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Capítulo 3
ОглавлениеPorque estava ali? Era uma boa pergunta, pensou Mateo. Há vinte e quatro horas, quando pensara em ir, depois do seu primeiro encontro desastroso com Vanesa Cruz, parecera-lhe uma ideia maravilhosa, a solução mais simples. Já não tinha a certeza.
– Queria ver-te – declarou. Pelo menos, era verdade.
– Ah, sim? – murmurou Rachel, pestanejando, antes de afastar uma madeixa molhada da sua testa. – Espera, vou pôr água a ferver. Acho que ambos precisamos de uma chávena de chá – replicou, tirando o casaco encharcado.
A blusa branca que usava por baixo também estava húmida e tornara-se transparente e Mateo sentiu-se incomodado quando deu por si a olhar para os seios generosos. Desviou o olhar, mas, então, os seus olhos pousaram no radiador, de onde pendiam alguns sutiãs descoloridos de algodão. Rachel apressou-se a tirá-los, espantada, e foi para a cozinha, onde se ouviu pouco depois de começar a mexer-se para fazer o chá.
Mateo tirou o casaco e pendurou-o nas costas de uma cadeira da zona da sala de jantar, que ocupava metade da sala acolhedora. Na outra metade, havia um sofá, coberto por uma manta colorida, uma poltrona, uma mesinha baixa, uma estante com livros e pouco mais.
Deu uma olhadela aos títulos nas lombadas e, quando se afastou da estante, os seus olhos pousaram no monte de correio empilhado numa mesinha alta junto da porta principal. Aqueles detalhes fizeram-no aperceber-se de que mal conhecia a sua antiga colega de laboratório.
«Deixa-te disso, claro que a conheces!», replicou uma vozinha na sua mente. «Trabalhaste com ela durante dez anos e sabes que se envolve ao máximo. E que tem sentido de humor, mas que também é capaz de levar as coisas que importam a sério. Passaram muitos bons momentos juntos e sabes que podes confiar nela.»
Sim, pensou, enquanto se sentava no sofá, o que sabia sobre ela era mais do que suficiente. Em pouco tempo, Rachel reapareceu com duas chávenas de chá. Aproveitara para se arranjar um pouco: apanhara o cabelo num rabo-de-cavalo e também trocara as calças e a blusa molhados por uma camisola cinzenta que realçava as suas curvas e umas calças de ganga que lhe ficavam lindamente.
Nunca vira Rachel como uma mulher por quem pudesse sentir uma atração física, embora pensasse que, agora, devia fazê-lo. Ou, no mínimo, devia decidir se era capaz de o fazer.
– Aqui tens – ofereceu ela, dando-lhe a chávena de chá, sem leite, como sabia que preferia. Sentou-se no braço da poltrona, cujo banco estava ocupado por uma pilha de roupa dobrada. – Desculpa a desarrumação – acrescentou, fazendo uma careta. – Se soubesse que vinhas, não teria deixado a roupa suja espalhada pela casa.
– Nem isto, imagino – desafiou-a ele, pegando no romance que deixara na mesa. Sorriu, divertido, ao ver a imagem picante da capa e leu em voz alta o começo da sinopse que figurava na contracapa: – «O desconhecido misterioso, que chegara uma noite ao castelo do pai, deixara lady Arabella Fordham-Smythe…»
– Bom, sonhar não tem nada de mal, pois não? – replicou ela.
Apesar do rubor leve que tingira as suas faces, o brilho de humor nos seus olhos recordou a Mateo como podia ser divertida.
– Vais contar-me porque vieste? – insistiu Rachel. – E não é que não goste de te ver, embora tenhas aparecido sem avisar.
– Dizes isso por causa dos sutiãs que deixaste a secar no aquecedor? – desafiou-a ele.
Rachel corou novamente e Mateo repreendeu-se para si. Porque tivera de mencionar a roupa interior? E porque é que, de repente, estava a imaginá-la, não com um desses sutiãs velhos, mas com um de seda e renda, com uma alça a escorregar pelo ombro…?
Ergueu-se, afastando aquela imagem da sua mente, e os seus olhos encontraram-se com os de Rachel. A verdade era que tinha uns olhos muito bonitos, de uma cor castanho-escura, e pestanas espessas.
– Sabes quem ocupou o teu lugar? – perguntou ela, torcendo o nariz.
Mateo franziu o sobrolho.
– Não. Quem?
– O Simon, o Desagradável – respondeu ela. – Sei que não devia chamá-lo assim – acrescentou, com uma careta –, mas é tão irritante…
Mateo sorriu com dissimulação.
– Não conseguiram encontrar alguém melhor?
Para ele, era um insulto que o substituto que tinham escolhido fosse Simon Thayer, um investigador medíocre que, além disso, era um parvo.
– Vês! – exclamou Rachel. Abanou a cabeça e soprou o seu chá antes de beber um gole. – Sempre foi um parvo – resmungou. O brilho dos seus olhos apagou-se. – Trabalhar com ele vai ser um inferno, na verdade. Até pensei em ir para outro sítio, embora também não pudesse… – murmurou. – Enfim, tanto faz – continuou, abanando a cabeça. – E tu? Como estás? Essa emergência familiar que te obrigou a ir já se resolveu?
– Bom, ainda não, mas suponho que possa dizer-se que as coisas estão um pouco melhores.
– Ah, sim? Ainda bem. Mas… porque vieste? Ainda não me disseste.
– É verdade.
Mateo bebeu um gole de chá para ganhar tempo, algo que não costumava fazer. Como químico, nunca se mostrara indeciso e sabia sempre o que tinha de fazer. Quando encontrava um problema, analisava-o passo a passo até encontrar a solução.
Era o que deveria fazer com Rachel: mostrar-lhe o seu raciocínio, passo a passo, de um modo analítico, para que chegasse à mesma conclusão a que ele chegara. Contudo, em vez disso, em vez de começar pelo princípio e explicar-lhe tudo de um modo coerente, deu por si a fazer exatamente o contrário. Declarou:
– Quero que te cases comigo.
Rachel tinha a certeza de que devia ter ouvido mal. A menos que estivesse a brincar… Sorriu, perplexa, como se o que acabara de dizer só a tivesse chocado, quando, na verdade, estava a tremer por dentro. De repente, sentiu medo de que fosse uma brincadeira, como acontecera com Josh há anos. Conseguira superá-lo, mas não conseguiria suportar que Mateo, alguém em quem confiava, fizesse uma coisa dessas. «Por favor, por favor, não gozes comigo…»
– Desculpa, o que disseste?
– Eu sei, tens razão – murmurou Mateo. – Não o expressei muito bem.
Rachel bebeu um gole do seu chá para esconder a sua expressão. Aquilo estava a começar a parecer algo tirado de um romance e a vida real não era assim. Era impossível que Mateo Karras quisesse casar-se com ela. Impossível.
– Deixa-me explicar-te – pediu ele. – Bom, eu… não sou quem pensas que sou.
Era tudo tão surreal que Rachel sentiu vontade de se rir.
– Está bem. Então, quem és?
Mateo contraiu o rosto e pousou a chávena na mesinha.
– Sou o príncipe Mateo Aegeus Karavitis, herdeiro do trono do reino de Kallyria.
Rachel ficou a olhar para ele, chocada. Tinha de estar a gozar com ela. Mateo fizera algumas brincadeiras no laboratório de vez em quando, coisas inofensivas, como pôr um nome engraçado na etiqueta de um tubo de amostra, mas aquilo…
– Desculpa, mas não compreendo – murmurou, incomodada.
Mateo franziu o sobrolho.
– O que não compreendes?
– Não compreendo a piada.
– Não é uma piada – replicou ele. – Falo a sério. Compreendo que te choque e sei que não foi uma proposta muito romântica, mas, se deixares que to explique…
– Muito bem, explica-me – interrompeu Rachel.
Pousou a chávena na mesinha, como ele fizera, e cruzou os braços. Estava a começar a zangar-se. Se aquilo era uma brincadeira, era de muito mau gosto.
O seu tom áspero deixou Mateo um pouco incomodado.
– Bom… há cinco dias, o meu irmão Leo abdicou. Estava há seis anos no trono, desde a morte do meu pai.
Falava com tanta naturalidade que Rachel ficou a olhar para ele, alucinada. Poderia estar a falar a sério?
– Se realmente és um príncipe… porque é que não me disseste até agora?
– Porque não queria que ninguém soubesse. Queria triunfar pelos meus próprios méritos, não por ser quem sou. Foi por isso que, durante todos estes anos, usei um nome falso. Ninguém no campus sabe.
Por um instante, Rachel questionou-se se Mateo não estaria a ter um ataque psicótico. Acontecera a outros cientistas que passavam demasiado tempo no laboratório. O facto de se ter ido embora tão repentinamente e essa suposta emergência familiar… E se fosse tudo produto da sua mente?, pensou, olhando para ele com espanto.
Mateo suspirou, exasperado.
– Não acreditas, pois não?
– Não é isso…
Mateo revirou os olhos e soprou.
– Achas mesmo que estou a inventar tudo?
– Eu não disse isso – replicou Rachel, num tom apaziguador. – O que acho é que tu «achas» que és um príncipe…
Mateo voltou a soprar e, levantando-se, perguntou:
– Parece-te que tenho ar de louco ou que me comporto como um louco?
Rachel arqueou uma sobrancelha.
– Estás a dizer-me que és mesmo um príncipe?
– Claro que sou. E, dentro de uma semana, serei coroado rei.
Parecia tão seguro de si próprio e tão arrogante que Rachel se questionou se realmente estaria a dizer-lhe a verdade.
– Mas… mesmo no caso de ser verdade… o que é que isso tem a ver comigo? – perguntou, recordando o que lhe dissera sobre casar-se com ela.
– Como rei, precisarei de uma esposa – explicou Mateo. – Uma rainha consorte.
Rachel abanou a cabeça.
– Talvez seja um pouco burra, mas continuo sem entender.
– Burra? És a mulher mais inteligente que conheço, uma cientista brilhante, muito trabalhadora e também uma boa amiga.
Rachel sentiu que lhe ardiam as faces e quase começou a chorar. As palavras de Mateo eram tão sinceras que a tinham comovido. Não recordava quando fora a última vez que alguém a elogiara dessa forma.
– Obrigada – murmurou.
– A questão é – continuou Mateo –, que tenho de me casar imediatamente, para proporcionar estabilidade ao meu país. E tenho de dar um herdeiro à Casa Real.
Um instante… O quê?! Rachel ficou a olhar para ele, chocada. Continuava sem conseguir assimilar o que estava a dizer-lhe.
– E… E queres casar-te comigo? – perguntou, com incredulidade, num sussurro.
O príncipe de um país estrangeiro queria casar-se com ela? Por algum motivo, nesse momento, recordou as palavras cruéis que Josh lhe lançara há mais de dez anos: «Que homem poderia desejar alguém como tu?»
– Porquê? – inquiriu, num tom fraco.
– Porque te conheço. Porque confio em ti. Porque formamos uma boa equipa.
– Sim, mas como colegas, num laboratório…
– E porque não seria igual a governar um país? – replicou ele, encolhendo os ombros. – Qual é a diferença?
– Não estás a oferecer-me a vice-presidência, Mateo; estás a pedir-me para ser a tua esposa. Há uma grande diferença.
– Não é assim tanta. Só terias de estar ao meu lado, apoiar-me e ajudar-me.
– Estás a falar de casamento…
De repente, a sua mente conjurou umas imagens totalmente deslocadas: a noite de núpcias, um quarto à luz das velas, a pele bronzeada de Mateo a deslizar contra a sua… Não, isso só acontecia nos romances que lia, Mateo não podia estar a referir-se a um casamento no sentido pleno da palavra. Claro que… mencionara que precisava de dar um herdeiro ao país…
– Claro, foi o que disse, que quero casar-me contigo – reiterou ele.
Rachel olhou para ele com impotência.
– Mateo, isto é uma loucura.
– Sei que é inesperado, mas…
– Inesperado? Tenho um emprego – interrompeu-o ela. – O que esperas, que deixe tudo?
Conseguira o seu lugar em Cambridge e o seu emprego como investigadora pelos seus próprios méritos, não por ser a filha do eminente físico William Lewis e da sua esposa, Carol Lewis. Esperava que deixasse tudo por que lutara para trás para se transformar numa esposa troféu?
– Tenho consciência de que o que estou a pedir-te é um grande sacrifício – disse Mateo –, mas, como rainha, terias possibilidades infinitas: poderias promover os cursos de ciências entre as raparigas, financiar investigações científicas, dar apoio a causas de beneficência, viajar por todo o mundo como embaixatriz da ciência…
– Da ciência ou como embaixatriz política? – perguntou ela, num tom trémulo por causa da enormidade de tudo aquilo.
– Ambas as coisas – afirmou Mateo. – Como rei, uma das minhas prioridades será promover a investigação científica. Kallyria tem uma universidade na capital, Constanza. Não pode dizer-se que está ao nível de Cambridge ou de Oxford, é claro, mas goza de um grande reconhecimento entre os países do Mediterrâneo.
– Nem sequer sei onde é Kallyria – admitiu Rachel. – Acho que, até agora, nem tinha ouvido o nome.
– É uma ilha, na parte oriental do Mediterrâneo. Foi colonizada por comerciantes gregos e turcos há mais de dois mil anos, mas sempre foi independente.
Rachel sentia que a cabeça ia explodir.
– Mas eu não…
E, então, de repente, abriu-se a porta principal e entrou a mãe, que olhou para Mateo e para ela com uma desconfiança hostil.
– Rachel, quem é este homem?