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Cingapura 5

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Josele se aproximou sorridente da minha mesa no trabalho.

— Adivinha, adivinha!

— Não sei. Tem algum abacaxi para me passar que precisa que eu termine antes do fim da semana? Estou cheio de coisas aqui tentando ficar em dia com isso, mas ajudarei você no que puder.

— Não! Muito melhor.

— Vamos ver.

— Neste sábado temos uma festa na Avalon, uma das baladas da moda. A que comentei com você que fica do outro lado do rio, ao lado do Museu de Artes e Ciência.

— Cara, não me surpreende muito. Tenho a impressão de que todos os sábados temos uma festa.

— Esta é especial. É uma homenagem aos expatriados espanhóis. Estará cheio de espanhóis e de expatriados de outros países. É a sua oportunidade de conhecer gente de todo tipo e lugar!

— Já conheço vocês, acho que não preciso de mais do que isso nos próximos cinco anos… — Sorri, contente de estar com eles.

— Sim, mas nós precisamos nos livrar de você um pouco. Você é como as rêmoras, esses peixinhos que vivem grudados nos tubarões. Tudo bem que sejam parasitas, mas às vezes cai bem um pouco de liberdade. Não sei se me entende.

— Se querem que eu os deixe em paz, é só me dizerem, manés.

— É brincadeira! Você sabe. Mas não te fará mal conhecer gente nova e tomar um bom porre.

— Isso, sim, eu sei. Estou cansado de choramingar pelas esquinas como um trouxa. Vamos ver se conhecemos um trio de belas australianas precisando de carinho. Porque de espanholas já me fartei por um bom tempo. O que preciso é um pouco de exercício de quadril. Você me entende — disse, fazendo um nada discreto movimento para frente e para trás.

— Esse é meu garoto! Vamos dizer a Dámaso e combinamos.

Levantei e fomos contar os planos a Dámaso. Naquele sábado arrasaríamos Cingapura.

O resto da manhã pareceu eterno. Todo mundo falava dessa grande festa para espanhóis à nossa volta. Todos faziam planos e riam pensando nas coisas que fariam. Saímos os três para correr com Diego algumas tardes para tentar liberar a tensão e nos concentrarmos em outra coisa, mas todos os esforços foram infrutíferos; e olha que forçamos tanto que nossas pernas ficaram doendo a semana toda. Até a partida de basquete da liga das empresas não foi mais que uma desculpa para falar do mesmo assunto.

Finalmente, chegou o sábado. A festa era no começo da noite. Assim, de manhã me levantei cedo e desci para a academia. As pernas estavam destruídas, mas tinha muito que trabalhar nos braços. Depois, fui com Diego em uma sessão matinal do cinema, na rede Golden Village Cinema, a quinze minutos andando de nossos escritórios. Eram salas com assentos grandes, muito espaço para esticar as pernas e em que às vezes passavam ciclos de cinema clássico. Estavam passando alguns dos melhores filmes de ficção científica de sempre e Diego e eu estávamos com pique para todos. Ver de novo Alien, Guerra nas Estrelas, Dune ou Blade Runner na tela grande não tinha preço. Nós éramos fanáticos pelo gênero.

Depois do filme, que era Matrix naquele dia, comemos em um restaurante de comida rápida chamado Mos Burger que, como o próprio nome diz, servia hamburgueres. Era a semana do hamburguer japonês e tinham alguns ingredientes muito estranhos, como shoyo e missô. No fim, não me entusiasmei muito. Onde tivesse um bom hamburguer com molho barbecue, queijo, tomate e cebola, preferia que deixassem de foras os experimentos estranhos. Então, fomos cada um para sua casa para tomarmos um bom banho e nos prepararmos para a festa, que começaria pouco depois, às sete da noite.

Quando cheguei em casa, Dámaso e Josele estavam em plena animação preparatória. Josele estava ocupado diante do espelho do banheiro com seu pequeno topete, que lhe dava um ar de “Rei”, e Dámaso olhava as roupas do armário com tanta concentração que parecia que estava jogando a mais difícil das partidas de xadrez da história. Aproveitei para tomar uma ducha e escolher um conjunto de roupas elegantes, mas nada exagerado. Não queria humilhar, mas também não queria parecer um Don Juan. Quando estávamos todos prontos, descemos até a rua, onde já esperava o táxi que tínhamos chamado, e fomos para a festa. Em quinze minutos estávamos na porta.

A entrada era uma estrutura de cristal com a palavra Avalon em letras fluorescente. Era vizinha da Marina Bay, por isso, a vista do outro lado da baía, incluindo os prédios onde trabalhávamos, era impressionante, com todos esses altos edifícios iluminados. Não deixava nada a desejar às vistas noturnas de Manhattan, em Nova Iorque, do Brooklyn. Entramos quando a festa tinha acabado de começar, por isso não havia ainda muita gente, e pudemos escolher um bom lugar para ficar. Nas festas acontecia o mesmo que com o marketing na Internet. As três chaves eram: posicionamento, posicionamento e posicionamento. Por dentro, havia um ar de nave industrial e com todas as luzes e a música, me lembraram o movimento ciberpunk, muito parecida com a ambientação do filme Blade Runner que Diego e eu iríamos ver na semana seguinte. Ao fundo, em uma plataforma com muitíssimos pontos de luz na parede que se acendiam e apagavam de forma aleatória, estava o DJ, tocando música eletrônica. Para mim, o nome dele não dizia nada, mas a verdade é que música não parecia ser sua especialidade. Parecia até que não tinha nem ideia do que estava fazendo. De qualquer forma, parecia ser conhecido aqui, porque quando o anunciaram, as pessoas ficaram loucas.

Tínhamos combinado com dois colegas de trabalho, e pouco a pouco foram chegando até que éramos mais de vinte. Na verdade, espanhóis eram cinco: Teresa, Dámaso, Josele, Diego e eu. Eu achava estranho falar em inglês com meus amigos espanhóis, mas fazia isso por cortesia ao resto do grupo, que não falava espanhol. Ficamos bebendo e dançando, rindo e contando histórias engraçadas de coisas que tinham acontecido com eles naquele lugar. Na festa, mais de 80% dos que estavam ali deviam ser expatriados ou, pelo menos, tinham cara de ocidentais. Em muitos dos grupos de pessoas ouvia-se falar em espanhol.

Ao nosso grupo, juntaram-se mais espanhóis que eu não conhecia. Dois rapazes e duas garotas. Dámaso, como não podia deixar de ser, conhecia a todos e me apresentou.

— David, este é Nacho. Não sei se ouviu falar de um fotógrafo chamado Ignacio Ínsua.

— Não, mas também não estou muito por dentro do mundo da fotografia.

— Bom, tanto faz. É ele. Josele o conhecem em uma exposição de fotos há algumas semanas. Na Espanha, ele expôs em vários museus e centros de arte. Uma atriz local conhecida logo notou seu trabalho e ele veio para cá com ela para fazer um book e desde então vive aqui. É o fotógrafo dos famosos e dos grandes eventos em Cingapura. Além de ser um bom jogador de golfe, claro.

— Prazer, Nacho. Vejo que já conhece Dámaso. Espero que se dê bem aqui e que possa ser meu fotógrafo particular, porque no golfe não acho que nos encontraremos. Eu sou mais de esportes de ação.

— Claro que sim, isso seria excelente. Um cliente espanhol que possa pagar minhas nada moderadas comissões. Prazer, David.

— Sempre posso pilotar um barco para uma sessão de fotos em alto mar e tirar uma graninha extra.

— Está falando sério? Às vezes fazemos books e anúncios em barcos. Preciso de vez em quando de um motorista.

— Claro — disse, sorrindo pelo uso da palavra “motorista” em vez de “piloto”. — Tenho o título de Capitão de Iate. Adoro a navegação. Conte comigo quando quiser. Tudo com relação a navegação me parece ótimo.

— Não me esquecerei.

Dámaso continuou com as apresentações.

— Estas duas morenas tão lindas são namoradas e se chamam Elena e Raquel. Elas têm uma doceria de produtos sem glúten.

— Olá. Dois beijos, né? Por que vieram a Cingapura?

— Queríamos conhecer outro país e vimos que aqui também havia celíacos, como em todo lugar, mas não tinham muitas lojas dedicadas a eles — explicou Elena, enquanto eu dava dois beijos em Raquel.

— Eu tinha um amigo celíaco em Madri. Alguns dos doces que ele comia eram tão bons quanto os normais. Não saberia diferenciá-los. Um dia quero passar na loja de vocês para prová-los.

— Quando quiser — disse Raquel. — Aqui está um cartão.

— Obrigado. Vejo que está preparada. Gosto disso. E você, como se chama? — disse, dirigindo-me ao quarto do grupo. — Eu continuo sendo David… — respondi, sorrindo.

— Me chamo Pamos, Juam Pamos — disse, imitando o estilo James Bond.

— Cuidado com ele, David — Dámaso me avisou. — É um bon vivant. Diz que é especialista do cinema, mas não sei se já estreou na profissão. Seus pais são ricos empresários que trabalham em assuntos relacionados com a exportação, mas ele só se dedica a ir de festa em festa e sair com todas as garotas que pode, tenham namorado ou não. Só deixa as festas para jogar golfe comigo e com Nacho.

— Golf? Dá para ver como você fez amigos. Bom, eu estou sozinho aqui, sem par, e não sou uma garota, então não tenho que me preocupar. Com sorte, ele ainda pode me apresentar alguma amiga bonita… — Ri com vontade.

Fiquei um bom tempo conversando com todo mundo, colegas do trabalho e novos conhecidos. Então, em uma volta que dei para ir até o banheiro, um homem com sotaque inglês se aproximou de mim e me ofereceu não sei que substância que eu não conhecia, mas que sem dúvida era algum tipo de droga. Recusei de forma taxativa e segui meu caminho. Nunca tinha usado drogas, nem sequer na minha época mais rebelde, e nem tinha vontade de começar agora. Não gostava que nada controlasse minha vida e esse era o típico caminho que podia me transformar em um escravo de minhas doses diárias. Nisso eu era muito radical. Nem fumava, apesar de já ter feito isso por um tempo, mas tive que parar porque era incompatível com o exercício que eu fazia. E apesar de beber, nunca deixava que o álcool me fizesse perder o domínio de mim mesmo. Meus amigos enxiam meu saco às vezes com esse assunto, principalmente Dámaso, que tinha umas bebedeiras hercúleas, mas eu gostava de sempre sentir que tinha o controle da situação. Era um pouco obsessivo com isso.

Quando voltei, me ofereci para buscar algo para Tere e meu colega, Jérôme, o louco, beberem. Enquanto estava no balcão esperando ser atendido por algum garçom, uma garota lindíssima de aspecto tailandês ou parecido apareceu ao meu lado. Tinha cabelos castanhos, longos, cacheados presos em duas partes de forma que caíam por ambos os lados da cabeça sobre o peito. Usava um gorro de tecido verde e uma camisa com alças da mesma cor. Seu rosto era arredondado e tinha um sorriso precioso, ressaltado por lábios pintados de uma cor vermelha muito suave. Seus olhos eram castanhos escuros, um pouco puxados, mas não muito. Bastante alta, devia medir um metro e setenta ou algo assim, e era magra. Não poderia dizer que tinha me apaixonado à primeira vista; isso seria uma bobagem. Mas meus hormônios de macho ibérico deram um salto mortal triplo, ainda mais quando ela virou para mim e falou comigo em um inglês perfeito com uma voz doce e musical que só pude escutar porque coincidiu com uma diminuição no volume da música.

— Desculpa, não vi a fila.

— Não, não! O que é isso? Não se preocupe. Ainda estou esperando ser atendido. Peça você primeiro, não precisa fazer seu acompanhante esperar.

— Meu acompanhante? Não, estou sozinha. Vim com uma amiga, mas ela teve que ir embora. Espera! Era uma estratégia para saber sobre isso, não é?

— Bom, você me pegou — reconheci, sorrindo. — Mas é difícil de acreditar que uma mulher tão bonita não tenha companhia.

Ela pareceu ter achado meu comentário muito engraçado, pois começou a rir com um riso melodioso que me encantou no mesmo instante. Durante alguns momentos, ficamos calados, nos observando.

— Desculpa, não me apresentei — disse, reagindo. — Me chamo David, sou um dos expatriados espanhóis homenageados nesta festa.

— Espanhol? Por seu inglês, achei que fosse americano… — afirmou, fazendo um biquinho.

— É porque minha mãe é americana. De Boerne, um pequeno povoado de dez mil habitantes no Texas, próximo a San Antonio. Um paraíso para as trilhas, cheio de rotas lindíssimas, mas não tanto quanto você, que nunca vi igual. Como se chama? Acho que você esqueceu de me dizer. Ou é um segredo?

— Não, não, não é nenhum segredo. Me chamo Sumalee, Sumalee Sintawichai. Em tailandês, meu nome significa “flor bela”.

— Flor bela? Economizarei o elogio fácil, mas é óbvio que é um nome perfeito para você. Dizem que a Tailândia é o país dos sorrisos. Se todos tiverem um tão bonito como o seu, deve ser o paraíso.

—É difícil não sorrir para um cara como você — respondeu.

Juro que o sorriso que ela me deu valia uma guerra. Era linda. Estava claro que essa mulher tinha capturado minha atenção.

— Você disse Simalee Sintawachi? — gritei, tentando superar o som ao redor. — Estou me esforçando para memorizar.

— Não, Sumalee Sintawichai — repetiu, aproximando-se do meu ouvido para não ter que gritar e fazendo com que eu ficasse todo arrepiado. — Mas Sumalee está bom para agora. Também não quero que funda a cabeça no primeiro dia.

Primeiro dia? Ela queria que nos víssemos mais vezes? Porque eu, sim, com certeza. Todos os que fossem possíveis. Uma garota tão bonita, eu queria para sempre ao meu lado. Não disse nada sobre seu comentário e a convidei para se unir a nós. Ela aceitou, encantada, com a condição de que não a deixasse sozinha em nenhum momento. Não me custou nada aceitar seus termos e, depois de pedir as bebidas de Jérôme e de Tere, e de oferecer uma a ela, nos dirigimos para o grupo. Eu a apresentei a todos os meus colegas e fiquei impressionado com sua desenvoltura diante de tantos estranhos. Quando chegou a vez de Dámaso, que já estava alegre pelo álcool, ele começou a fazer-lhe elogios aos gritos para que ela pudesse escutar, e tive que pará-lo.

— Calma aí, fera! As mãos controladas, se quiser mantê-las. Guarde seus encantos para outra mulher. Sumalee está comigo esta noite. Fizemos um trato, não é?

— Claro que sim. Só para você — disse, enquanto piscava um olho para mim de forma divertida e agarrava meu braço. — Fizemos um acordo de não nos separarmos nenhum momento hoje.

Dámaso, Jérôme, Josele e Diego me olhavam, incrédulos. Não sabiam se pensavam que eu tinha ganhado na loteria ou se havia uma armadilha por trás de tanta sorte. Para mim, tanto fazia; só queria que a noite durasse para sempre. Eu estava eufórico. Tinha acabado de chegar e já tinha criado laços. Estava claro que meus sete anos com Cristina não tinham me feito perder a habilidade lendária com as mulheres.

Passamos a noite toda na festa falando sem parar. Nos sentíamos muito confortáveis juntos, como se nos conhecêssemos a vida toda. Ela me contou que trabalhava em uma agência de viagens preparando principalmente todas organizadas para a Tailândia, seu país, ou de tailandeses por Cingapura. Teve que sair de lá porque sua mãe estava doente e ela precisava ganhar muito dinheiro para pagar o tratamento. Na Tailândia, tinha um bom trabalho, mas o salário era muito baixo, por isso, veio para Cingapura por conselho de uma amiga. Com o que ganhava podia mandar bastante dinheiro para casa para os remédios da mãe. Era original de uma região chamada Chiang Rai, no norte do país, quase fronteira com Mianmar e Laos. Sua família era pobre e teve que lutar muito para poder conseguir uma bolsa e estudar marketing na Universidade Thammasat. Quando terminou o curso, conseguiu um bom trabalho em uma grande empresa, mas o salário ainda era muito baixo para o que precisava, e isso a levou a Cingapura, onde, para a minha sorte, se encontrava agora.

Tínhamos muitas coisas em comum. Os dois adoravam esportes, viajar, ler, provar coisas novas, aventura, tudo relacionado ao espaço… Como se fôssemos almas gêmeas. Não podia acreditar na minha boa sorte. Aquela noite prometia ser agitada.

Não sei em que momento da noite chegamos àquela situação, mas quando me dei conta, ainda estávamos conversando, com sua mão direita apoiada sobre a minha e sendo acariciada por minha mão esquerda. Sua pele era muito suave e percebi uma pressão em seu peito que dificultava a respiração. Além disso, como a música estava muito alta e havia muita gente gritando, tínhamos que conversar ao pé do ouvido, o que tornava a situação ainda mais excitante quando ela me dizia algo e seu hálito acariciava meu rosto. Parecíamos dois apaixonados trocando confidências. Era difícil para mim não virar e começar a beijá-la e acariciá-la, satisfazendo o ardor que sentia em todo o meu corpo, mas não conhecia os costumes do lugar e não queria estragar a noite.

Falamos da minha família, do que tinha me levado a Cingapura… Ela me fazia uma infinidade de perguntas sobre coisas de todo tipo. Sobre quanto tempo eu ficaria em Cingapura, se gostaria de viajar… Parecia um interrogatório, mas me submetia a ele com gosto. Ela ficou muito interessada quando contei a história com minha ex-namorada. Dizia que para ela era inacreditável que uma garota pudesse me trocar por outro. Gostava cada vez mais de Sumalee. Definitivamente, tinha subido às posições mais altas de pessoas preferidas em Cingapura.

Tínhamos uma cumplicidade e uma confiança tamanha que parecia que ficaríamos a vida toda juntos. Enquanto ela falava, eu podia sentir o perfume dos seus cabelos, que tinha uma fragrância muito definida que ela me contou depois que era jasmim, e percebia uma sensação estranha que não sentia há muito tempo.

Era como se eu estivesse apaixonado, mas com certeza não era isso; provavelmente era a atração sexual do primeiro encontro. Seria uma loucura. Eu tinha acabado de conhecê-la há apenas algumas horas, ela vinha de uma história trágica, mas, ainda que parecesse perfeita para ser minha alma gêmea, não poderia ser tão fácil.

Fazia algum sentido?

Sumalee

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