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8. UMA CHAMADA AO DEVER

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epois do tour pela Alemanha, Tess e Jake voltaram para Nova York. Desta vez Tess relutou, porém teve de concordar que a situação dos refugiados na Europa era algo tão avassalador, que os recursos limitados que ela teria à sua disposição não conseguiriam fazer a menor diferença. A crise teria de ser resolvida pelos governos europeus. Todavia Jake não tinha dúvidas de que Tess acabaria dando um jeito de voltar a esse tema.

Era um dia bonito, então decidiram jantar num restaurante ao ar livre no centro da cidade. Colocaram as coleiras nos cachorros e saíram para caminhar. Os pedestres sorriam ao ver aquele par estranho formado por Maggie e Sebastian, mas não resistiam ao desejo de pedir licença para acariciar Maggie. Às vezes as carícias ficavam sujeitas ao humor do buldogue. Tubby havia se autonomeado protetor de Maggie, e levava essa função muito a sério. Era normal ele rosnar quando um transeunte que ele julgasse digno de suspeita acariciasse Maggie no topo da cabeça. Um leve puxão na coleira era o bastante para fazer Tubby se comportar, mas ele já teria manifestado o seu parecer.

Pouco depois de terem se assentado no restaurante à beira da calçada, o celular de Tess tocou, e ela atendeu.

- Oi, papai. O que houve?

Depois de uma breve conversa, ela passou o telefone a Jake.

- Meu pai quer falar com você.

Jake estava mastigando uma massa muito apetitosa ao pesto com edamame e amêndoas, mas pegou o telefone.

- Boa noite, general. A que devo o prazer?

- Olá, Jake. Sei que estou perturbando o seu jantar por minha conta e risco, mas preciso lhe fazer uma pergunta urgente. O nome Paul Saunders lhe diz alguma coisa?

- Claro! Paul era o meu chefe na CIA.

- Bem, ele gostaria que você e Tess tivessem uma reunião conosco amanhã. Disse que tem um assunto importante para conversar.

Jake ficou imediatamente desconfiado.

- Morgan, na última vez em que vi o Paul, eu tinha levado um tiro no pulmão de terroristas iraquianos. Não há o que me faça voltar para o Iraque.

- O Saunders não está propondo nada disso. Agora ele é Diretor Assistente da CIA, e precisa conversar com você sobre alguma coisa importante.

- E por que ele mesmo não me procurou?

- Teve receio de que você não o atendesse por causa de uns desentendimentos que vocês tiveram no passado. Agora está insistindo em falar com você. Como um favor para mim, gostaria que viesse falar conosco amanhã de manhã. Não deve levar mais do que uma hora. É coisa simples.

- Nada pode ser simples com o Paul envolvido, mas tudo bem, estaremos aí amanhã de manhã, desde que ninguém espere que nos envolvamos com o que o Paul estiver tentando fazer.

- É tudo o que eu lhe peço, Jake. Fico muito grato por você se dispor a ouvir o que Saunders tem a dizer. Posso contar com vocês no meu escritório amanhã de manhã, às dez horas?

- Estaremos lá. Tenha uma boa noite.

Jake pôs o celular na mesa, recostou-se na cadeira, e olhou para Tess.

- Não estou gostando disso, Tess. Acho que a CIA me quer de volta, e não estou nem um pouco interessado.

- Não posso culpá-lo, Jake, considerando que você escapou por pouco na sua última aventura no Iraque. Eu fui vê-lo, baleado e sangrando, no hospital militar, lembra?

- Acho que não temos outra opção além de ouvir o que Saunders tem para dizer. Vamos aproveitar a noite, e amanhã veremos.

Alheios ao lugar onde estavam, Tubby e Maggie desfrutavam seus hambúrgueres mal passados. Na verdade, Maggie comia como uma dama, saboreando sua comida em pequenas mordiscadas. Sebastian deglutira seu hambúrguer segundos depois de o garçom ter trazido a comida, e observava a refeição de sua comensal com uma despudorada volúpia. A pequena Maggie prudentemente protegia seu repasto de uma pilhagem, lançando um olhar de “não ouse!” para o buldogue guloso. Como sempre, Jake evitou uma altercação mandando servirem a Tubby uma tigela do seu favorito sorvete de creme.

Na manhã seguinte, Jake e Tess tomaram um táxi para o centro da cidade, até o escritório central da NTC, uma grande fornecedora de equipamentos militares para o Pentágono. Foram levados rapidamente à sala do CEO, o General Morgan Turner, reformado. Como sempre, o general recebeu Tess e Jake efusivamente, e os convidou para se sentarem à mesa de reuniões.

- Então, como vão os negócios? - perguntou o general.

- Estamos indo bem, papai. – Tess respondeu. - Tiramos uma folga depois do ano decepcionante que passamos tentando fazer alguma coisa contra o tráfico de pessoas, mas agora estamos novamente focados no nosso negócio principal. Acabamos de voltar da Nigéria, onde fizemos a entrega de alguns aviões Tucano a serem usados contra o Boko Haram.

- Seria bom se a Nigéria pudesse bancar alguns caças Raptor F-22. Não quero me gabar, mas tenho muito orgulho desse avião. Ele é furtivo e sofisticado, sem falar em como é lucrativo.

Jake sorriu.

- Talvez ele impressionasse mais, se não custasse $ 68.362 por hora de voo.

O sogro estava preparado.

- Você não perde uma chance de estragar prazeres, não é?

- Só estou citando fatos.

- De qualquer modo, isso é complicado. Como sabe, todos esses números ficam sujeitos a convenções de contabilidade, à interpretação dos contadores, e simplesmente ao número de horas de voo por ano. Estes são custos médios, e não custos marginais.

O cérebro matematicamente infalível de Jake entrou em ação.

- É preciso admitir, Morgan, que o nosso equipamento é vergonhosamente caro para qualquer um comprar e operar. O novo caça F-35 custa apenas $ 85 milhões de dólares por unidade. O Eagle F-15C custa $ 41.921 dólares por hora de voo, o Fighting Falcon F-16C custa $ 22.514 por hora. O venerável Thunderbolt II A-10C, o Warthog, custa uma mixaria para voar, míseros $ 19.000 dólares por hora. Acho que o drone Reaper MQ-9A é uma pechincha, por apenas $ 4.762 por hora.

- Como sempre, você tem razão, Jake. O custo é um fator, mas os drones Reaper estão numa categoria completamente diferente. Essas coisinhas vão acabar afetando a lucratividade das principais indústrias de material bélico. Os militares já descobriram como eles são práticos e baratos. Neste ano, os drones representaram mais de 60% de todas as armas aéreas mandadas para o Afeganistão. Em 2015, os drones foram usados em 56% dos ataques contra o Talibã. Em 2011, esse número era 5%, então o destino está traçado. Os militares estão aumentando o uso de drones, não só pelo custo, mas porque eles evitam por a vida do piloto em risco.

O general sabia muito bem que nunca iria ganhar uma discussão com Jake, e ficou aliviado quando sua secretária trouxe Paul Saunders para dentro da sala.

Saunders aproximou-se de Jake e abriu um sorriso.

- Nossa! Jake, você está ótimo. Pelo que vejo, para você o tempo não passa.

Os homens trocaram um aperto de mãos.

- Continuo aprontando sem levar a culpa. – Brincou Jake. - Parabéns pelo seu novo cargo na CIA.

- Obrigado, Jake. Eu estava ansioso para curtir minhas novas mordomias, mas parece que o Tio Sam teve uma ideia diferente. E esta deve ser a famosa Tess. É um prazer finalmente vir a conhecê-la. Saunders estendeu-lhe a mão.

Todos se acomodaram ao redor da mesa. Saunders foi direto ao assunto.

- Jake, fontes confiáveis da inteligência indicam que é iminente um grande ataque envolvendo uma arma nuclear alegadamente perdida, ou um ataque com armas químicas, igualmente devastador. Acreditamos que esse material esteja no Iraque ou na Síria. Se alguma dessas bombas for usada, não importa qual seja o alvo, é óbvio que a repercussão será significativa. Achamos provável que esse ataque ocorra no Oriente Médio, havendo contudo a possibilidade de ser na Europa. Os Estados Unidos e a OTAN já colocaram à disposição todos os recursos que forem necessários para enfrentar essa ameaça, porém temos muito trabalho pela frente.

- E o que isso poderia ter a ver comigo? - perguntou Jake com um olhar de ceticismo.

- O presidente nos deu instruções para usar os recursos que forem necessários para chegar ao cerne da questão e impedir o uso dessas armas. Já colocamos os melhores agentes e analistas de inteligência para trabalhar neste caso, incluindo vários especialistas de informática e cientistas bem conhecidos. Todavia eu acho que isso não é o bastante, e é por este motivo que estou pedindo para você vir participar.

- Paul, você sabe que sou alérgico à política e ao pensamento grupal. Não foi só uma vez que eu externei a minha opinião de que a última guerra no Golfo foi uma operação horrível e mal dirigida que destruiu o Iraque, desestabilizou o Oriente Médio e, de muitas maneiras, criou as condições necessárias para a ascensão do Estado Islâmico. Também reclamei da corrupção no novo governo iraquiano. Percebi que estava pregando no deserto, então pedi demissão. Agora os problemas se agravaram, e vocês querem que eu me envolva novamente numa outra confusão, que não fui eu quem criou.

- Entendo o que diz, Jake, e reconheço que você estava com a razão o tempo todo. Tem todo o direito de ver isso com ceticismo, porém agora precisa levar mais um aspecto em consideração. Desta vez não estamos lidando com política. Estamos diante de uma possível catástrofe, que não só irá afetar os Estados Unidos, mas a Europa também. Ouça o que eu tenho a dizer, e depois decida.

- Certo, vá em frente.

- Você é uma das poucas pessoas com memória infalível, que consegue montar um quebra-cabeças apenas olhando para as peças. Na minha longa carreira, raramente vi pessoas com a sua habilidade analítica e, além disso, você costuma estar com a razão. Outra coisa é a sua capacidade de aprender idiomas e outras coisas com uma rapidez incrível. Vamos precisar dessas qualidades para descobrir quem roubou esse material, e onde pretendem usá-lo.

- Obrigado pelos elogios, Paul, mas tenho certeza de que deve haver outras pessoas com as mesmas qualidades que você acabou de enumerar.

- De fato há, sim, Jake. O nome dele é Vaughn Wentworth, um tipo de agente do MI6 britânico, que é a única pessoa que, na minha opinião, tem os mesmos talentos que você.

- Uau, Vaughn Wentworth. Nome difícil de pronunciar. – observou Jake.

- Espere um pouco... – Tess interrompeu. - É o mesmo Vaughn Wentworth, o famoso maestro de música clássica? Muitas orquestras gostariam de contratá-lo como diretor musical, mas ele prefere ser autônomo.

Saunders tratou dos detalhes.

- Sim. Wentworth é uma figura interessante. Seus ancestrais eram cossacos, que ficaram famosos por suas proezas militares, e pela sua inabalável lealdade aos czares da Rússia. Quando os soviéticos tomaram conta da Rússia no final da I Guerra Mundial, fizeram o possível para exterminá-los ou despachá-los para a Sibéria. A família de Vaughn conseguiu fugir da Rússia, e ele nasceu em Londres. Seu nome originalmente era Vasyli Kirsanov. Então seus pais se naturalizaram britânicos e adotaram um nome inglês mais adequado. O interessante é que Wentworth nunca esqueceu suas raízes russas, fala o idioma fluentemente, e conseguiu se inserir na elite do poder russo dando conselhos políticos úteis que chegaram aos ouvidos do Presidente Vladimir Putin, que se vê como um czar ressurgente.

- Por que está me contando tudo isso? – Jake ainda estava cético.

- Gostaríamos que você e Wentworth trabalhassem juntos neste problema, que unissem seus impressionantes recursos intelectuais para poupar o mundo de uma experiência terrível, com graves consequências.

Tess não gostou do rumo que aquilo estaca tomando.

- Paul, tenho certeza de que você já sabe que o Jake é refratário a bajulação. Eu não acredito que o mundo ocidental não seja capaz de resolver este problema sem ele. Se a situação é tão perigosa quanto você diz, os vastos recursos das grandes potências devem ser suficientes para dominá-la.

- Na verdade, Tess, não é só isso. Você também faz parte da solução. Gostaríamos de usar a SRD, sua empresa, como disfarce para examinar outra parte do enigma.

- E como seria isso?

- Gostaria que você pegasse alguns dos melhores elementos da sua equipe, passasse duas semanas com o exército dos Estados Unidos na Bulgária para se qualificarem como pilotos dos aviões A-10, apelidados de Warthogs, ou javalis, e então levassem alguns deles até a Ucrânia, como parte do nosso programa de assistência para trazer aquele país para o século XXI.

- Não vejo o que isso tem a ver com o outro problema que você descreveu. – disse Tess, um pouco encafifada com o que acabara de ouvir.

Paul tirou um documento impresso e o olhou rapidamente.

- Pelo que soube, você teve um papel importante em ajudar a justiça da França a julgar Laurent Belcour, acusado de lenocínio e promoção da prostituição. Esse incidente sórdido o forçou a renunciar da liderança da IDO, a International Development Organization.

- É verdade, mas você se esqueceu de mencionar que os tribunais franceses não conseguiram condenar Belcour e seus capangas. Aqueles pervertidos escaparam, livres e soltos.

- Isso não tem importância. O importante é que Belcour a conhece, e ainda está tentando entrar em contato com você.

- Não vou lhe perguntar como é que você sabe, mas é verdade. Ele fica me mandando e-mails, flores, e me convidando para almoçar. Sem dúvida, ele quer tripudiar por eu não ter conseguido colocá-lo na cadeia. De qualquer modo, não entendo o motivo para o Big Brother ficar perdendo tempo e gastando recursos com isso, e nem vejo uma ligação ente isso e as bombas nucleares.

- Ah, mas essa ligação existe. Depois de sair da IDO, Belcour passou a prestar serviços de consultoria financeira para países que, no momento, não são os mais benquistos pela comunidade internacional. Alguns deles são o Sudão, Sérvia, Cazaquistão, Tajiquistão, Myanmar, Zimbábue, Vietnã e, mais recentemente, a Coreia do Norte. Aparentemente, ele os ajuda a melhorar suas estratégias e gestão financeira.

- Afinal de contas, ele precisa ganhar a vida. – observou Jake. - Não vejo nada de sinistro nisso.

- Fora o fato de Belcour exigir que sua remuneração inclua damas de todos os naipes, até mesmo as fora do baralho, suas atividades não seriam motivo de preocupação, se ele não tivesse passado os últimos dois meses na Coreia do Norte como convidado especial do charmoso ditador Kim Jong-un. Como sabe, a Coreia do Norte está financeiramente arruinada, e sob diversos embargos que paralisaram o país. A especialidade de Belcour é arranjar financiamentos com diversas organizações financeiras, mas não achamos que ele possa fazer muito nesse sentido pela Coreia do Norte, que é um país proscrito. A conclusão é que o envolvimento dele vai além da consultoria financeira, podendo entrar em áreas um tanto nebulosas.

- Deve haver mais alguma coisa. – disse Tess.

- De fato há, sim. O governo dos Estados Unidos contratou Belcour como consultor principal para ajudar a Ucrânia a melhorar sua situação financeira.

Tess não conseguia acreditar.

- Vocês contrataram um conhecido traficante de pessoas para participar de um prestigiado programa internacional?

- Infelizmente, dadas as circunstâncias, não tivemos muita escolha. A CIA facilitou a seleção dele como integrante da equipe de apoio à Ucrânia. Precisamos descobrir o que ele sabe sobre as armas desaparecidas, e onde elas poderão ser usadas. Tess, no cômputo final, você é a única pessoa que conseguimos ver como capaz de iniciar o diálogo com Belcour sem que ele suspeite. Precisamos descobrir o que ele sabe. Temos certeza de que ele está envolvido nisso de algum modo. Você é a única pessoa que pode se aproximar dele. Afinal de contas, é ele que está tentando fazer contato com você.

Tess ficara visivelmente aborrecida.

- Paul,você não tem noção do quanto eu abomino esse homem. Se eu chegar a ficar a dez quilômetros dele, já será perto demais.

- Entendo os seus motivos, Tess, mas preciso lembrá-la de que estamos lidando com uma questão de segurança nacional, a nossa e a de nossos aliados. Não podemos permitir uma explosão nuclear em nenhum lugar, e o Belcour pode ser a chave para resolvermos este caso. A esta altura você é a única pessoa que pode se aproximar dele, e estou formalmente lhe pedindo para participar. Providenciei para você participar de uma reunião de instruções na central do SOCOM, em Tampa, que está montando uma equipe de elite para trabalhar nisso. Se concordar em participar, vamos reintegrar vocês dois à ativa do exército.

- Paul, posso pensar melhor nisso?

- Vocês dois têm até amanhã de manhã para decidir. Não podemos perder tempo. As armas certamente estão nas mãos de terroristas, e nossa capacidade de prevenir uma catástrofe vai diminuindo a cada hora que passa.

Tess

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