Читать книгу Vida De Aeromoça - Marina Iuvara - Страница 11
ОглавлениеMedo de voar
Em um dia de outubro, Eva ficou insuportável depois das discussões que costumávamos ter sobre a arrumação da casa, porque as repreensões eram majoritariamente voltadas a ela.
Eu ouvia os palavrões e as coisas que ela dizia em napolitano, que contrastavam tanto com seu falar comumente desprovido de inflexões dialetais.
Seriam as radiações cósmicas, os campos magnéticos ou o barulho dos aviões responsáveis por aquela mudança de humor?
No meio-tempo, Ludovica decidiu marcar uma massagem ayurvédica para fortalecer os músculos, relaxar o corpo e estimular a circulação com a esteticista indiana que alugou um espaço na vizinhança, e nos informou que, a partir de segunda-feira, estaria de dieta, pois Eva tinha dito que ultimamente parecia ter ganhado peso.
Eu estava aninhada no sofá, com roupas de ficar em casa e um suéter bege masculino; uma coberta sobre as pernas me protegia dos primeiros ventos do inverno, e eu tentava ter um momento de relaxamento.
Não conseguia dormir porque a adrenalina do pós-voo ainda não tinha passado.
De repente, me veio a lembrança do dia anterior.
Eu tinha conhecido a bordo o casal Lucherini: a senhora Lucrezia e o doutor Massimo.
Durante o embarque, logo percebi alguns sinais de tensão em seu comportamento. Eles começavam a tomar assento, com as costas um pouco recurvadas, caminhando rigidamente, com o queixo baixo e uma atitude passiva e dócil.
Os braços dele estavam retos e estendidos rigidamente ao lado do corpo, os dela estavam cruzados, quase se protegendo instintivamente, e ambos olhavam ao redor, como se estivessem procurando algo, uma forma de escapar. As pupilas de ambos estavam completamente dilatadas, como se sofressem de midríase.
Os movimentos do corpo eram lentos, e eu percebia que eles me direcionavam um leve sorriso, que eu retribuía com graça.
Estavam rígidos na poltrona, apoiados na borda externa da cadeira, com um pé para frente e outro para trás, como se quisessem escapar. Mudavam constantemente de posição, como se a poltrona estivesse em chamas.
Meu responsável, que parecia um sósia de James Dean, sempre alegre mas com uma tristeza quase imperceptível no olhar, me fez um sinal para cuidar deles.
Aproximei-me do casal, perguntando se precisavam de minha assistência, e a senhora disse que não, enquanto sua cabeça dizia sim, e começou a balançar o busto, prendendo a respiração como se não quisesse ser notada.
Logo me dei conta da situação. A senhora sofria de um distúrbio bastante comum, que cria diversos problemas e ataca de forma indiscriminada: o medo de voar.
Eu tinha aprendido no curso como me comportar nesses casos: o medo excessivo pode degringolar em pânico, o temor pode ficar insuperável e levar até à total perda do controle.
Os sintomas são vertigem, náusea, nó na garganta, palpitações, suor frio, taquicardia.
Embora eles não tivessem pedido, dei alguns conselhos sobre o que fazer caso sentissem algum mal-estar. Reprimir o nervosismo só o aumenta. Deve-se, no lugar, aceitar os próprios medos e enfrentá-los de forma positiva, para conseguir geri-los e controlá-los.
Além disso, sugeri que não tomassem nenhuma cafeína, lessem um bom livro ou fizessem uma palavra-cruzada para manter a mente ocupada.
Durante a decolagem, vi seus rostos empalidecerem, e a chamada de comissários acender sobre eles.
Depois de tirar o cinto de segurança, fui averiguar a situação.
A senhora começou a se soltar:
Desculpe se a incomodo - disse timidamente -, mas gostaria de informar que estou aterrorizada. Qualquer movimento que sinto, tenho a impressão de que meu estômago se parte em dois. O problema é que o poço de ar me provoca sensações desagradáveis. Preciso pegar o avião para encontrar com minha mãe, que já está muito velha, na Alemanha, então não posso evitar.
Vi que ela passou a mão pelos cabelos e começou a enrolar um cacho freneticamente.
O marido aproximou-se dela, como se quisesse confortá-la, um pouco duro e desajeitado, os lábios contraídos e as mãos suadas. Também dava sinais claros de desconforto.
Os temporais são perigosos? - perguntou baixo, engolindo pedaços das palavras e mexendo os músculos faciais continuamente.
O marido começou a tamborilar com os dedos na mesinha à frente.
Com o tom seguro e decidido, disse:
Não, tudo está sob controle, nós não teríamos partido se houvesse qualquer perigo. Tudo está sob controle – repeti. – A chuva não vai criar nenhum problema para nossa segurança. As sensações desagradáveis que os senhores sentirem será por causa do vento, que causa uma oscilação absolutamente normal.
Voltei ao galley para organizar o serviço com meus colegas.
A senhora me seguiu logo depois.
Por favor, me ajude. Estou com vontade de gritar e chorar. Todo voo é uma tragédia, e eu começo a ficar nervosa um mês antes da viagem, só de pensar em fazer a mala. Morro de vergonha disso, mas não sei o que fazer, gostaria de desaparecer! – ela implorou com fervor e humildade.
Fique tranquila, a senhora pode ter a impressão de que o avião dá solavancos, mas isso é só fricção.
Fui me aproximando lentamente, até que cheguei a seu lado, sem hesitar.
Falando baixo, de modo claro e escolhendo bem as palavras:
Não se preocupe, eu estou aqui – disse levemente recurvada, aproximando-me dela para tentar dar o apoio desejado e tentando diminuir seu embaraço e aquele nervosismo.
Eu respeitava aquele medo irracional e compreendia o desconforto.
Apertei seu braço com firmeza, segurando-a delicadamente com as duas mãos, e olhei em seus olhos para estabelecer um contato mais próximo.
Acompanhei-a de volta ao seu assento.
A senhora parecia minha mãe: mesma idade, muito educada, aparentemente frágil. Foi fácil entrar em sintonia com seus sentimentos.
Durante o voo, passei pela cabine diversas vezes, trocando olhares com ela para tranquilizá-la.
Ela me chamou de novo quando houve mais uma turbulência, e eu tentei sanar aquelas dúvidas e temores que persistiam e transpareciam na postura sempre rígida.
Disse que a segurança do avião é de altíssimo nível, que os controles técnicos e a manutenção são contínuos e que os pilotos são perfeitamente treinados.
Durante a preparação para a aterrissagem, ela me perguntou, com uma tranquilidade fingida:
São normais esses barulhos ou há algo de errado?
Expliquei a ela de onde vinham todos os barulhos que poderiam causar desconfiança: o posicionamento do trem de aterrissagem, a abertura das escotilhas, a aceleração e as variações dos motores, a abertura dos flaps e slats, o toque do nosso microtelefone, os avisos de chamada dos passageiros.
Senti que ela gostou de saber daquilo, mesmo continuando a roer as unhas inconscientemente.
Aconselhei que ela inspirasse e expirasse profunda e lentamente para oxigenar o corpo e relaxar os músculos, adicionando algumas técnicas de visualização positiva para auxiliar no relaxamento.
A senhora agora parecia sentar-se com mais conforto, mais à vontade, assim como o doutor Lucherini, embora em seu rosto ainda houvesse uma expressão incerta, um pouco de fingimento, com o lado direito do sorriso um pouco mais alto do que o esquerdo.
Você é nosso anjo dos céus – disse.
Na descida, houve apenas algumas leves turbulências devidas ao mau-tempo, e o voo terminou com uma aterrissagem macia.
Senhoras e senhores, bem-vindos. Desejamos uma estada agradável.
Chegamos no horário exato a Frankfurt.
Antes de sair, a senhora me deu um abraço discreto e elegante e me agradeceu.
Eu que estava grata por sua gentileza.
O marido apertou minha mão com vigor e a força recuperada, demonstrando a classe que eu reconheci desde o início.
Até logo!
Estas são as lembranças que nos vêm de súbito quando estamos tentando descansar em casa. De repente, ouvi a porta bater.
Eva havia saído.
Pus a coberta sobre o rosto para evitar a luz que entrava pela janela.
Chegara a hora de relaxar. Eu estava quase dormindo, perdida nos pensamentos, achando que voar, ficar preso dentro de um avião, pode não ser nada natural, portanto, desenvolver medos inconscientes é perfeitamente compreensível. Lembrei naquele momento histórias do meu passado. Compreendi como elas podem nos influenciar por praticamente toda a vida.