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MÃE Branco
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Não é verdade, mãe, o que me dizia da vida: que todos os dia s são iguais e que vagamente o sol ilumina um mundo ofuscado pelo ódio. Se da minha parte é lícito a recordação posso dizer-te que já desde então amava o que não me foi dado, e que amargamente desejava aquela existência que tu me negaste.
Desde o primeiro instante onde percebi que ali estava, ainda perdido na eternidade do meu infinito, tão confuso no limite inviolável entre a vida e a morte, senti o peso dos teus remorsos sobrecarregar-me nos ombros e uma vez sem som repelir-me distante do mundo. Tinha apenas nascido e uma faísca de repúdio acendeu-se no meu coração e me queimou. Então uma dor densa e indomável escavou-me dentro uma angústia sem lágrimas, enquanto no meu coração já acariciava-me a ideia de ser teu filho.
Não sabia não agradar-te, ainda que com terror reparavas a tua imagem no espelho, ou que tremias ao único som da palavra “mamã”. Não percebia o por quê da minha existência se tu não me amavas, e não me dirigias por acaso uma palavra amiga. Sei apenas que esperava e sofria, e adormecia chorando entre os horríveis fantasmas do meu temido destino. Envolvido numa ténue neblina não conhecia as injustiças e as humilhações do teu mundo, todavia o teu choro já era notável para mim e nele, como uma doce canção de embalar, encontrava o meu repouso. Tinha aprendido a reconhecer a tua voz, e a partir da escuridão consumia as minhas forças na tentativa de entender-te e de encontrar um ponto firme no meu incerto universo.
A tua parte exterior, o teu doce corpo, os ruídos alcançavam-me submissas. Mas era o batimento do teu coração que gostava de ouvir, tão misterioso e absorvido, e do seu único som nutria-me à espera que todo o meu corpo se formasse. E enquanto o sangue começava a escorrer-me as veias e meus olhos fechavam-se, esperando de abrir-se de novo diante de ti mais tarde, empregava a eternidade do meu tempo a imaginar o teu rosto e a fantasiar sobre a vida que teria tido, questionando-me se teria sido boa ou não. Era tão doce dormir sobre o teu seio e perceber a partir do teu ventre o bom aroma das flores, e escutar pingar intensamente a chuva nos vidros, e ver as horas passar embora estavas sempre triste e as tuas únicas palavras falavam-me de morte. O que sabia da vida? Nada. Todavia a amava e não desejava que entrar ali, e medir-me como homem nas minhas acções diante a presença de Deus.
Mas tu agrediste-me com os teus discursos: que mesmo uma galinha come os seus ovos, que todos os animais matam os filhos que não podem nutrir. Que o peixe grande come o peixe pequeno e que não há espaço para as ovelhas num mundo de lobos. Que uma criança é criança só quando é nascido e que antes não existe nada.
Nada? Mas então eu o que era? Eu existia. E sabia da existência desde o primeiro instante, desde quando uma força indescritível me arruinou da minha letargia, e dividiu a minha primeira célula, e ordenou ao meu coração “Palpita!” aquela mesma força que impede aos planetas de chocar-se, que impõe ao mar de permanecer confinado no seu berço, no verão de fazer crescer o grão e dirige enfim o curso dos rios. Aquela força que separou a mundo do caos e forçou todo o universo a nascer.
Mãe, acreditas realmente que seja o querer do homem a mover o criado? Eu sei pelo contrário que tudo o que existe neste mundo é regido pelo Amor, e que só no seu nome no céu brilham as estrelas.
Então tu falaste para mim das guerras que devastam a mundo, de fome e das pestes, e de todos aqueles males pelos quais não há mais remédio. Todavia, mãe, todo homem é um sopro de ar puro, um ponto interrogativo nas inumeráveis probabilidades do criado. E aqueles pintainhos que a galinha devora não são germes da próxima vida que se reencarnará um dia? E eu, se tivesse sido nascido, não poderia amar-te? Depois mais nada. A partir daquele dia não me dirigiste mais a palavra. Esperaste assustado o meu inevitável fim, uma palavra incompreensível para algo que nunca teve um começo.
No fim ouvi uns passos à minha volta e vozes duras e ameaçadoras que me advertiam do meu inelutável destino. Tu adormeceste no momento em que as mãos invisíveis me arrancavam do teu ventre e instrumentos afiados cortavam-me as carnes. Tentaste resistir mas no fim cedeste àquela dor e me deixaste sair.