Читать книгу Crónicas Eróticas, Irónicas, Um Pouco Espaciais - Lorenzo Longo - Страница 3

Espaço-tempo

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Estava no comboio que me levava para Milano, respirava o habitual ar do comboio, um misto de depressão e solidão, muito próximos à Puglia para não sentir a falta dos amigos e lugares, muito distante do destino para se sentir eufóricos no regresso a “casa”. Em cada estação o mesmo espectáculo: namoradinhos que beijocavam-se antes de separar-se, famílias que acompanhavam o papá, grupos de trabalhadores empenhados com sacos e mãos com dedos grossos como pepinos, grupos de trabalhadores de qualidade que esconjuravam o seu evidente estado de emigrantes vestindo elegantemente e manejando as últimas novidades da electrónica e sobretudo trazendo na mão uma reserva para um confortável beliche e não um simples lugar para sentar.

Eu, sempre a balançar entre a observação e a vida do presente modulava as minhas emoções passando dum ao outro estado, após a primeira hora de viagem sentia-me projectado numa outra dimensão espácio-temporal: o comboio desengatava-se dos carris e voava como naquele cartão/desenhos animados Galaxi Express 999 e presentemente todos os hóspedes sentiam-se projectados numa realidade com regras, hábitos, vários desejos.

A minha viagem tinha algumas paragens fixas: no principio lia o meu livro procurando evitar de bater papo com os outros passageiros, depois ficava fora do compartimento no corredor reparando e perscrutando novas chegadas, deslocações, depois um demorado passeio nos outros vagões à procura de rostos conhecidos ou caras femininas… a novidade do beliche para as mulheres tinha povoado os comboios de raparigas mas fechavam-se de novo no seu bunker ciumentas do seu estado de apartheid, depois havia os vagões dos lugares sentados, também eles povoados de rapazes e raparigas, sobretudo estudantes, corajosas, impávidas dos riscos do comboio nocturno, habituadas à vida dura dos deslocados. Naquela noite tinha um lugar para sentar e preferia-o, as incríveis mudanças da população do comboio da noite excitava-me e muito cedo o observador deixava o lugar a um cínico pesquisador de vicissitudes humanas.

A minha técnica era sempre a mesma: no princípio lia, abstraia-me à chegada dos viajantes que partilhariam o meu compartimento. Depois quando se enchia e a gente queria começar a dormir (incrível como a vontade de dormir torna-se forte no comboio) eu saia com o meu livro para ler à luz fraca no corredor do comboio, realmente os meus sensores punham-se à escuta de qualquer emoção, sensação, desejo que passasse nas proximidades… Esperava a passagem de alguma rapariga que tivesse o prazer de esfregar-se passando pelo corredor estreito (pouquíssimas), esperava nalguma pausa nas minhas proximidades dalguma mulher graciosa para poder talvez falarmo-nos e namoricar.

Depois dalguns minutos eis que uma para nas proximidades, um sorriso, um movimento irregular do comboio e aqui estamos próximos a desculparmo-nos e logo depois a falar. Estuda arquitectura, em Torino, Loredana, ultimo ano, o namorado está em Puglia e ela volta regularmente para encontrá-lo. Conversamos muito de todos os assuntos, concordamos sobre diversos assuntos, cresce a simpatia, enquanto falamos deixamos passar passageiros com malas gigantes e muitas vezes infiltrávamo-nos contra as paredes para deixar-lhes passar, dêmo-nos cúmplices, começamos a murmurar intimamente e a criticar para direita e para esquerda quaisquer passos mesmo a 1 quilómetro de distância, vimo-nos outra vez quase possuídos daquela que em Monopólio chama-se “aperta-lhe” uma condição semelhante à embriaguez, pelo qual ri-se por nada mas em simbiose.

Toco-lhe os ombros, ela pega-me as mãos, as bocas ficam a 20 cm de distância, as pernas tocam-se, sempre um sobressalto da locomotiva empurra-me contra ela. Encontramos a desculpa que estamos a incomodar aqueles que dormem para irmos num lugar mais calmo, mas não achamos, enquanto íamos sem rumo nenhum lugar nos satisfaz, talvez estão todos bastante cheios, encosto-a ali quase por brincadeira, o ímpeto não me permite de reflectir que já tenho em mente um desenho bem definido: “e se fossemos na casa de banho?”.

Risadas, e como por brincadeira entramos, mal fechada a porta explodimos num beijo apaixonado, é baixinha, por isso tenho que inclinar muito, sem pensar duas vezes baixa as minhas calças e com um simples gesto tendo uma saia leve despiu as cuecas virou e inclina ligeiramente, penetro-a com um empurrão ligeiro. Cessamos de rir, desfrutamos intensamente, não é lindíssima mas uma incrível essência de comboio paira no ar, vejo-a muito sexy, os seus gestos inseridos no contexto são intensos, excitantes, pego-a com o verdadeiro prazer, penso que no comboio os valores em campo modificam-se, a estética deforma-se como impressionada pela força dum buraco preto, que revira, plasma, molda com novos cânones. É verdade estou a desfrutar há muitos e intensos minutos, não tenho vontade de esperar nem um instante, mas o meu orgasmo tem os seus habituais tempos por isso prossigo concentrado sobre mim mesmo e vejo-a no espelho opaco da casa de banho do comboio desvairada e sonhadora, a sua vontade lhe manifestou inesperada e agora presa entre os fogos da paixão, do sexo, do forte sentimento do inesperado e do desconhecido desfruta também morde-se os lábios para não deixar-se ouvir. A posição não é das mais confortáveis por causa de muitos cm de diferença mas em certas ocasiões a altura, não sei como, consegue sempre para não ser um problema, dalgum modo, segurando-lhe ora uma perna, ora segurando-se ela mesma sobre algum ponto de apoio, a penetração procedia fluida, intensa, viva, progressiva. De repente, incidente dramático, toca o seu celular.

Como se estivesse no teletransporte da Enterprise e tivesse sido, a dado passo, teletransportada numa outra dimensão vejo-a desmaterializar-se, durante algum instante pela inércia continua a mover-se ao meu ritmo mas já está ausente, outros poucos empurrões e se subtrai à penetração, a esfrega continua da saída provoca-lhe talvez alguma ultima e intensa manifestação de prazer mas o sente o corpo não a cabeça, rapidamente vestiu-se, arrumou-se, como se o namorado não estivesse ao telemóvel mas fora da casa de banho, e com um gesto fulminante sai deixando-me semi-nu, com o pénis vermelho rubro todo molhado pelo seu desejo mas enfim abandonado, triste e desolado…

Não a vi mais durante toda a noite, nem procurei nela, sabia que tinha feito parte durante uma hora da minha viagem mas enfim aquele sonho tinha esmorecido, inútil procurar lembrá-lo, consciente destas regras de ferro parti de novo donde tinha deixado, nas proximidades do meu compartimento.

São 23:00, enfim a maioria dorme, passamos quase todas as cidades da Puglia onde acontece a copiosa subida de passageiros, falta Foggia, ou não? Não sei, em todo o caso o movimento no corredor terminou, as brincadeiras foram feitas, agora não resta que esperar num golpe de sorte no interior do compartimento.

Entro, já estão ocupados 3 lugares, o meu é o 44, estou no meio entre a janelinha e o corredor, máxima possibilidade de estar próximo a uma mulher. O lugar a frente está desocupado, os 2 perto da janelinha ocupados, um rapaz e uma rapariga, casal de namorados, talvez. Aproximaram-se aos 2 lugares frontais e estenderam-se: a rapariga é protegida no meio contra a janelinha, um homenzarrão pelo contrário ocupa o lugar perto do corredor, uma sacola desportiva mas na realidade tido como prenda com a colecção de pontos Q8 dá-se ares de importante nos respectivos espaços. Dorme, ultrapasso-o saltando-o com calma e atenção e penso ao coitado que dormirá em frente dele: onde vai colocar as pernas? Ajeito-me no meu lugar, visto que estou sozinho e vista a hora deito-me no meu lugar e naquele frontal, aqui está a minha cama, bastante curta para ser cómodo mas suficientemente alargado para colocar-se na horizontal. Para o resto correu mal, seja para direita como para esquerda nada que possa transmudar-se em oportunidade…

Organizo-me melhor, se me deito de costas não me dá jeito e sou forçado a dobrar os joelhos, se me deito de lado assumo a posição fetal que consigo manter apenas limitadamente e em todo o caso não gosto de dar as costas aos estranhos. O sono tarda a chegar, os 2 namorados parecem não encontrar paz mas são educados, o homenzarrão ressona mas não bastante ruidosamente mas é um barulho de fundo do comboio a incomodar-me e a atrair-me, o baloiço tranquilo da corrida normal à passagem nas pequenas estações (onde não para) torna-se um insuportável martelar rápido e contínuo, um ensurdecedor e metálico bater dos carris contra a linha férrea e os órgãos de troca. Enquanto rodopio na “minha cama” as luzes emergem pelos buracos do compartimento inutilmente cobertos de cortinas, a sombra joga com a luz que provem do exterior e vêm pôr em foco vários pormenores. Num instante, à passagem duma estação iluminada, cruzo o olhar da rapariga à minha esquerda, é um momento duradoiro, o seu rosto está cansado mas os seus olhos são vivos e repletos daquele espírito mágico do comboio nocturno, é uma adepta da mesma religião, ou então é um espírito à deriva e foi activado pelo cruzar dos nossos olhares. A segunda hipótese agrada-me mais… Torna-me, enfim impossível conseguir adormecer, o pensamento está naqueles olhos, naquela energia que enfim emana do seu corpo e me atinge. Quase para sermos descobertos o namorado vira-se e me repara, os meus olhos ficam fechados mas controlam, não ouve nada, felizmente, virou-se apenas porque ao mover-se tinha temido de ter-me acordado. “Não me despertaste, prezado durma tranquilo…” A dado passo oiço uma frase que ilumina as minhas esperanças: “Desculpa Guido, podemos trocar de lugar? Há uma corrente de ar que está a provocar-me o torcicolo”.

O fiel Guido consente sem protestar, a sua linda e delicada pede, ele não tem motivo para duvidar, louco!

A rapariga (Elena parece-me de estar a perceber, de Troia acrescento quase por reflexo escolásticamente memorizado… O nome promete muito bem…) ajeita-se de cócoras ao seu namorado dando-me as costas, mas não há nenhum risco também eu estou de costas à ela. É suficientemente alta, bem constituída fisicamente, e as estreitas calças jeans deixam bem desenhadas as lindas pernas e o agradável traseiro. Cabelos loiros e olhos azuis mas eu não a definiria linda, o rosto é importante mas não nesta circunstância!

Recuo ligeiramente logo depois dou um encontrão com o meu traseiro no seu, retiro-o suavemente mais pouco tempo depois venho alcançado, coincidimos e sabemos que estamos nos tocando, bem tinha previsto… agora trata-se de perceber até onde isso nos levará, se quer permanecer na cabina com o maior risco e mínima satisfação, ou se aceitará uma deslocação para um lugar mais tranquilo. Movemo-nos e sinto o seu glúteo quente a esfregar-se no meu, estico uma perna e procuro a sua que logo me alcança, estamo-nos enrolando! Sinto todo o peso e a força do momento, fico enfeitiçado, vencido, constrangido no jogo de toques secretíssimos. Fico suado, vermelho na cara, excitadíssimo… a calça fica inchado e não consegue mais esconder o meu estado, tenho uma camisolinha de algodão que uso como cobertor, viro para o outro lado desta forma para tê-la de costas diante de mim. O espectáculo é fantástico: a calça jeans de cintura baixa chegou às alturas, ou melhor baixezas vertiginosas, e vejo a fenda do traseiro, está deitada por isso o traseiro vem exposto e exibido de forma dolosa. Sente e percebe que virei-me, e em minha honra dobra-se ainda mais assim para mostrar melhor ainda as suas graças. Reparo a minha mão quase a medir a largura antes de lança-la no empreendimento e esboço para aproximá-la, estico o braço o mais possível sem despertar nenhuma duvida e ganho centímetros em direcção a pele das ancas, sinto-me transpirado pela cama e implacável baloiço do proceder do comboio, tutum… tutum… e os dedos vinham induzidos para a pele nua descaradamente deixada à mercê do meu olhar e do meu desejo, tutum… tutum… e as suas ancas como oásis no deserto atraiam o meu membro e teleguiavam para o pecaminoso contacto que enfim acontece como uma explosão, um arco eléctrico, uma reacção química explosiva sancionou a união do dedo médio e da pele do glúteo. Deixei escorrer o dedo ao longo da superfície descoberta como uma haste duma flor, dócil deixava um vestígio de emoção que percebia a partir da pele abrasada, porém todo o seu corpo, impregnado de sensações jamais experimentadas não traía um movimento externo, tudo acontece no interior, fechado no seu óvulo de segurança epidérmica, protegido pela sua concha de carne e pele. Poucos minutos de agradáveis toques e já estava induzido a procurar novas fronteiras, com o dedo empurrava ainda mais para baixo a calça para poder aproximar à vagina, era um negocio árduo, a calça devia descer muito mais e ficar praticamente nua, mas a imprudência foi premiada, a coisa não a preocupava, o espírito estava drogado pelo estranho clima, pelo ar onírico que se respirava, o dedo conseguiu alcançar onde a sua pele tornava-se carne viva, e ali afundou com ardor para produzir o máximo prazer. Sentia a pele dos glúteos plasmar-se à minha segura carícia, forte e sólida, incisiva, prepotente mas sexual, nunca violenta. Tinha-a, era minha, guiava-a, saracoteava-a a meu prazer, era lindíssima gozar aquela visão e sentir onde se unem as suas redondas nádegas na mão e a vulva penetrada pelo dedo, mais via que resistia sem excessivos movimentos externos mais procedia, pesquisava, movimentava… vi a sua mão procurar atrás e parar no meu maço, estava excitadíssimo e foi fácil encontrá-lo e começou a acariciar-me por cima das calças, logo portanto deu-se conta de não satisfeita e procurou o zip, ajudei-a e tirei-o para fora de forma que pudesse ter na mão, agora a interacção estava completa, estávamos fazendo sexo mas enquanto a coisa ficava cada vez mais interessante com o canto do olho vejo um movimento nas minhas costas, não sei mais ou menos uma imperceptível deslocação de ar que aguça os meus reflexos e deixa-me reflectir sobre um facto, deixa-me prever o futuro somente deduzindo-o, prontamente largo a presa, deixo entrar o instrumento e puxo para cima as calças jeans da minha companheira do jogo que durante um instante não percebe, penso que estará a questionar-se: “mas o que está a acontecer?” mas não faz a tempo para definir a frase na sua mente que se abre a porta do compartimento e um indivíduo ainda não precisamente posto em foco apressadamente e com um cínico gozo acende a luz e diz: “bilhetes… por favor”. Saltam todos como se tivesse explodido um tiro de canhão, custa perceber onde se está e o que se deve fazer, o meu coração bate forte pela emoção, receio tranquilidade e sou o primeiro a dar o bilhete que tenho já preparado no bolso todo amarrotado todavia valido, mas dentro tenho o terramoto que deixa pulsar todas as artérias violentamente, a tensão do perigo evitado, o prazer que pouco tempo antes escorria nos meus nervos tensos. Exibo o bilhete com a mão e esforço-me para não deixá-la tremer, o fiscal repara-me com uma cara suspeita, detém-se no meu pedaço de papel, examina-o detalhadamente e enfim quase desconsolado restitui-mo com um sinal afirmativo com a cabaça, os outros enfim tiveram tempo de recuperar das suas memórias a disposição dos seus bilhetes e agora competem para entregar ao fiscal. Elena de Troia exibe 2, estavam na sua carteira penso, eu mesmo morrendo pela vontade consegue não repará-la na cara, o rapaz não é um tolo, apaixonado sim mas parvo não, repara-me com suspeita. Não pode ter ouvido, visto, cheirado nada, mas o seu sexto sentido atrofiado lhe comunica algo de estranho, o ar está impregnado dos nossos cheiros, a sua namorada talvez emanou um aroma que lhe parece familiar, todavia não consegue realizar, tantos sinais não conseguem efectuar nem sequer uma única imagem nítida, pois…

Mesmo o homenzarrão consegue deixar visionar o seu documento de viagem e prontamente remete-se a dormir, o fiscal, com falsa educação apaga a luz e deseja precisamente “boa noite!” eu com negligência posiciono-me de costas aos dois, espero que não tenha visto que antes da entrada do fiscal estava no outro sentido. Continua a observar-me, depois o cérebro começa a mandar-lhe sinais de calma, a realidade apoderava-se dele, a paranóia aparente o abandona e dócil volta a dormir, mas como uma gazela que controla a chegada de alguns predadores abaixa-se por último, quando está convicto de ter visionado cada detalhe da savana circunstante.

Eu enfim destrocei os receios duma reacção, mas sinto também um profundo ressentimento pela situação e por aquele maldito fiscal, estragou-me o jogo no momento mais importante, assim que começo a pensar na cena de poucos minutos antes excito-me mas não ouso virar-me, enfim mesmo este encantamento fica rompido… resolvo de colocar-me serenamente a dormir… mas passam os minutos, passam as horas e os meus olhos estão dramaticamente escancarados, as expectativas ausentes, ou talvez o perigo evitado, mantenho-me acordado e não há como adormecer. Dissipo as reservas e vou dar dois passos no corredor. O relógio mostra 3:00, estou no coração da noite, não há esperança de encontrar alguém, todavia prossigo… percebo que passamos Rimini e aproximamo-nos a Bolonha, dentro duma hora a primeira sessão de tristes e sonolentos passageiros descerá para começar uma outra inevitável semana de trabalho. Começo a viagem na viagem, atravesso os vagões como assoalhadas duma casa, dou uma olhadela ali onde está aberta a porta, aproximo ao vidro até vencer o reflexo onde está fechada, muitos dormem ou tentam fechar os olhos, alguns falam porque já convencidos que não conseguem dormir por isso tanto vale… nos compartimentos fechados consomem os segredos do comboio nocturno, eu sei, basta procurar, me servem dois ou três vagões e aqui está um interessante, dois jovens beijam-se, ele enfia as mãos debaixo da blusa mas ela interrompe-o, passo seguindo em frente, não queria ser visto a espiar, o seu grau de atenção é bastante elevado. Passo outros vagões e a vista fica sempre atenta, oiço umas estrondosas risadas, num compartimento existe 3 raparigas e 3 rapazes, máxima probabilidade de acasalamento, se sabem brincar e não esquecem a teoria de Nash pelo menos um número de telefone o recuperam, mas no comboio não vão concluir nada… os rapazes dão o melhor de si, são simpáticos, competem para criar gracinhas divertidas. O macho sendo banal e inferior consegue conquistar uma mulher com ironia, a sedução, um toque quente. A mulher desce do seu pedestal de altivez e ajoelha-se para abeberar-se da inferioridade masculina, para provar o instinto ainda tão vivo nele, tão evidente, tão descoberto, pelo contrário nele vai ser descoberto de novo, desmascarado… enquanto faça estas altíssimas reflexões passo diante dum compartimento perfeitamente encerrado, não consigo visualizar dentro porque as cortinas estão cuidadosamente fechadas, mas de imediato descubro um buraco, um homem e uma mulher fazem sexo, ela está por cima dele e deixa-se baloiçar pelo movimento estouvado pelo comboio, parece estar a participar com muita paixão, desfruta e parece estar a desfrutar pela primeira vez, mexe-se mas não demasiado, não precisa para passar o limiar do prazer, fica sem razão, está apaixonada pelo seu homem, deseja-o e acolhe-o voluptuosa dentro de si. O seu tronco mostra uns ombros robustos pouco femininos mas ao mesmo tempo dois poderosos seios fazem uma pausa prolongada na boca e nas mãos do seu homem, que lhes plasma, lhes anela com tudo a si mesmo, ela pelo contrário está toda concentrada no seu clítoris, empurra para frente o corpo para embater contra a bacia dele que não percebe mas prossegue por instinto, de vez em quando levanta-se nas coxas e lhe esbarra na cara com os seios, depois cai em baixo como um peso morto e retoma o bailado. A luz avara consegue iluminar os seus olhos de gelo, cintilar na noite quando se abrem porque muitas vezes os têm fechado, “que meigo” pois sim. O ímpeto do acto aumenta, o homem fica mais frenético, a mulher abranda, quer que dure o paraíso na terra, “parvo auxilia-a” a dado passo queria dizer-lhe, mas fico calado por óbvios motivos. Continuo a desfrutar o dueto até que ele parece depois de alguns movimentos muitos velozes acalmar-se, o orgasmo chegou, parece também para ela que continua a beijá-lo afectuosamente, ele um pouco avesso, um pouco está com o pensamento para onde “descarregar” o saquinho que encheu com o seu esperma, a magia apaga-se e começa o revestimento, é hora de abandonar o lugar da descoberta, diverti-me, enfio-me de repente no compartimento de lado felizmente vazio, o homem desce do seu e dirige-se à casa de banho, assim que sinto-o a entrar na casa de banho saio e vou visitar a mulher, então no compartimento duma forma muito decisiva, já está vestida, não se espanta ao ver-me, diz:”agradou-te vendo-me? Fui extravagante?”

Esboço um tom de espanto mas depois supero:

“Muitíssimo, é uma deusa”

“Sou uma mulher. O meu namorado está para voltar… o que pretende?

“Não sei, fiquei fascinado pela sua maneira de fazer amor, queria fazer com a senhora, pensava que assim que o teu namorado adormecer poderia vir ao meu encontro no compartimento ao lado”

“O senhor é um descarado, sabe? Mas eu gosto dos descarados, quem sabe poderia enlouquecer… fica a minha espera”.

Sem uma outra palavra escapei e entrei no meu abrigo e fiquei à espera… não sei o quanto esperei, sei que adormeci e sei que improvisamente senti abaixar-me as calças, sem demora o pénis na boca e começou a possui-lo, tentei desvincular para pegá-la como queria eu mas me disse: “ou isto ou nada…”

Assim parei e deixei-me amar pela boca experimentada e sabia, pude admirá-la melhor, tinha uns fantásticos lábios, pronunciados e de forma sinusoidal, os dentes perfeitos e limpidíssimos aromatizavam saúde, maçãs-do-rosto altos e umas limpidíssimas fossetas transformavam o seu rosto doce e fofo como plumas, os cabelos ondulados e encaracolados como rebeldes saltam diante dos olhos no momento em que estava toda ocupada a saborear-me e a oferecer-me intensíssimas emoções, não havia entusiasmo nela mas reservadíssima técnica, tinha amado o seu homem e neste momento amava um desesperado, talvez o fazia por piedade, outro sentimento amplificado por esta absurda corrida do sul a norte… outra vez poucos minutos e deixou-me sozinho com as ultimas ondas que ainda saltitavam como bolhas de sabão. Eu, o entendido conhecedor dos ritos e dos excessos do comboio nocturno, o técnico da travessia da barreira Espaço-tempo aqui estou ainda mais uma vez repleto de infantis espantos pelas infinitas variações do povo da intercity… quem sabe se alguém tinha assistido ao nosso desempenho, quem sabe se alguém recordará quando a noite for engolida pelo primeiro fluxo de energia electromagnética, quem sabe se o dia será bem sucedido sublimando tudo o que acontece de noite.

Bela senhora da noite,

Cheirosa

Perfumada

De sexo

Sobre mim afunda

As tuas unhas de cera

E incita violenta

Os meus carnais desejos

O estado surreal me sugere poesias, aquelas que se esquecem de manhã… o corredor povoa-se, a luz brilha sobre a planície do pó e desperto totalmente. Não quero perder-me à chegada. Muitos de nós estamos no corredor, silêncio total, como se fosse um rito que ninguém quebra, ninguém ousa. Todos observam a paisagem correr, é uma espera repleta de pensamentos, de preocupações, expectativas. Todos sabem que estão a caminho de Milano (Milão) mas ninguém imagina que rumo está a tomar a sua vida. Um nó no estômago me possui no momento da descida do comboio, um estranho efeito da estranheza de tudo aquilo que me circunda e me parece de acumular em mim o sentimento global de todos os passageiros, me parece impossível suportar, seguidamente ao segundo passo sinto-me já leve, ao terceiro de pertencer a este mundo de desconhecidos, o impulso terminou, aterrei, também este impulso Espaço-tempo foi um sucesso.

Crónicas Eróticas, Irónicas, Um Pouco Espaciais

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