem, mas ela sabia que era porque era pouco elegante e gordinha. A mulher mais bonita do mundo não podia ter uma filha assim, pois não?

Alexandrina fora um verdadeiro cisne e ela, em comparação, continuava a ser o patinho feio e já se resignara… ou tentara com todas as suas forças.

– Perguntaste-me como aconteceu?

Olhou fixamente para Matteo e teve vontade de se rir, mas conteve-se devido à mais do que provável reação do irmão.

– Não quero dizer que o grites aos quatro ventos, mas tinha quase a certeza de que já… sabias como.

– Obrigado por brincares com o assunto, Pia – replicou Matteo, num tom cortante. – Alegro-me por tudo isto ser uma piada para ti. O enterro do nosso pai começa dentro de uma hora. Não achas que podias ter-me avisado – o irmão olhou para ela de cima a baixo e ela sentiu que as faces coravam –, disto?

– Pareceu-me que tinha de o fazer cara a cara e estiveste em Londres desde… – Não queria falar da morte da mãe. – Sabia que virias ao enterro e pensei que podia esperar até te ver.

Já tinha quase vinte e três anos e, efetivamente, tinham-na protegido desmesuradamente durante toda a vida, mas era uma mulher adulta e não entendia porque se sentia como uma criança quando o seu irmão mais velho a observava com o sobrolho franzido.

– Isto é um desastre – resmungou Matteo, como se ela não soubesse. – Não é uma brincadeira.

– Matteo, não és tu que não podes usar quase nada do que tens no armário – replicou Pia, com desenvoltura, porque não podia fazer outra coisa. – Acho que não é preciso dizeres como tudo isto é real.

Olhou fixamente para ela e abanou a cabeça. Ela tentou fazer boa cara, mas estava envergonhada e sentia que lhe ardiam as faces, como o resto do corpo. Doía-lhe que Matteo olhasse para ela como se estivesse dececionado e receava continuar envergonhada para o resto da sua vida.

– Lamento muito…

– Quem é o pai?

Isso fez com que se sentisse ainda mais envergonhada e com que quase sentisse náuseas.

– O pai perguntou-me o mesmo – disse ela, em vez de responder à pergunta.

A resposta era… sórdida e humilhante. Embora lhe tivesse parecido maravilhoso antes. Finalmente, tinha um segredo! Finalmente, era uma mulher moderna como todas as que conhecia! Entrara no seu próprio futuro, deixara de se preservar como uma donzela virgem numa montra só porque, por algum motivo, a família escandalosa se unira e quisera que não cometesse os mesmos erros que eles tinham cometido. Verificara como era divertido até chegarem as náuseas de manhã.

Matteo franziu mais o sobrolho, algo que parecia impossível.

– O pai sabia?

– A mãe e o pai sabiam – corrigiu, num tom fraco.

Na verdade, a vida que estava a gerar-se dentro dela era o que lhe parecia menos incrível. Não entendia como o mundo poderia girar sem os pais nele. A mãe fora como o céu infinito e propenso a tempestades repentinas, mesmo que fosse na quietude da sua sala. O pai fora como um vulcão. Enorme, imponente e sempre à beira da erupção.

Como era possível que ambos tivessem desaparecido? Como podia viver com a certeza de que fora ela que os matara de uma forma ou de outra?

Levou uma mão à barriga e começou a acariciá-la, mas ficou imóvel quando viu que o olhar sombrio de Matteo seguia esse movimento. Outra onda de vergonha apoderou-se dela.

– O que…? – Matteo abanou a cabeça como se não conseguisse assimilar a informação. – O que disseram?

– Mais ou menos, o que podia esperar-se. A mãe quis certificar-se de que sabia que era melhor ter um filho, porque as filhas acabavam por nos roubar a beleza.

Pia preferiu não lhe contar o momento de tensão que tinham vivido quando a mãe e ela se tinham entreolhado e nenhuma das duas comentara o evidente, que ela não fizera algo parecido. Matteo pestanejou e ela continuou.

– O pai disse e cito textualmente: «Devia ter sabido que acabarias por te tornar uma ordinária.»

Matteo e ela entreolharam-se por um instante.

Pia sentiu um nó no estômago e não por causa das náuseas daquela manhã, mas por deslealdade. Os pais sempre tinham sido atrozes. Os arrebatamentos de fúria eram uma das suas formas de se comunicar mais habituais. Sempre tinham sido capazes de dizer coisas terríveis e costumavam dizê-las e, depois, fazer alguma coisa para as compensar. Normalmente, não diziam nada diretamente, mas levavam-na de viagem a sítios remotos ou tinham ataques repentinos de carinho e doçura.

Sabia que os dececionara, mas se estivessem vivos, a fúria teria dado lugar a algo mais delicado, independentemente do que pudessem ter-lhe dito no ardor das suas reações. Ela também devia tê-lo dito, devia ter deixado claro que sabia que ambos se teriam suavizado.

Mas já era tarde. Para eles, certamente… e para ela, a filha que sempre os dececionara. Conseguia ouvir movimentos na casa, fora da biblioteca. Os empregados estavam a preparar a receção que haveria depois do enterro e do velório, quando os colaboradores e colegas da indústria, porque Eddie Combe não fizera amigos, se reuniriam para fingir que sentiam a falta dele. Além disso, os chefes de estado da Europa mandariam os seus emissários. Efetivamente, Eddie Combe saíra das fábricas escuras de Yorkshire, mas casara-se com uma San Giacomo e os San Giacomo tinham sido da realeza veneziana. Um dos seus antepassados fora príncipe e isso significava que a flor e a nata da Europa tinha de apresentar as suas condolências, mesmo que não tivessem feito caso a Eddie.

Pia não queria participar nisso e não só por causa do medo de causar um choque quando aparecesse no seu… estado. Não queria porque continuava sem conseguir acreditar que os pais tinham falecido quando não tivera tempo de descobrir se se retificariam, quando já não chegaria a saber se, daquela vez, os dececionara demasiado ou se se suavizariam como costumavam fazer.

Parecia-lhe prematuro chorá-los e parecia-lhe muito injusto que quisessem que o fizesse em público, como se participasse num espetáculo para que os outros o vissem e o julgassem.

– Sabes quem é o responsável pelo teu… estado ou preferes não dizer o seu nome? – perguntou Matteo, com uma frieza gélida.

Era possível que estivesse mais vulnerável do que achava, porque isso a afetou muito.

– Acho que eu sou a responsável pelo meu estado. Não me… atacaram, se te referes a isso. Não me fizeram nada em que não tenha participado com entusiasmo. Não sou uma rapariga em apuros, Matteo.

Uma parte dela poderia ter gostado de estar grávida se não surpreendesse todas as pessoas que conhecia. Sempre quisera ter uma família, não a que tinha, mas uma família real, a família que imaginava que todos os outros tinham.

Matteo observava-a com atenção e ela quase conseguia ver a maquinaria a trabalhar na sua cabeça.

– Foi naquela viagem que fizeste a Nova Iorque, não foi?

– Se te referes à viagem que fiz para celebrar o facto de ter saído daquela escola, então, sim.

Lutara muito por aquilo e fora Matteo que dera um passo à frente para dizer abertamente aos pais que ela também merecia, como todos, uma oportunidade de viver a sua vida de mulher adulta. As faces coraram ainda mais quando imaginou o que ele estaria a pensar dela nesse momento.

– Passámos uma semana fantástica em Nova Iorque. E voltei com um pouco de… peso extra.

– Não entendo. Tu…?

Ouviam-se passos do outro lado da porta e as nuvens começavam a acumular-se nas colinas. Olhou fixamente para o irmão e as faces arderam-lhe tanto que lhe doeram.

– Não entendes? A sério? Nas revistas, vi muitas fotografias tuas com mulheres diferentes, mas continuas solteiro. Como é possível?

– Pia…

– Se vais agir como se fôssemos vitorianos, Matteo, devia poder perguntar-te pela tua… honra. Não é?

– Lamento muito, mas não tenho o costume de ter relações íntimas com mulheres que não conheço.

– Muito bem. Então, suponho que seja uma rameira – replicou ela, endireitando-se.

– Duvido muito – resmungou Matteo.

No entanto, a palavra ficou a ecoar-lhe na cabeça porque as portas da biblioteca se abriram. Os empregados que Matteo conseguira afastar entraram e a secretária dele sussurrou-lhe alguma coisa ao ouvido. Chegara o momento de fazerem a sua tarefa triste.

Sabia que o pai pensara exatamente isso dela, mesmo que fosse apenas por um instante. Olhara para ela por uma vez na sua vida, porque Eddie Combe costumava concentrar a sua atenção em si próprio, e apenas três dias antes de ter o ataque de coração dissera-lhe na cara que era uma ordinária.

Não parava de se repetir que não havia causa e efeito, que o ataque de coração não tinha nada a ver com o seu estado e que, se tivesse tido mais tempo, a teria procurado ao fim de algum tempo e lhe teria oferecido algo parecido com um ramo de oliveira.

No entanto, enquanto acompanhava Matteo no banco traseiro do seu carro e Lauren, a secretária, não parava de lhe passar chamadas, teve de aceitar que não podia sabê-lo com certeza, que era impossível. A última coisa que sabia era que o pai a considerava uma ordinária e que lho dissera alguns dias antes de morrer.

A mãe chamara-lhe gorda, algo que não era novo, embora fosse, para Alexandrina, o pior que podia chamar a uma mulher. Além disso, também não voltara a ser carinhosa antes da sua morte.

Em qualquer caso, Matteo e ela eram órfãos naquele momento e ela continuava a recear que fosse por causa dela.

No entanto, passou a mão pela barriga porque, fosse culpa dela ou não, isso não afetaria a geração seguinte. Não o permitiria.

O enterro foi simples e comovente. Eddie parecia muito mais próximo do que quando estava vivo e interrogou-se se chegaria a entendê-lo melhor à medida que o tempo fosse passando, se as suas lembranças acabariam por o transformar numa figura mais paternal ou se sempre seria a mesma presença vulcânica, a pessoa que a considerara uma ordinária pouco antes de morrer.

A subida pelas posses dos Combe foi lúgubre e Pia alegrou-se por ser um dia plúmbeo. As nuvens eram ameaçadoras, mas não choveu e aguentaram um vento frio e desagradável enquanto o caixão era enterrado no cemitério familiar.

O sacerdote murmurou algumas orações, um sacerdote que Eddie odiara durante toda a vida e que, para o torturar mesmo depois de morto, escolhera no testamento.

Pia não desviou o olhar do caixão até deixar de o ver e conseguiu conter as lágrimas porque havia muitas câmaras e Alexandrina dissera-lhe imensas vezes que devia evitar os olhos avermelhados e a cara inchada.

Então, voltou a perceber que Alexandrina não estava lá, que Eddie também não estava lá e que nada voltaria a ser como antes.

Sentiu a mão de Matteo nas costas e afastaram-se para que se formasse a fila de quem queria dar-lhes os pêsames. Era em momentos como aquele que agradecia os anos que passara naquela escola para meninas. Era capaz de apertar a mão e olhar para os olhos de qualquer membro da realeza europeia e não se alterar.

– Apresento as condolências em nome do meu pai, sua majestade, o rei Damascus, do reino de Atilia…

Percebeu alguma coisa naquela voz que foi como uma bofetada. Tinha a mão estendida e esse homem aceitou-a enquanto ela o observava atentamente. Reconheceu a labareda e o arrepio que lhe desceu da nuca até à base da coluna vertebral.

Fixou os olhos nos dele e, efetivamente, eram verdes e estavam tão atónitos como os dela.

O pânico apoderou-se de Pia. Como era possível que estivesse a acontecer aquilo? Da última vez que vira aquele homem, estivera a dormir na suíte de um hotel de Manhattan. Pegara nas suas coisas, sentira-se poderosa e trémula ao mesmo tempo com a sua ousadia e com tudo o que ele lhe ensinara e fora-se embora em bicos dos pés.

Não esperara voltar a vê-lo.

– Tu… – murmurou ele, com incredulidade. – Nova Iorque…

Sentiu calor por dentro quando viu que ele esboçava um sorriso, como se ela fosse uma boa lembrança, como ele fora para ela… pelo menos, ao princípio. Antes de ir ao médico para lhe falar das náuseas e da gripe.

No entanto, não pôde deleitar-se com as boas lembranças porque Matteo estava a olhar com o sobrolho franzido para o homem que continuava a apertar-lhe a mão.

– Nova Iorque? – perguntou Matteo, num tom cortante. – Disse que conheceu a minha irmã em Nova Iorque?

– Matteo, para.

No entanto, aquele homem continuava a sorrir levemente e não sabia o perigo que corria.

– Conheci a sua irmã em Manhattan há uns meses – confirmou, num tom amável e sorrindo para Pia. – Vai lá muitas vezes?

– A menina Combe, a minha irmã, só lá foi uma vez – resmungou Matteo. – Além disso, sabe uma coisa? Voltou com uma lembrança.

– Como…?

O homem franziu o sobrolho, mas como os homens importantes o franziam, como se pedissem a todos que se desculpassem por o ter importunado.

– A minha irmã está grávida de seis meses.

Pia pensou que tudo se mexia em câmara lenta, como se fosse um desses acidentes que vira milhares de vezes. Quase conseguia ouvir o barulho dos travões e tudo aumentava muito a pouco e pouco. Viu que o irmão cerrava os punhos e se aproximava daquele homem. Aquele homem que dissera que se chamava Eric, embora ela não acreditasse, não se mexeu.

Ambos se viraram e olharam para Pia como se fosse estranha.

– Se a sua irmã está grávida, não me diz respeito – replicou o homem, num tom muito menos amável.

Não se questionou se poderia sentir-se pior, mas, efetivamente, podia. Levou uma mão ao peito como se, assim, pudesse fazer com que o coração batesse um pouco mais devagar ou deixasse de doer.

– Pia, é este homem? – perguntou Matteo, sem disfarçar a fúria.

– Esqueceste-te de onde estamos? – conseguiu perguntar ela, embora não conseguisse respirar.

– É uma pergunta muito simples – insistiu o irmão, implacavelmente.

– Repito que o… estado da sua irmã não tem nada a ver comigo.

Aquele homem não era um homem qualquer. Aquele homem era bonito. Tinha uns olhos incríveis, um cabelo escuro e sedoso, um queixo que poderia inspirar uma poesia e uns ombros que fariam gritar qualquer rapariga. Aquele homem entrara numa festa em que já se sentia deslocada e incomodada e fora como se uma luz o iluminasse e como se se mexesse com uma indolência natural… e o seu sorriso, que esboçara para ela por baixo de uma instalação de arte moderna que era um sinal de exclamação em bronze, abrasara-a.

No entanto, o melhor de tudo fora que aquele homem não tinha ideia de quem ela era. Gostara dela, só dela, só de Pia.

Tencionara agarrar-se a isso, quisera agarrar-se a isso, mas, aparentemente, essa seria outra das muitas coisas que não poderia fazer.

– Muito obrigada por te interessares pela minha vida privada, Matteo – interveio ela, imitando o tom gélido da mãe e que lhe saíra com uma naturalidade que não esperara –, mas a verdade é que só tive relações sexuais com uma pessoa.

Olhou para o homem que tinha à sua frente e soube que as lembranças não lhe serviriam de nada, portanto, pô-las de parte, por muito bonito que fosse.

– E lamento ter de te informar de que foste esse homem.

No entanto, isso não teve o efeito que esperara porque o homem bonito que tinha à sua frente se limitou a rir-se. A rir-se dela, se não se enganava.

– Claro! – exclamou ele, entre gargalhadas.

Foi então que Matteo lhe deu um murro na cara.

Escândalo na realeza

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