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INTRODUCÇÃO
DOGMAS HEBRAICOS
IX
Como se prova a verdade dos dogmas hebraicos, e com especialidade a eternidade das penas

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Todos estes dogmas estão ligados; porém, quando surge uma duvida, não basta um para demonstrar o outro. Próvem-nos que Satanaz foi expulso do céo, e o homem do Eden; e, quando o tiverem provado, nem por isso lhes cabe o direito de concluir que Deus nunca perdoará a Satanaz nem aos homens. Um castigo que tira aos pacientes a esperança, e ao divino juiz a piedade, é mais incomprehensivel ainda que a fragilidade dos anjos: por consequencia, um tal castigo carece de ser justificado por pessoas eguaes, senão melhores. Estes antigos mysterios não derivam um do outro naturalmente; e, seja qual for o castigo que Deus reserve em sua justiça ás prevaricações das creaturas livres, é certo que nós o soffreriamos, ainda que Satanaz e Adão não tivessem peccado. A principal questão é saber se este castigo será eterno, e a tal respeito a corrupção original, a reversibilidade das culpas, o poder do tentador augmentam nossas duvidas em vez de diminuil-as.

O que ahi ha para nós não são provas, são objecções. O inferno poderá ainda sem isso não satisfazer nossa razão; mas não a offenderá tanto. É urgente, pois, provar que elle existe.

Prova-se pela revelação, isto é, pelas escripturas santas e pela auctoridade da Egreja, interprete infallivel d'ellas. Porém revelação biblica e infalibilidade de Egreja são já de si outros dogmas a favor dos quaes se escrevem todos os dias grossos volumes; e seria desviar-me grandemente do meu assumpto suscitando aqui similhante discussão. O pouco que a tal respeito hei de dizer vem no appendice que está no fim d'esta obra, sendo tanto para o leitor como para mim grande a pressa que temos de sahir d'este labyrintho de mysterios. Investigo provas d'outra ordem, mais especiaes, mais directas, mais apontadas ao bom senso, ao coração, á intelligencia, e que se prestam facilmente a ser entendidas e livremente discutidas. Se taes provas não existissem, não emprehenderia eu similhante trabalho; mas sustenta-se que existem, e em todas as apologias são invocadas como auxiliares das provas sobrenaturaes, e do ensinamento da Egreja, argumentos puramente philosophicos, dos quaes parece que a fé mesmamente está carecida. Dir-se-hia de vontade a respeito do inferno, o que Voltaire disse de Deus: que se elle não existisse, mister seria invental-o. Pois que podemos em verdade provar a existencia de Deus pela necessidade moral d'esta crença, pelo mesmo theor se intenta provar a existencia do inferno perpetuo: intenta-se fazer d'isto uma necessidade moral tão clara e evidente, quanto é evidente e clara a necessidade moral da crença em Deus, e é usual fundamentar tal raciocinio sobre o testemunho de todos os povos, que tanto importa a tradição chamada universal.

A mim me basta a primeira prova; d'ella pende a meu vêr a questão capital. Se o inferno, ou sómente a idêa do inferno é moralmente util, existe o inferno, é necessario, e é divino. Porém, como quer que a evidencia d'esta utilidade não seja dogma, assiste-nos o direito de examinar com plena liberdade. Tal é a tarefa que me impuz. A tradição universal de que tratarei depois, é apenas a primeira face do problema.

O Inferno

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