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Capítulo 2

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Flora ficou imóvel quando, ao descer as escadas em bicos de pés, fez ranger um dos degraus. Durante uns segundos, conteve a respiração, e, ao não ouvir o bebé chorar, suspirou aliviada.

A mãe tinha-lhe dito que estavam a sair os dentes ao bebé. E também lhe tinha dito que Jamie era um bebé muito fácil de criar.

Mas depois das últimas semanas que tinha passado, Flora achava que os bebés fáceis de criar eram personagens de ficção, como as fadas ou os unicórnios.

Flora mal se lembrava do que era dormir uma noite inteira. Agora tinha saudades daqueles dias em que passar uma noite má significava dar voltas na cama durante meia hora antes de adormecer.

Os seus olhos azuis encheram-se de lágrimas ao pensar em Sami, a sua querida irmã. A sua mente conjurou a imagem sorridente de Sami e, entre a dor e o sentimento de perda, sentiu frio.

Tremeu e envolveu-se bem com o casaco que tinha posto em cima da camisola. À margem da situação familiar, estava orgulhosa do seu primeiro projeto depois de conseguir o diploma de arquiteta. Tinha tratado da recuperação da casa de pedra em ruínas da sua irmã e do seu cunhado, convertendo-a num hotel e restaurante tal como eles desejavam. E apresentara o projeto a um prestigiado concurso. Embora não tivesse conquistado nenhum prémio, o seu trabalho tinha tido direito a uma menção honrosa.

O sistema de aquecimento e o isolamento tinham sido aspetos fundamentais no projeto e, normalmente, a casa estava aquecida. O sistema de aquecimento era extremamente eficiente, os janelões eram de triplo vidro e o telhado estava coberto com placas solares; no entanto, naquela noite estava frio dentro da casa.

Ao passar por um dos aquecedores, deu-se conta de que, em vez de estar quente, o metal estava completamente frio.

Conteve um rosnado ao pensar que tinha recusado o arranjo da caldeira só para poupar dinheiro.

Permitiu-se o luxo de derramar umas lágrimas antes de endireitar os delicados ombros e aconselhar-se em silêncio: «Bom, Flora, para de lamentar-te e liga ao tipo do gás amanhã. E deixa de queixar-te».

Pensou ir à pequena sala de estar privada, um anexo da casa original, em madeira de carvalho e vidro, com vistas incríveis para o braço de mar e para o continente, mas desistiu da ideia porque não tinha acendido a salamandra antes e, como o aquecimento geral não estava a funcionar e a sala era toda em vidro, ainda faria mais frio ali do que na casa principal.

Talvez o melhor fosse agarrar uma bolsa de água quente, depois de deixar ligados uns aquecedores elétricos no quarto do menino, e meter-se na cama. Eram só oito e meia, mas, tendo em conta o pouco que conseguia dormir ultimamente, era o melhor plano.

Em primeiro lugar, poria o aquecedor no quarto de Jamie; depois, encheria a bolsa com água quente. Calçada com umas meias grossos de lã, caminhou silenciosamente pelo chão de pedra da zona que servia de receção e salão, e onde havia um bar informal, enquanto a tempestade rugia no exterior.

Enquanto ia caminhando, foi apagando luzes; pelo menos, continuavam a ter eletricidade. Tirou o telemóvel do bolso das apertadas calças de ganga e lançou um suspiro ao ver que continuava sem rede desde o meio-dia. A tempestade também tinha cortado a linha de telefone fixo e estava preocupada por não poder contactar a mãe.

Em circunstâncias normais, não se preocuparia por não poder ligar-lhe; em circunstâncias normais, a sua mãe estaria ali a ajudar e a cuidar de Jamie enquanto geria o seu negócio de cerâmica. Grace Henderson conseguia fazer muitas coisas simultaneamente, algo que ela invejava.

Mas a sua situação atual estava longe de ser normal. A sua mãe, uma mulher muito independente, tinha uma perna engessada, andava de muletas e chorava a perda da sua filha mais velha. Flora confortava-se na ideia de que, embora a mãe vivesse num lugar remoto, tinha bons amigos que viviam perto e eram bons vizinhos. Naturalmente, passariam por casa dela a ver se estava bem.

Flora mordeu o lábio inferior enquanto ponderava se devia lançar mais carvão para a lareira antes de ir para a cama. Estava tentar recordar onde tinha posto os aquecedores elétricos que tinha de levar para o quarto de Jamie quando ouviu umas batedelas na porta principal, a qual tinha fechado com o ferrolho depois de Fergus se ter ido embora, já que não fazia sentido que o cozinheiro continuasse ali quando as reservas para jantares tinham sido canceladas.

Envergonhada porque a primeira coisa em que pensou foi que o barulho ia acordar o menino, cruzou apressadamente a sala, deduzindo que a pessoa que estava a bater deveria estar desesperada, e correu o ferrolho rapidamente.

Quando a porta se abriu, o vento vindo do fiorde que chegava à praia do outro lado da estreita estrada atingiu-lhe o rosto com uma gélida força.

O desconhecido entrou em casa no meio daquela tempestade.

Era um desconhecido, não era Callum, como tinha pensado durante uma décima de segundo. Onde estaria Callum naqueles dias? Em Espanha? No Japão? Não, aquele homem, tirando e sua altura e a constituição física, não se parecia com Callum, o homem que lhe tinha partido o coração.

Flora fechou rapidamente a porta, competindo com a força do vento tempestuoso e da chuva torrencial.

O homem, que agora parecia ainda mais alto, estava quieto, o que lhe permitiu observá-lo com mais tempo e memorizar cada um dos seus traços. O seu cabelo negro estava encharcado e umas gotas de água tremiam nos extremos de umas incrivelmente longas pestanas enquanto o tom azeitona da sua pele adquiria reflexos dourados sob a ténue luz. Sem ter em conta a extraordinária boca e os profundos e escuros olhos, os duros traços daquele rosto eram muito sensuais e extremamente viris.

Recusando-se a reconhecer um repentino desejo sexual, decidiu libertar-se do efeito que aqueles hipnóticos olhos, fixos nos seus, estavam a ter nela.

– Quem é você? – perguntou Flora quando recuperou a fala. A sua voz não mostrava a hospitalidade pela qual eram célebres as pessoas daquelas terras. No entanto, em sua defesa, estava… perturbada, ou perto disso.

Flora engoliu em seco e baixou as pálpebras. Apesar do gesto defensivo, sentia no seu corpo aqueles olhos escuros com estranhos reflexos dourados.

Flora acabou por reconhecer que estava à frente do homem mais bonito que já tinha visto na sua vida… e nos seus sonhos. Seria aquele um bom momento para descobrir que ainda sentia um fraquinho por uma cara bonita? Não, Callum tinha uma cara bonita; no entanto, aquele homem era mais, era belo.

Sim, era um homem realmente formoso. Tinha um rosto com uma estrutura óssea perfeita, com maçãs do rosto prominentes e a mandíbula quadrada, nariz aquilino e uma boca que lhe provocou um formigueiro no ventre.

Mas o que realmente a tinha impressionado era a extrema sexualidade da sua presença. Até conseguir fazer com que ela sentisse as pernas a tremer.

«Fantástico, era mesmo o que precisava!»

Como se não fosse suficiente ter perdido a sua querida irmã e o seu cunhado, ter herdado o negócio e também o filho de ambos! Agora, para cúmulo, aquele desconhecido tinha voltado a despertar a sua libido!

Obviamente, aquele homem não tinha culpa de nada.

– Reservei um quarto – respondeu o homem com voz profunda e grave e um ligeiro acento estrangeiro.

Uma onda de tristeza abanou Flora e sentiu a garganta fechar-se. Aquela voz, embora mais profunda e áspera, parecia recordar-lhe o seu falecido cunhado, Bruno. Mas a voz de Bruno sempre fora quente e com uma nota de humor, enquanto a do desconhecido era tão fria como os olhos que a olhavam à espera de uma resposta.

Flora fez um esforço por adotar uma atitude profissional. Normalmente, não lhe custava nada, estava habituada a lidar com as pessoas, tinha trabalhado num bar, a tempo parcial, durante a universidade. Recentemente, uns clientes tinham dado a sua opinião sobre ela na Internet, dizendo que mostrava «uma amável eficiência e simpatia».

Assim sendo, por que estava ali, quieta e sem abrir a boca, como uma idiota?

– Há algum problema?

Ivo reconheceu que tinha cometido um erro ao chegar ali com ideias pré-concebidas e isso estava a confundi-lo muito, algo a que não estava acostumado.

E algo a que não pretendia acostumar-se. Até à porta se abrir, não se dera conta de que antecipava deparar-se com uma loira alta e magra. Não lhe tinha passado pela cabeça que a cunhada do seu irmão fosse uma ruiva baixinha com a cintura mais estreita que já vira na vida.

Ivo meteu as mãos nos bolsos e apertou-as em punhos, como se quisesse dissipar a imagem que a sua mente tinha evocado, uma imagem em que apertava aquela cintura com os dedos das suas mãos. As suaves, mas femininas curvas acima da cintura daquela mulher levaram-no a sentir um repentino calor que o forçou a voltar a atenção novamente para o seu rosto.

Olhar para a mulher com a qual o seu avô tinha sugerido que se casasse não lhe ia custar esforço algum.

Sem saber como nem porquê, a sua mente conjurou a imagem daquela mulher a caminhar para um altar com um vestido de noiva. Recusou rapidamente essa ideia, tal como a ideia de casamento. Até há pouco, tinha sido uma inevitável perspetiva, uma dívida à continuação do seu apelido; no entanto, a existência do filho de Bruno, que representava a nova geração, libertara-o dessa obrigação.

Estava na ilha de Skye, sim, mas não para se casar.

Era o seu plano alternativo mais racional? De facto, não podia ser considerado um plano, tudo dependeria das circunstâncias a partir daquele momento, iria decidindo conforme as coisas corressem.

Talvez fosse uma loucura, mas algo mais razoável do que lhe tinha parecido quando estivera quase a abandonar o carro numa parte inundada da estrada, a pouco menos de um quilómetro de onde se encontrava.

Ivo não acreditava no destino nem na intervenção divina, mas quando uma pessoa dava por si a guiar por uma estrada que se tornara quase num rio, era lógico perguntar-se se alguém, algures, não lhe estava a enviar um sinal.

E aquele não tinha sido o primeiro obstáculo!

Ivo considerava-se um homem que se sabia adaptar às circunstâncias, mas naquele dia a sua paciência fora posta à prova. Desde que começara a viagem naquela manhã, tudo tinha ido de mal a pior. O piloto do avião privado tivera de realizar uma aterragem de emergência em Roma por causa de problemas técnicos. Por fim, após aterrar na Escócia no avião privado substituto, nenhum motorista aceitara levá-lo para Skye devido ao temporal.

Tendo em conta que aquela viagem era de extrema importância, tinha ignorado os avisos contra o mau tempo, supondo que estavam a exagerar.

E tinha-lhe custado caro. Olhou para os seus sapatos de couro feitos à medida, completamente destroçados; o casal de idosos, que tinha ajudado após terem saído com o carro da estrada, tinham-no tratado como um herói.

E agora que estava ali as coisas não corriam conforme o previsto. Procurou fazer gala da objetividade que o caracterizava; mas naquele preciso momento, aquele rosto em forma de coração ergueu-se para ele.

Se não reconhecesse como era bela, apesar de não gostar particularmente de mulheres baixinhas e de ar frágil, não estaria a ser verdadeiro. Obviamente, conhecera mulheres muito mais bonitas do que aquela, embora nenhuma com aquele rosto em forma de coração e uns caracóis pré-rafaelistas dignos de Tiziano.

Tão inesperada como a vista daquela bonita cara em forma de coração tinha sido o súbito desejo sexual que sentira assim que a vira.

Eliminando aquela resposta visceral, continuou a observar aquele rosto que tanto lhe tinha chamado a atenção. Era uma cara com um nariz respingão, uma bonita boca, uns olhos azuis rodeados de espessas pestanas e um queixo com uma covinha.

Em resposta à pergunta dele, Flora levantou os olhos, à altura do peito do seu peito. Os duros olhos dele eram desconcertantes.

– Usa gravata.

Flora fechou os olhos e pensou: «esperemos que eu conseguia recuperar rapidamente o juízo e possa dar a impressão de que tenho mais cérebro que um mosquito».

«E depressa, por favor!»

Quando voltou a abrir os olhos, ele tinha desapertado o cinto do sobretudo e um botão do casaco. Aqueles longos dedos cor de azeitona estavam a alisar a gravata cinzenta sobre a camisa branca.

Flora adivinhou-lhe uma sombra de escuro pelo no peito antes de afastar rapidamente os olhos, ignorando o mal-estar que sentia na pele.

– Exige algum vestuário especial aos hóspedes?

Ignorando o tom sarcástico da pergunta, Flora recordou-se a si mesma que devia ser amável com os seus clientes, independentemente do que pudesse pensar deles. Embora, para ser justos, supunha que uma pessoa que acabasse de percorrer aquela estrada sozinho no carro e com aquele temporal devia estar tensa.

O certo é que aquele homem não parecia tenso, muito pelo contrário. Dava a impressão de ser uma pessoa com autodomínio, que não precisava do consolo de ninguém.

– Não, claro que não. Bom, temos cabanas nas montanhas, embora não recomende a ninguém sair para o campo com este tempo – respondeu Flora.

Era incrível a quantidade de gente vinda da cidade que não tinha qualquer respeito pelas inclemências do tempo da ilha e do seu terreno.

– Ah, e também temos mapas da zona em todos os quartos, embora alguns clientes contratem os serviços dos guias da ilha. E se lhe interessa a geologia, há uns fascinantes…

– Não me interessa e tenho bom sentido de orientação.

Fez-se um silêncio que, por fim, Flora interrompeu.

– Ah, veio pescar? – apesar de precisar desesperadamente de dinheiro, teria preferido que aquele homem não tivesse aparecido.

– Não, não vim pescar – respondeu ele com a mandíbula tensa.

Contendo um infantil desejo de dizer-lhe que, na verdade, era-lhe indiferente, Flora sorriu.

– Bom, espero que goste da sua estadia aqui – Flora hesitou uns segundos antes de admitir: – A verdade é que não sabia que tinha reservado um quarto. Veio de muito longe?

– Sim.

«Tenho tido conversas mais interessantes com uma parede de tijolos», pensou Flora sem deixar de sorrir, até que se deu conta de que ele tinha os olhos fixos nos seus cabelos. Conteve o impulso de erguer uma mão para alisar os enredados caracóis que se lhe tinham escapado do rabo-de-cavalo.

– Bom, acho que foi muito valente por ter vindo no meio desta tempestade… ou talvez atrevido?

Era lógico perguntar-se quem, senão um louco, viajaria naquelas condições climatéricas, ignorando os avisos de todas as agências de segurança, incluindo a polícia, que tinham rogado a toda a gente que evitasse viajar para a costa até que a tempestade amainasse.

– Enfim, parece-lhe bem que formalizemos a reserva? Cartão ou… – Flora olhou para o balcão da receção onde costumava estar o livro de registos, ao lado de outro em que os clientes escreviam comentários sobre a estadia.

Estavam lá o livro de comentários e um jarro de flores, mas não o livro de registos.

Ivo viu-a levar-se um dedo até entre as sobrancelhas ao mesmo tempo que mostrava uma expressão de concentração, mas foram as orelhas dela que lhe chamaram a atenção. Recusou de imediato o súbito sentimento de simpatia que o dominava, era perturbador.

Como tinha sido perturbadora a sua reação ao vê-la assim que abrira a porta. Era óbvio que, subconscientemente, presumira que iria deparar-se com uma mulher parecida com a irmã dela, a alta e loira mulher que enfeitiçara Bruno, e ainda não se recuperara da surpresa. Além disso, era obrigado a admitir que a considerava atraente.

Bom, já o tinha admitido, mas isso só seria um problema se ele permitisse sentir-se atraído.

E não iria permitir tal coisa.

– Você é a responsável por este estabelecimento? Flora levantou o queixo. Evidentemente, faltava à personalidade daquele homem a perfeição do seu físico.

– Sim, sou a pessoa à frente deste estabelecimento – confirmou Flora com mais calma do que aquela que sentia, perguntando-se como reagiria aquele homem se lhe desse um murro no nariz.

De facto, durante as duas últimas semanas, duas semanas que tinham sido um autêntico pesadelo, não se tinha sentido à frente de nada, embora o tivesse dissimulado bem. Como estava a fazer naquele momento, caminhando com passo decidido ao longo do bar, como se não temesse não encontrar o livro de reservas.

Mas a sorte estava do seu lado.

– Bem, aqui está – disse Flora deixando o livro em cima da superfície de madeira reciclada.

Ainda tinha de esperar uma semana para que lhe levassem a antena parabólica que a ligaria à Internet e ao século XXI e que tornaria desnecessário o velho livro de registos. Essa era outra das despesas que lhe tiravam o sonho.

Depois de abrir o livro, entre a série de cancelamentos, viu uma reserva para aquela noite que não tinha sido cancelada.

Flora levantou a cabeça e fez um esforço por sentir a profissionalismo que tinha posto no seu sorriso.

– Lamento ter esquecido a sua reserva, senhor… – Flora abanou a cabeça, incapaz de decifrar a letra de Fergus.

– Rocco – respondeu Ivo, indicando o apelido da sua mãe, tal como tinha feito por telefone ao fazer a reserva. Não tinha querido confessar quem era antes de perceber qual era a situação.

– Bem, senhor Rocco, peço-lhe desculpa pelo mal-entendido e pelo que talvez não tenha sido uma boa receção. Estava certa de que, devido à tempestade, todas as reservas tinham sido canceladas.

Ele desviou os escuros olhos para a janela açoitada pela chuva.

– Quer dizer que não recebe sempre assim os seus clientes?

O comentário fora feito sem sinal do humor que o teria tornado aceitável. Flora resistiu ao impulso de sair em defesa do seu estabelecimento, da sua querida casa.

O seu sorriso quase se desvaneceu ao pensar na sua irmã. Em segundos, Sami teria conseguido que aquele homem comesse da palma da sua mão. Uma vez mais, foi dominada por um profundo sentimento de perda. Quase desejou que Jamie acordasse para poder ter uma distração para a sua dor.

– Apetece-lhe um copo? Talvez lhe calhe bem, depois da viagem – Flora agachou-se para agarrar a garrafa de whisky velho que reservava para ocasiões como aquela.

A garrafa do «último recurso», como lhe chamava Bruno, para ser utilizada quando tudo o resto tinha falhado com um cliente. Tinham tido poucos clientes difíceis e, até à data, só tinham bebido aquele whisky para celebrar algo.

Ivo fixou o olhar na forma como as calças de ganga se cingiam às redondas nádegas da ruiva quando ela se agachou para agarrar a garrafa. Decidiu que era um olhar desinteressado, só que a pontada que sentiu entre as pernas não tinha nada de desinteresse.

Flora endireitou-se e pôs a garrafa em cima do balcão para que ele pudesse ler a marca e o ano, mas a expressão do homem permaneceu imperturbável.

– Oferta da casa, obviamente – disse ela imediatamente.

– Não – respondeu o seu hóspede, recusando a generosa oferta com um olhar que lhe tirou o sorriso. – E agora, se poder mostrar-me o menu…

Flora ficou perplexa.

– O menu?

Ele arqueou uma sobrancelha e contemplou o rubor que lhe subia pelo rosto.

– Fergus, o cozinheiro, já saiu. Lamento.

– A cozinha está fechada? – perguntou Ivo com incredulidade.

– Quer que lhe prepare uma sandes? – embora soubesse cozinhar, Flora sentia-se intimidada por aquela cozinha profissional de superfícies de aço e aparelhos modernos.

A careta dele deu-lhe a resposta. Não lhe custou aceitar a recusa.

– Bem, nesse caso, que lhe parece se lhe mostrar o seu quarto? – perguntou Flora. – Devido à tempestade, temos problemas com o aquecimento – mentiu Flora com mestria, embora fosse evidente que ele não acreditava nela. – Mas vou levar-lhe um radiador elétrico e o quarto ficará aquecido num instante. E agora, por favor, siga-me.

Precisamente no momento em que pôs um pé no primeiro degrau da escada, ouviram-se uns murmúrios infantis através do monitor no quarto de Jamie.

Coração em dívida

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