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Capítulo 3

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O rosto dela empalideceu mais.

– Não estou grávida.

– Faz o teste e prova-o. Não me vou embora até o fazeres.

Ela desviou o olhar por cima do seu ombro.

– Esperas alguém? – perguntou ele, num tom cortante. – Outro amante talvez?

– A Vanessa gosta de me visitar.

– A mãe desconsolada que visita a viúva emocionada? Que bonito…

Enojava-o que a tia, como todos os Pellegrini, achasse que tudo começava e acabava com Natasha. Fora a preocupação e compaixão de Francesca pela jovem viúva que começara uma série de acontecimentos que o levara àquele momento.

– Se não queres que me encontre aqui e tenhas de lhe explicar porque tenho isto na mão, recomendo-te que me deixes entrar – continuou Matteo.

Ela suspirou e afastou-se.

Pela segunda vez nesse dia, entrou em casa de Pietro com o mesmo desprezo por si próprio do que da primeira vez. Só estivera uma vez naquela casa antes de Pietro morrer e fora enquanto Natasha estivera em Inglaterra a visitar os pais.

– Tiveste o período desde…?

Não conseguiu acabar a pergunta, mas ela corou por ser tão íntima.

– Não – sussurrou Natasha.

– Quando devias tê-lo?

– Há alguns dias – respondeu ela –, mas nunca fui regular. Não significa nada.

– Estás cansada, tens dores nas costas e foste três vezes à casa de banho durante a reunião de duas horas. O meu voo de regresso a Miami sai dentro de três horas. Faz o teste. Se o resultado for negativo, poderei sair de Pisa e ambos esqueceremos o que aconteceu.

Nenhum deles falou do que aconteceria se o resultado fosse positivo.

Natasha olhou para a caixa antes de lha arrebatar e afastar-se. Ele ouviu que subia a escada e que fechava uma porta.

Matteo, uma vez sozinho, foi para a sala, sentou-se no sofá e segurou a cabeça enquanto esperava. Na sala contígua, havia um bar muito bem sortido e Pietro e ele tinham bebido juntos. Sentiu vontade de se servir de um copo, mas a rejeição foi mais forte. Já se servira da esposa do primo e amigo e não queria beber o seu álcool.

Lera as instruções e sabia que o resultado do teste se saberia em três minutos. Olhou para o relógio e verificou que Natasha estava há dez minutos no andar de cima. O tempo parecia eterno e só podia ocupá-lo a olhar para os móveis escolhidos pelo homem que fora como um irmão para ele. Não conseguia ver a influência de Natasha na decoração.

Lembrou-se de que, uma vez, durante uma conversa por telefone que tinham tido quando ele voltara para casa depois de um turno de dezoito horas, lhe contara que queria ser decoradora de interiores.

Matteo achara que nunca se odiaria tanto como quando tinha dez anos e arruinara a vida do irmão mais novo com a sua negligência. O ódio que sentia naquele momento era muito parecido, era como uma sensação de podridão… E o que sentia por Natasha não ficava atrás. Maldita fosse. Fora a esposa de Pietro e, horas depois de o ter enterrado, precipitara-se para os seus braços e ele…

Maldito fosse, deixara.

Adoraria apagar todas as lembranças dessa noite, mas tinha cada segundo gravado na mente. Naquela manhã, acordara com a sensação de que fora o primeiro a possuí-la e de que algo correra mal. Era uma sensação que o incomodava e que crescia à medida que o tempo passava.

Esfregou a nuca com uma mão e amaldiçoou a memória enganosa.

Natasha não era virgem. Estivera casada e tentara ter um filho com o marido!

Passaram mais cinco minutos antes de ouvir movimentos e ela aparecer à porta.

Soube a resposta ao vê-la.

– Tem de haver… algum erro – balbuciou Natasha. – Tenho de fazer outro teste.

Ficara tanto tempo a olhar para o resultado positivo que os olhos se tinham toldado.

Durante duas semanas, recusara-se a acreditar que podia acontecer.

Tinham sido inconcebivelmente insensatos, mas a natureza não podia ser tão desumana com eles. O remorso e o desprezo por si próprios com que teriam de viver não eram castigo suficiente?

Uns olhos verdes e inflexíveis fixaram-se nela e passou um instante antes de ele falar.

– Esse teste é o mais confiável do mercado. Se é positivo, estás grávida. Isso só deixa um enigma por resolver, quem é o pai?

Com medo de desmaiar, sentou-se no chão e abraçou os joelhos.

– Quando foi a última vez que o Pietro e tu…?

O desagrado que se refletia na sua voz, embora não tivesse acabado a frase, foi como uma onda abrasadora na sua cabeça gelada e, pela primeira vez na sua vida, não soube o que dizer ou fazer. Sempre, quando tivera um dilema, a resposta fora muito clara, tinha de fazer o que os pais queriam. Fora por isso que se casara com Pietro. No entanto, naquele momento, não pensava nos pais.

– Tenho de interpretar, pelo teu silêncio, que o Pietro e tu foram… ativos até à sua morte?

Como podia responder? Não podia.

– Se o teu último período foi há um mês, parece lógico pensar que estivemos juntos quando eras mais fértil. No entanto, todas as mulheres têm ciclos diferentes e se o Pietro e tu… foram íntimos até à sua morte, existe a possibilidade de ele ser o pai. Quem mais está na lista?

A cabeça dava voltas porque ele, como médico, entendia muito melhor do que ela como o corpo funcionava e não entendeu o que queria dizer.

– O quê…?

– Não te faças de parva. Com quem mais foste para a cama no último mês?

– Isso é insultante – queixou-se ela.

Ele deixou escapar uma gargalhada.

– Não me interpretes mal, estás a representar muito bem o papel de viúva desconsolada, mas, quando estiveste comigo, parecia que estavas com cio e não seria de estranhar que estivesses com outros.

Com o cio? Natasha tapou os ouvidos e cravou as unhas no couro cabeludo. Como era possível que ele, um médico, não tivesse percebido?

Houvera um momento, quando a penetrara, em que parara, mas só durara um instante, porque o beijara com avidez para que continuasse o que começara… e tivera medo de que descobrisse a verdade.

– Estou à espera da resposta. Quantos?

Natasha lembrou-se de que houvera um tempo, muito longínquo, em que o leve sotaque italiano do seu inglês impecável fora como um bálsamo para ela. Supôs que fosse o que acontecia quando se criava, do zero, uma empresa que valia milhares de milhões, a humanidade mais elementar desaparecia com os princípios.

– Nenhum. Não houve ninguém.

– Uma ecografia vai dizer-nos a data da conceção com precisão e, assim, poderemos saber quem é o pai.

O tom cortante de Matteo afetou-a.

A ideia de uma ecografia, de ver esse ser minúsculo que crescia dentro dela… De repente, percebeu que estava grávida, que ia ser mãe.

Levou uma mão à barriga, apagou o rosto crispado de Matteo da mente e imaginou a vida que estava a gerar-se dentro dela. Cumprimentou o bebé em silêncio e sentiu uma felicidade avassaladora.

Há muito tempo que queria ter um filho. Depois do que acontecera com Pietro, pensara que seria um caminho comprido e tortuoso, se conseguisse e se aceitasse seguir o caminho que ele queria para o ter. No entanto, acontecera como por arte de magia.

Ia ter um bebé.

– Como podes estar a sorrir neste momento? – perguntou Matteo. – Parece-te divertido?

Parou de sorrir, embora não soubesse que o fazia, e endireitou-se. Fosse o que fosse que o futuro proporcionava, mesmo que fosse apenas humilhação, tinha de pensar nessa pequena semente. Não podia cair no desânimo, seria forte, seria uma mãe.

– Estou grávida – afirmou. – Não podes saber há quanto tempo o desejo e, sim, vou sorrir e alegrar-me com a conceção do meu filho porque é um milagre.

– Então, tencionas tê-lo.

– Como podes perguntar uma coisa dessas?

Aproximou-se, pôs-lhe uma mão na nuca e observou-a como se a examinasse.

– Porque te conheço, Natasha – declarou ele. – És egoísta, só pensas em ti e no que te dá jeito.

Natasha, atónita, ficou em silêncio devido à sua proximidade, ao calor da sua pele, às carícias quase distraídas dos seus dedos, devido às lembranças da única vez que tinham estado juntos. Pestanejou várias vezes, para que o cérebro funcionasse outra vez, respirou fundo, levantou uma mão, agarrou a mão dele, cravou-lhe as unhas e retirou-a do pescoço. Endireitou-se o máximo possível, embora fosse quase trinta centímetros mais baixa do que o metro e oitenta dele.

– Não me conheces – replicou ela. – Se me conhecesses, não terias tido de me perguntar se ficaria com o bebé. Farei mais do que ficar com ele, vou amá-lo e criá-lo.

Já o desejara uma vez. Se lhe tivessem dito, quando tinha dezoito anos que, sete anos mais tarde, estaria à espera de um filho de Matteo, daria saltos de alegria. No entanto, não podia dizer-lhe porque não acreditaria.

Esfregou a mão onde lhe espetara as unhas.

– Espero, pelo bem do teu filho, que as tuas palavras não sejam tão vãs como costumam ser, mas o tempo dirá. Tenho uma amiga em Florença que gere uma clínica ao lado da minha e que tem os equipamentos mais modernos e precisos. Vou levar-te lá. Ela poderá descobrir a data da conceção para que possamos determinar se existe a possibilidade de eu ser o pai. A discrição dela está garantida e ambos concordamos que a discrição é imprescindível.

Natasha fez um esforço para respirar.

Estava tudo a acontecer muito depressa. Não podia permitir que a manipulasse, mas também era verdade que tinha de fazer o que fosse melhor para o bebé e que precisava de toda a discrição que conseguisse até decidir o que ia fazer.

As repercussões eram terríveis e não queria pensar nelas. Quantas vidas ficariam arruinadas quando se soubesse a verdade?

O pior de tudo era que nunca poderia dizer toda a verdade, pois ninguém podia sabê-la. Como Matteo não podia saber que ela já conhecia uma clínica excelente em Paris e que também garantia a discrição. Também não podia saber que era o único homem que podia ser pai do bebé.

Dominou outro enjoo e assentiu.

– Quando?

– Dentro de algumas semanas. Então, os batimentos do coração do bebé já devem ouvir-se.

– Tão cedo?

Há vinte minutos que sabia que estava grávida e ele já estava a dizer-lhe que o coração estava a formar-se. Era incrível.

– A gravidez conta-se desde o teu último período e, dentro de algumas semanas, estarás grávida de seis semanas. Só a ecografia nos dará uma data precisa da conceção.

– E poderei ouvir os batimentos?

– Ambos poderemos. – Com um ar inexpressivo, dirigiu-se para a porta. – Estarei em contacto.

Então, quando ouviu que a porta se fechava, deixou-se cair no sofá com a cabeça entre os joelhos. Magoaria muitas pessoas, Vanessa, Francesca… Sabia que olhavam para a barriga dela desde que se casara com Pietro para ver indícios de que estava a gerar uma vida e os olhares tinham sido ainda mais evidentes desde que ele morrera. Sabia como ansiavam que estivesse à espera de um filho de Pietro e Francesca já suspeitava.

Recostou-se e esfregou as têmporas.

Não sabia como resolver aquilo. Todos seriam magoados, independentemente do que fizesse. Teriam ilusões que destruiria mais tarde. Além disso, havia o património dos Pellegrini…

Era demasiado para ela.

Natasha, emocionada, começou a chorar.

Tinha de ser assim. Rodeou a barriga com os braços como se quisesse proteger a semente pequena e já forte, mesmo que fosse das lágrimas.

A realidade crua ia devastá-los a todos e Matteo entre eles.

Seria melhor aguentar e deixar que todos, incluindo os pais, a considerassem uma perdida do que deixar que isso acontecesse. Quase não conseguia suportar imaginar o desprezo e desilusão que veria nos seus olhos quando descobrissem que estava grávida e que Pietro não era o pai.

A única coisa que fizera nos seus vinte e cinco anos de vida que agradara aos pais fora casar-se com Pietro. Permitira-lhes gabar-se de que o grande Pietro Pellegrini era o seu genro e tinham-no feito sempre que podiam.

Natasha limpou as lágrimas e soprou com força.

Nada ia mudar, por muito que chorasse. Ia ser mãe e isso significava que tinha de ser forte pelo filho. Além disso, por muito que chorasse, era preferível que todos a considerassem uma perdida a deixar que todos soubessem que Matteo era o único candidato a ser o pai.

Ninguém podia saber que fora virgem até à noite depois do enterro do marido.

A clínica onde Matteo a levou era num edifício medieval lindo no centro de Florença e podia parecer um dos muitos museus que davam fama à cidade.

O interior era o contrário. Ninguém poderia duvidar de que entrara num centro médico de vanguarda. A rececionista fria fez uma chamada e, um instante depois, Julianna, a diretora, saiu por uma porta para os cumprimentar.

Matteo conhecera Julianna, uma mulher alta e esbelta de quarenta e tal anos, porque se tinham encontrado em muitas conferências. Cumprimentaram-se como velhos amigos e trocaram alguns beijos. Depois, apresentou Natasha e levaram-nos para a sala impoluta onde estava tudo preparado para a ecografia.

– Importas-te que o doutor Manaserro fique enquanto a faço? – perguntou Julianna a Natasha, em inglês.

Ela desviou o olhar para ele com uma certa surpresa, antes de encolher os ombros.

– Vais ficar um pouco… exposta – avisou Julianna.

– Pode ficar, se quiser – respondeu ela, inexpressivamente.

Matteo sentiu uma pontada de remorso tão inesperada como desagradável.

Era a primeira vez que via Natasha em duas semanas. Nesse tempo, para além de organizar aquela ecografia, fizera o que pudera para a esquecer e à gravidez.

Repetia-se que havia poucas possibilidades de ser o pai e que era improvável, mesmo que a ecografia confirmasse que podia ser. Só tinham estado juntos uma vez enquanto Pietro e ela…

Sentiu um nó no estômago só de pensar em todas as vezes que teriam estado juntos nesses anos. Pietro e Natasha tinham tentado ter um filho, Pietro contara-lhe da última vez que o vira.

Além disso, ela estava contente por estar grávida e dissera que era um milagre. Era porque desejava ter um filho ou porque gostava que uma parte de Pietro pudesse estar a gerar-se dentro dela? Tinha de ter sentido alguma coisa pelo marido, independentemente do que fizera na noite do seu enterro. Teria reagido assim se achasse que ele poderia ser o pai?

Não podia pensar isso. Apagara Natasha da mente desde que aceitara o pedido de Pietro algumas horas depois de se beijarem. Nunca pensava nela, nunca pensava em Pietro e ela juntos. Só a detestava quando tinham de se encontrar e aprendera a disfarçá-lo, evitando-a sempre que podia. Virara a página depressa e, além disso, Pietro era um amigo e um primo demasiado íntimo para que uma mulher se interpusesse entre eles.

Pietro não soubera que Natasha e ele se tinham aproximado, algo que, pensando bem, fora estranho, porque Pietro e ele contavam muitas histórias sobre mulheres. Na altura, parecera-lhe demasiado especial para falar dela, algo que, a posteriori, fora cómico. Devia ser um arrebatamento de sentimentalismo e nunca mais voltara a pensar em algo tão ridículo.

Se fosse o filho de Pietro, também se alegraria por uma parte do melhor amigo permanecer viva, mesmo que a mãe fosse uma maldita farsante.

Tinha de ser de Pietro. Se não, destruiria tudo.

Deixá-la-ia em paz e dominaria a vontade de lhe ligar a cada cinco minutos para se certificar de que estava a comer e a dormir bem. Ao vê-la naquele momento, parecia-lhe que não comera decentemente desde a última vez que a vira.

– Muito bem, Natasha, queres uma ecografia para saber a data, não é?

Ela assentiu.

– Foste examinada por um médico ou uma parteira?

Ela abanou a cabeça.

– Vais ter o filho aqui ou em Inglaterra?

Voltou a olhar para Matteo e Julianna sorriu tranquilizadoramente.

– Não faz mal, não há respostas certas ou erradas.

– Ainda não pensei nisso – sussurrou Natasha.

– Tens muito tempo para decidir, mas temos de te fazer um seguimento. O nosso ginecologista é o melhor de Florença, mas posso recomendar-te uma mulher, se preferires.

Matteo sentiu que suava e teve de morder a língua para não intervir. Uma vez ali, com o ecrã do ultrassom ligado, queria acabar aquilo.

– Pronta…?

– Sim.

Respondera no tom mais animado que ele ouvira desde que lhe abrira a porta.

– Deita-te, levanta o top e baixa a saia para despir as ancas e a barriga.

Matteo olhou para o ecrã. Natasha acabou, Julianna sentou-se. Embora não estivesse a olhar diretamente para ela, viu Natasha a mexer-se quando lhe aplicaram o gel na barriga.

Então, Julianna pegou na sonda e passou-a por cima do gel com os três olhares fixos no ecrã.

– Aqui está! – exclamou Julianna. – Vês, Natasha? É o teu bebé.

– Onde? – perguntou Natasha, esticando o pescoço para tentar vê-lo.

– Ali. – Julianna pôs um dedo no ecrã. – Vês?

Natasha não sabia o que esperara ver, nem sequer a sua imaginação vira um bebé em miniatura, mas esperara mais do que aquela massa. Então, Julianna tocou em algumas teclas e focou melhor. Continuava a ser apenas uma sombra, mas tinha algo mais definido que fez com que o seu coração, já bastante acelerado, quase rebentasse.

– Queres ouvir os batimentos?

Um instante depois, o som mais maravilhoso que ouvira na sua vida ecoou pelo quarto.

Não se atreveu a olhar para Matteo. Se visse alguma coisa no seu rosto que não fosse felicidade, estragar-lhe-ia para sempre aquele momento tão especial. Continuou a olhar para a pequena avelã e a ouvir os batimentos, até Julianna se levantar e lhe limpar a barriga com uma toalhita.

– Parece estar tudo bem, por enquanto.

– Por enquanto?

– Sou médica e nunca falamos em termos absolutos. – Julianna sorriu. – O que posso dizer com sinceridade é que, neste momento, o teu filho está a evoluir bem e que devias estar contente com isso. Quanto à data do parto…

Julianna disse uma data no fim de junho e Natasha fechou os olhos. A julgar pelo movimento de Matteo na sua cadeira, ele fizera a mesma conta. Sabia que, segundo essa data de nascimento, Pietro não podia ser o pai, que a data de conceção tinha de ter sido depois da sua morte.

Sabia que era o pai do bebé.

Poder e desejo

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