Читать книгу Um amor sem palavras - Lucy Monroe - Страница 6
Capítulo 2
ОглавлениеAlgumas horas depois, Kayla estava perdida a inserir o código de um programa que tinham descartado no ano anterior como inviável quando sentiu uma mão no ombro. E soube imediatamente a quem pertencia.
– Estou ocupada, Andreas.
– Não estás a trabalhar num programa de desenvolvimento.
– Sou a diretora de Desenvolvimento e Investigação. Isso significa que eu escolho os programas em que trabalho.
– E em que estás a trabalhar?
– Num programa com que o Sebastian Hawk ganhará outros cem milhões de dólares, se conseguir fazer com que funcione.
– Ainda não vendemos a empresa.
Virou-se para olhar para ele.
– Não brinques comigo, Andreas. Sei que queres vender.
– Sim, quero vender – assentiu ele, com um ar aflito.
– E quando tencionavas dizer-me?
Kayla estava prestes a gritar, a perguntar como era capaz de lhe arrebatar o seu trabalho e a sua segurança com um só golpe, mas não o fez. Para começar, porque Andreas não entenderia. O facto de estarem a ter aquela conversa deixava-o bem claro.
– Depois da nossa reunião com a menina Patterson.
– Porque me fizeste entrar no teu escritório?
– Porque ela queria fazer-te algumas perguntas.
– Porquê?
Andreas fez uma careta.
– És a minha melhor amiga.
– E vai entrevistar todas as tuas amigas?
– Não, todas não.
– Não costumas separar a vida pessoal dos negócios?
– Tu e eu trabalhamos juntos, mas continuamos a ser amigos.
Até àquele dia.
Andreas saberia como parecia arrogante ou como as suas palavras eram dolorosas? Não, claro que não.
– Tão bons amigos que não te incomodaste em dizer-me que tinhas intenção de te casar e que tinhas contratado uma casamenteira muito cara para que te ajudasse a fazê-lo. Não me falaste desse plano e também não falaste do plano de vender a empresa. Sim, somos muito amigos – troçou, sarcástica.
– Falei-te da Genevieve. – Andreas franziu o sobrolho, ignorando a venda da KJ Software. – Hoje.
Kayla sentia que a cabeça ia explodir.
– Os amigos falam dessas coisas antes de as fazer.
– Como sabes?
– Porque sei – respondeu Kayla. – Sei como ser uma boa amiga.
– Estás a dizer que eu não sou?
– Começo a pensar que não.
– Vou fingir que não ouvi isso. Sei que estás triste com a venda da empresa.
Que magnânimo da sua parte.
Kayla passou uma mão pela têmpora, mas isso não serviu para lhe tirar a dor de cabeça.
– Sei que o Bradley me teria dito.
– Pago-lhe bem, mas não o suficiente para contratar os serviços da Genevieve Patterson. Não teria puxado o assunto – troçou Andreas.
– Não precisa dela – afirmou ela. Quando Bradley decidisse assentar, fá-lo-ia ao estilo antigo: Encontraria alguém e apaixonar-se-ia.
– Isso é relevante?
Kayla apertou o lápis que usava para tomar notas.
– Para ti? Provavelmente, não.
– O Bradley não é meu amigo, é meu empregado – disse Andreas.
– Saberá depressa, assim que estiver desempregado.
– Tenciono levar o Bradley comigo.
– Ótimo. Fico contente por ele.
Andreas esboçou um sorriso de vencedor, o que esboçava quando tinha a certeza de que ia correr tudo como ele queria.
– Com o dinheiro da venda da KJ Software poderás investir na empresa nova.
– Não – disse Kayla.
– Somos uma boa equipa.
– Não.
Pela primeira vez, Andreas pareceu perturbado.
– Ainda não ouviste a minha proposta.
– Não há nada para ouvir. Não estou interessada em mudar de carreira. Adoro o que faço e quero continuar a fazê-lo.
– Abririas uma empresa para competir com o Hawk? Preciso de te recordar que a gestão comercial não é a tua especialidade?
Ai, se fosse uma mulher violenta… Andreas teria a marca dos cinco dedos na cara só para apagar esse sorrisinho de satisfação.
– Se quisesse abrir a minha própria empresa de desenvolvimento de software, procuraria outro sócio, mas não vejo nenhuma razão para deixar esta. O Sebastian Hawk respeita o meu talento e sabe que, sem mim, o departamento de desenvolvimento de software seria menos bom.
Especialmente, se levasse a equipa com ela.
– Vejo que tens uma grande opinião sobre ti própria.
– Também costumavas pensar assim.
– Continuo a pensar.
Ela não respondeu. De facto, estava cansada de falar, de modo que pôs os auriculares e começou a inserir uma nova série de códigos.
– Kayla…
– Vai-te embora, Andreas.
– A Genevieve quer falar contigo.
– Não sei para quê. Se quiser alguma coisa, pode enviar-me uma mensagem de correio eletrónico. Vai-te embora.
Se o repetisse, acabaria por se ir embora. Todos o faziam, até ele.
Ficou muito mais tempo do que esperara, mas, uns minutos depois, desapareceu finalmente e Kayla deixou cair os ombros. No ecrã do computador, desenhadas para serem visíveis apenas para a pessoa que estava a trabalhar, havia várias linhas de códigos. Todas diziam o mesmo: «Preciso que te vás embora.»
Por muito que tentasse, não conseguia concentrar-se no trabalho. Precisava de saber o que o futuro ia proporcionar-lhe quando Andreas Kostas vendesse a empresa. Suspirando, levantou o telefone para reservar um voo para Nova Iorque, onde a empresa Segurança Hawk tinha a sua sede.
Andreas resmungou um palavrão enquanto lia a mensagem efusiva, mas inflexível, de Genevieve, dizendo que devia preencher o questionário de personalidade e interesses antes do seu próximo encontro.
Se Kayla não estivesse zangada com ele, poderia ter-lhe pedido ajuda. Ela entendia muito melhor esse tipo de coisas do que ele.
A reunião com Genevieve não poderia ter corrido pior e sabia que, quando ficava teimosa, não fazia sentido tentar comunicar com ela. Kayla era ainda mais teimosa do que ele quando o assunto era realmente importante. Estava zangada porque decidira vender a empresa e por o ter sabido naquele dia, à frente de uma desconhecida.
Contar os seus planos de vender a Genevieve antes de falar com Kayla fora um erro, apercebia-se agora. Kayla era a sua sócia e devia-lhe mais respeito e consideração.
Além disso, como amiga, devia ter-lhe contado que tencionava casar-se. Porém, Kayla devia ter imaginado que esse era o próximo passo. Ela era a única pessoa com quem partilhava os seus planos. E partilhara-os. Há muito tempo, quando a sua amizade incluía sexo e não era uma sociedade.
No entanto, não gostava que estivesse zangada com ele. Kayla Jones era a única pessoa cuja opinião era realmente importante.
Sim, ia precisar de uns éclairs de desculpa para o pequeno-almoço. Ou porque não resolvê-lo naquela mesma noite, convidando-a para jantar no restaurante vietnamita de que tanto gostava?
Kayla não estava na sala de informática e não atendia o telemóvel, mas ele não estava de humor para ser ignorado.
Iria ao seu apartamento, decidiu. Não era uma viagem muito comprida, só alguns andares abaixo das suas águas-furtadas. Depois de discutir muito, conseguira convencê-la a mudar-se para o seu prédio, longe do bairro perigoso em que vivia antes.
Quarenta e cinco minutos depois, enviou-lhe uma mensagem de texto:
«Onde raios estás?»
Quando não respondeu em cinco minutos, enviou-lhe outra mensagem.
«Posso continuar assim toda a noite, até ficares sem bateria de tantos alertas.»
Também não houve resposta, mas Andreas não ameaçava em vão, de modo que se dedicou a enviar mensagens a cada cinco minutos. Começava a preocupar-se realmente quando o telemóvel tocou quarenta e cinco minutos e oito mensagens depois.
– Para! – gritou Kayla, exasperada.
– Onde estás?
– Não tenho de te dar explicações.
– Eu sei, mas temos de falar.
– Talvez devesses ter pensado nisso antes, não achas?
– Podíamos ter falado esta tarde se não tivesses saído do meu escritório com uma birra.
– Nunca tenho birras de nenhum tipo.
O seu tom era frio, sem emoção, como quando estava a proteger-se. E Andreas não queria pensar que precisava de se proteger dele.
– Sê razoável, Kayla. Estás a fazer uma tempestade num copo de água.
– Ah, sim? Vais arrebatar-me a minha casa porque essa casamenteira diz que tens de o fazer!
– Não vou tirar-te o teu apartamento…
– Não te faças de parvo! Não me refiro ao meu apartamento e sabes.
O grito de Kayla surpreendeu-o porque ela não costumava perder a cabeça. Só a ouvira gritar quando iam para a cama juntos… e não sempre porque, por muito bom amante que fosse, Kayla era comedida nas suas demonstrações de prazer.
Contudo, recordar isso não era produtivo, como aprendera depois de a tornar a sua sócia. Não podia distrair-se dos seus objetivos e, naquele momento, o seu objetivo era entender o que se passava com a sua melhor amiga.
– Kayla?
– Amanhã, não irei trabalhar. Vou tirar um dia de folga.
– Porquê?
– Tenho coisas para fazer.
– Que coisas?
– O que disse a tua casamenteira? Ah, sim, já. Não te diz respeito, Andreas.
– Para. Não sei o que se passa…
Um assobio indicou que Kayla desligara a chamada. Maldita fosse. Devia saber que não venderia a empresa sem ter um plano para os dois.
Não esperara que estivesse interessada numa empresa de capital de risco, mas era uma designer de software brilhante e não só no que dizia respeito à segurança. Kayla seria uma conselheira extraordinária para qualquer empresa em que estivesse interessado em investir e, quando se acalmasse, perceberia. Até então, certamente, devia enviar-lhe uns éclairs da sua pastelaria favorita de manhã. Comprá-los-ia a caminho do escritório, decidiu. Ou talvez devesse reorganizar a agenda para passar algumas horas com ela.
No entanto, passar tempo com ela fora do escritório era uma tentação contra a qual tinha de lutar. A paixão incontrolável que tinham partilhado uma vez tinha de ser contida, pois esse tipo de atração não levava a nada de bom. Fora a perdição da mãe depois de uma aventura ilícita com o pai, um homem casado.
Conter essa atração devia ter sido mais fácil à medida que o tempo passava, mas não fora assim. Andreas dava por si a olhar para Kayla de um modo muito pessoal, muito sexual, nos momentos mais inconvenientes.
Contudo, não podia permitir que essa fraqueza danificasse a sua amizade. Esforçara-se muito para que o lugar de Kayla na sua vida fosse mais permanente do que o de uma simples companheira de cama.
Kayla ligou o telemóvel enquanto saía do aeroporto em Nova Iorque. Um assobio indicou-lhe que tinha várias mensagens, como esperara.
Quase chocou com uma mulher que empurrava um carrinho de bebé à velocidade de um raio e um homem de fato de treino chocou contra ela, empurrando-a contra a parede, mas Kayla não protestou, mais incomodada com a ideia de ter de falar com um desconhecido do que com a dor do ombro.
Odiava viajar sozinha e sentia a falta da presença de Andreas, que parecia sempre abrir-lhes caminho. O traidor.
Quando estava prestes a entrar num táxi, o telemóvel tocou. Era uma chamada da Segurança Hawk. Enviara uma mensagem de correio eletrónico a Sebastian na noite anterior, mas ainda não recebera resposta.
– Sim?
– Menina Jones? – Ouviu uma voz feminina.
– Sim, sou a Kayla Jones.
– Ligo da parte do Sebastian Hawk.
Kayla sentiu um nó no estômago de esperança e inquietação.
– Sim?
Sebastian estava de viagem, mas tinha muito interesse em vê-la e estava disposto a almoçar com ela dois dias depois. A secretária deu-lhe o nome do restaurante e Kayla não fez nenhum esforço para disfarçar o seu entusiasmo. Agradecia-o e fê-la saber. Ao fim e ao cabo, o seu lar estava em jogo.
Depois de desligar, olhou à volta, questionando-se o que ia fazer em Nova Iorque durante dois dias. Por enquanto, decidiu verificar as mensagens. Andreas, é claro, ligara-lhe várias vezes e Bradley deixara-lhe várias mensagens desesperadas, rogando-lhe que lhe salvasse o pescoço ligando ao seu chefe. Depois de o ouvir, não sabia se rir ou chorar. Embora ela já não chorasse. Chorar nunca mudava nada e deixava-a com dor de cabeça.
Suspirando, Kayla ligou para o número privado de Andreas.
– Onde raios estás? – perguntou ele, num tom ensurdecedor.
– Disse-te que ia tirar o dia.
– Não estavas em casa esta manhã.
– E então? Talvez tenha ido para a cama com alguém – respondeu ela. Não sabia porque dissera isso, mas não o lamentava. Houve um silêncio do outro lado e Kayla até verificou o telemóvel para ver se a chamada caíra. – Andreas?
– Não vais para a cama com desconhecidos. Nem sequer falas com desconhecidos.
– O sexo ocasional não exige conversas longas.
– E como sabes?
– Falas como um amante ciumento.
E, embora tivessem sido amantes há anos, Andreas nunca fora ciumento. Desde o começo, tinham combinado que não veriam outras pessoas, não porque a sua relação era romântica, mas por uma questão de saúde.
– Falo como um amigo preocupado.
– Sou uma adulta.
– E o que raios fazes em Nova Iorque?
– Como sabes onde estou?
– Usei o localizador do teu telemóvel.
– Não te dei a palavra-passe para que possas seguir-me como se fosse uma criança.
– Sou um amigo e um sócio preocupado.
– Bom, agora, já sabes onde estou.
– Mas não porquê. Vais ver o Hawk?
– Sim.
– Mas está fora do país.
– Vou encontrar-me com ele depois de amanhã. Vou tirar o resto da semana.
– O quê? Não podes fazer isso!
– Claro que posso.
– Nunca o tinhas feito.
– Há uma primeira vez para tudo.
– O que vais fazer se o Hawk está fora da cidade?
– O que quiser, tal como tu.
– Eu não tiro dias sem avisar.
– Vais vender a empresa, isso é muito pior. Vais abandonar os teus empregados.
– Não vou abandonar ninguém. Parte do acordo de aquisição com o Hawk é uma garantia de trabalho para todos os empregados da KJ Software.
– Que bom…
– Não tinhas de ir vê-lo a Nova Iorque para confirmar isso – disse Andreas, aparentemente magoado.
– Não vou ver o Hawk para que os outros empregados não percam o seu emprego.
– Então, porque vais vê-lo?
– Tenho de fazer planos para o meu futuro.
– Eu já tenho planos para o teu futuro!
– Que interessante que não me tenhas contado nada.
– Fi-lo, sim. Quero que sejamos sócios noutra empresa.
– Não.
– Não falas a sério.
– Claro que falo – afirmou Kayla. E falava completamente a sério. – Fizeste planos para o teu futuro e a tua casamenteira tem razão, não me diz respeito, mas o meu futuro diz.
– A Genevieve estava enganada.
– Talvez devesses tê-lo dito à frente dela. Então, talvez tivesse acreditado.
– Eu não minto.
– Só me escondes coisas. Coisas importantes.
– Disse-te que tencionava falar contigo.
– Se a minha opinião ou os meus sentimentos te importassem, terias falado comigo antes de falares com o Sebastian Hawk.
E antes de contratar Genevieve.
– É por isso que vais falar com o Sebastian, para me castigar?
– Não sou assim tão mesquinha. Trata-se da minha sobrevivência.
Andreas não entenderia, claro. Por muito difícil que tivesse sido perder a mãe, por muito que desprezasse o hipócrita do pai, ele sempre tivera uma casa, uma segurança. Não fora uma menina de três anos abandonada num bar de estrada. Não sabia o que era ver o mundo a afundar-se por baixo dos seus pés, não uma vez, mas duas vezes antes de fazer os dezoito anos.
Se soubesse, não estaria disposto a vender a única coisa que lhe dera uma sensação de segurança desde a morte da sua mãe de acolhimento.
– Eu não te deixaria sem recursos. Não to demonstrei?
– Não, demonstraste-me o contrário – replicou ela, com um nó na garganta. Mas não ia chorar.
– Não, Kayla… Não se trata disso.
– Tenho de ir, Andreas.
– Para fazer o quê?
– Vê lá se percebes, poderoso Andreas Kostas: A minha vida já não te diz respeito.
– Porquê? O que está a acontecer?
– Estou a acabar uma relação que é tóxica para mim.
– Eu não sou tóxico, sou teu amigo.
Kayla não queria ouvir mais nenhuma palavra porque sabia que perderia a paciência.
– Adeus, Andreas.
Desligou antes de ele conseguir responder. Não havia mais nada para dizer. Passara seis anos à espera que Andreas Kostas se apercebesse de que tinham sido feitos um para o outro, mas isso acabara. Nem sequer eram amigos. Se fossem, ter-lhe-ia contado que estava a planear comprar uma esposa.
– Bradley! – gritou Andreas, ao ouvir o assobio funesto. Kayla voltara a deixá-lo sem acabar a conversa.
O assistente entrou a correr no escritório.
– Sim?
– Arranja-me um bilhete para Nova Iorque agora mesmo. Aluga um avião privado, o que for preciso.
– É para já – assentiu Bradley.
– E continua a tentar localizar a Kayla. Descobre em que hotel se aloja e reserva-me um quarto ao lado do dela. Tanto me faz que já esteja reservado, que expulsem o cliente.
Andreas ouviu a voz do pai a sair da sua boca e, pela primeira vez na sua vida, a semelhança com Barnabas Georgas não o incomodou.
Se tivesse de se comportar como um canalha arrogante para resolver a situação, seria um canalha arrogante.