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Capítulo Quatro

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Sean deixou a sua mãe a dormir e saiu do hospital, contente por se distrair um pouco. De repente, uma voz familiar chamou-o.

– Sean?

Ao virar-se, comprovou com prazer que era Georgia, a chegar perto dele.

– O que estás aqui a fazer? – perguntou ele, abraçando-a com força.

– Não sabia nada de ti e fiquei preocupada. Por isso vim esperar-te. Como está a tua mãe?

Uma mistura de alegria e gratidão envolveu Sean, que reconheceu para os seus botões como desejava vê-la. Nunca tinha gostado tanto de ver alguém como quando viu Georgia aparecer entre o nevoeiro naquele dia frio.

– Está bem, embora o médico queira que fique internada mais uma semana. Diz que lhe vão fazer mais exames e quer que descanse. A minha mãe nunca foi capaz de descansar na vida, por isso tenho pena das pobres enfermeiras que tentem mantê-la deitada naquela cama – respondeu ele e beijou-a na testa. – Fiquei assustado, Georgia.

– A família é importante para ti – compreendeu ela.

– Vai ficar bem.

– É uma boa notícia – comentou ela, observando-o com atenção. – Mas porque pareces tão preocupado?

– Já te conto tudo. Primeiro, preciso de sair daqui. Sinto-me como se tivesse passado anos dentro do hospital, em vez de umas horas – indicou ele e olhou para o estacionamento, franzindo a testa. – Como vieste?

– De táxi – respondeu ela, encolhendo os ombros. – A Laura queria trazer-me, mas disse-lhe que podia vir sozinha e que tu me levarias a casa.

– E levo-te – afirmou ele, agarrando-a pelo braço. – Mas primeiro vamos a minha casa. Temos de falar. Preciso desesperadamente de uma cerveja e acho que tu vais precisar de um copo de vinho quando ouvires o que tenho a dizer.

Não havia vinho no mundo capaz de apaziguar os sentimentos de Georgia depois de ouvir a notícia bomba.

– Estás louco? – questionou ela, erguendo-se rapidamente do sofá. – A sério, devias ir a um psiquiatra.

Sean suspirou e bebeu um golo da sua cerveja. Georgia imitou-o, esvaziando o copo de Chardonnay.

– Não estou louco. Bom, um pouco. Acho que não me estou a explicar bem – admitiu ele, passando a mão pelo cabelo com nervosismo.

– Nada disso. Foste muito claro – sentenciou ela, com os braços cruzados. – Queres que finja ser tua namorada para que possas mentir à tua mãe. É um bom resumo?

Sean pôs-se de pé também.

– Bom, vistas assim as coisas... Parece...

– Horrível?

Ele encolheu um pouco os ombros e esfregou a cara com desespero. Ao vê-lo, Georgia sentiu um pouco de pena dele, ainda que continuasse a ter vontade de lhe dar um bom pontapé.

– Achei que ia morrer.

– E mentiste-lhe para que morresse tranquila?

Ao olhar para ele, pela primeira vez desde que o tinha conhecido, Georgia não viu nele o Sean adorável e sorridente, mas o dono inflexível da Irish Air. Aquele era o homem que tinha tirado da falência uma linha aérea e tinha-a convertido na primeira companhia aérea de luxo do mundo. O mesmo que se tinha convertido num multimilionário graças à sua força de vontade férrea.

– Se achas que foi bom mentir à minha mãe, enganas-te.

– Fico contente, porque gosto da Ailish.

– E eu.

– Então, diz-lhe a verdade.

– Vou fazer isso, logo que o médico me assegure que está bem – respondeu ele. – Até lá, que tem de mal ela acreditar numa pequena mentira?

Abanando a cabeça, Georgia dirigiu-se à lareira, onde o fogo reluzia e crepitava. Em cima, havia umas fotos emolduradas de Sean com Ronan, com a mãe e com Ronan e Laura. A família era importante para ele, isso era óbvio.

– Custa-te assim tanto fingir que estás louca por mim? – perguntou ele meio a sorrir.

Ela olhou para ele e pensou que a resposta era não. Mas não pensava confessar-lhe isso.

– Estás a pedir que minta à Ailish.

– Só por um tempo – insistiu ele num tom persuasivo. – Até se recuperar. A minha mãe é... importante para mim, Georgia. Não lhe quero fazer mal.

Céus, não havia nada mais sexy do que um homem que não se incomodava a esconder o seu amor por alguém, pensou Georgia. Comovia-a que a sua mãe fosse tão importante para ele. Ainda que não estivesse convencida do plano. Ela também se tinha sentido no fundo quando tinha descoberto todas as mentiras que o seu ex-marido lhe tinha contado. Não se sentiria Ailish traída também?

– E não achas que lhe fará mal saber que foi enganada? – perguntou ela, abanando a cabeça.

– Não tem por que saber – indicou ele, sorrindo de novo. – Quando chegar a altura, deixas-me e eu fico sozinho e com o coração partido em pedaços.

Georgia soltou um riso de gozo.

– E tenho de ser eu a má da fita porquê? – perguntou ela, dando outro gole à bebida. – Penso mudar-me para Dunley, lembras-te? Vou ver a Ailish quase todos o dias e não quero que pense que sou uma mulher abominável que deixou o filho dela.

– Não te culpará – assegurou-lhe ele. – Eu trato disso.

– Está bem.

– Georgia, querida, és a minha única oportunidade de sair disto bem.

– Não gosto disto.

– Claro que não, porque és uma mulher honesta – indicou ele, tirando-lhe o copo das mãos. Depois, acariciando-lhe os braços, acrescentou: – Mas como também és generosa e com um bom coração, compreenderás que é a única saída, não é verdade?

– Achas que me vais convencer com uns beijos e umas carícias?

Ele inclinou-se, com os olhos fixos nela.

– Sim, acho – respondeu Sean. – Mas não será necessário, pois não? Tens um bom coração e aposto que compreendes por que tive de mentir.

De acordo. Georgia conseguia entendê-lo, por muito irritante que fosse admitir isso. Compreendia que o medo o tinha feito agir assim quando tinha achado que a mãe ia morrer. Ainda que... Caramba. A lembrança do que lhe tinha feito o seu ex-marido tinha-lhe mostrado que...

– As mentiras acabam sempre mal, Sean.

– Mas não vamos mentir um ao outro, pois não? Entre nós, estará tudo claro. E a minha mãe superará a sua deceção, quando recuperar.

– Não é só a tua mãe, tem isso em conta – indicou ela. – Toda a gente saberá. Todos pensarão que sou uma idiota por te deixar.

– Não acho – disse ele, sorrindo. – A maioria das pessoas de Dunley pensará que foste uma parva por aceitares casar comigo. Dirão que recuperaste a sensatez ao deixares-me. E para termos a certeza disso, eu acartarei com toda a culpa.

Georgia riu ao ver como ele parecia satisfeito com a opinião que tinham dele na aldeia.

– Não tens vergonha, pois não?

– Não – admitiu ele com um sorriso traquina. – O que vais fazer então, fingirás ser a minha namorada?

Ela tinha a tentação de aceitar, isso era verdade. Era uma mentira pequena, só para ajudar o amante. Além do mais, era um amante maravilhoso, pensou, com o coração acelerado. Cada momento que tinha passado com ele nas últimas semanas tinha sido... fabuloso.

– Posso ajudar-te a conseguires a licença para abrires a tua loja – ofereceu-se ele. – Tenho truques para acelerar a burocracia. Caso contrário, vais demorar uma eternidade a conseguir abri-la. Conheço certas pessoas que tratam dessas coisas. E sou o dono da Irish Air, lembra-te disso. As minhas palavras têm mais influência do que as tuas.

Sean tinha razão, reconheceu ela para com os seus botões. Já tinha comprovado que a papelada podia ser interminável se tivesse de fazer aquilo sem ajuda.

– Queres-me subornar?

Ele sorriu e assentiu, sem vergonha.

– E estou a fazê-lo muito bem.

Ao olhar nos olhos dele, Georgia soube que estava vencida. Devia aceitar.

O plano não só era uma desculpa excelente para manterem a aventura, mas ficava muito comovida por Sean se preocupar com Ailish.

– E sabias que há uma casa à venda num dos extremos da aldeia?

– Aquela de que falaste com alguém chamado Brian?

– Logo vi que falar de algo no bar é como publicar no jornal local. Não, não se trata da casa da mãe do Brian. Há uma semana, arrendou-a à Sinead e ao Michael.

– Ah – disse ela, pensando que lhe tinha escapado a oportunidade de ficar com uma casinha que tinha muito boa pinta. – Falei com a Mary hoje de manhã e não me disse que havia uma casa à venda.

– A Mary não sabe tudo – indicou ele e deu-lhe um beijo rápido nos lábios. – Por exemplo, eu tenho duas casinhas numa das pontas da rua principal. Não são longe da tua nova loja...

Sean fez uma pausa antes de continuar, para lhe dar tempo de processar a informação.

– São pequenas, mas estão bem conservadas. Ficam perto do centro e têm uma mata de fadas na parte de trás.

Ela riu, abanando a cabeça.

– Uma quê?

– Uma mata de fadas – repetiu ele com um sorriso sedutor. – É um lugar onde podes pedir um desejo nas noites de lua cheia e podes obter o que desejares. Ou também pode ser que as fadas te raptem e te levem a viver com elas entre as árvores.

A pronúncia irlandesa da sua voz fazia com que até a maior fantasia parecesse credível.

– Fadas.

– Queres viver na Irlanda e não acreditas em fadas? – desafiou ele com uns olhos brincalhões.

– Claro...

– Poderia oferecer-te um bom acordo para ficares com uma das duas casas, se...

– És mauzinho – disse ela com suavidade.

O seu coração estava dividido. Por um lado, odiava ter de mentir à mãe de Sean. Mas como podia negar? Ele estava a oferecer-se para ajudá-la a começar a sua nova vida e a única coisa que tinha de fazer era fingir que estava apaixonada por ele.

E isso não ia ser difícil, reconheceu para os seus botões. A sua mera presença já era perigosa para ela, pois aquele homem era capaz de fazê-la esquecer quem era só ao tocá-la.

– Que dizes, Georgia? – perguntou ele, agarrando-lhe uma mão. – Fingirás que vais casar comigo?

– Isto não é algo que se possa decidir de um momento para o outro, Sean – indicou ela, afastando as mãos e dando um passo atrás. – Tenho de medir bem as possibilidades. Por isso deixa-me pensar e respondo-te amanhã, está bem?

Ele abriu a boca, como se fosse discordar, mas pareceu mudar de ideias. Assentiu e, chegando-se de novo a ela, agarrou-a entre os braços. Georgia deixou-se abraçar, rendendo-se ao fogo que surgia entre eles cada vez que se tocavam.

– De acordo. Parece-me bem – disse ele.

Sentindo o batimento do coração dele no ouvido, Georgia teve a tentação de fazer todo o tipo de coisas. Para se distrair, olhou pela janela, para a escuridão da noite chuvosa. Mas o frio e a chuva não podiam dissimular a grande beleza da Irlanda.

Da mesma maneira, uma mentira não podia esconder o que havia entre eles, pensou Georgia, levantando o olhar para ele. Não sabia para onde caminhava aquela relação, mas teve a sensação de que ia ser muito mais agitada do que tinha planeado ao princípio.

– Estou morta de sono – disse Laura, bocejando em cima da sua chávena de café na manhã seguinte.

Georgia olhou pela janela, para o pátio ensolarado e para as árvores que tinham começado a perder as folhas. Pela primeira vez em muitos dias, o céu estava limpo, mas o vento frio irlandês continuava a soprar com força.

– Estou tão feliz por viveres aqui – comentou Laura. – Tenho muitas saudades tuas quando não estás.

Georgia sorriu à sua irmã.

– Eu sei. E eu tuas. E estou entusiasmada com a mudança – reconheceu e encheu ambas as chávenas de café. – Ainda que seja verdade que dá um pouco de medo. Não só me vou mudar para um lugar novo para começar do zero, também tenho de tratar de todos os pormenores, como cancelar a morada antiga, arrumar as caixas, mudar tudo...

Estremecendo ao pensar nisso, Georgia deu um gole na sua chávena.

– Entendo. Comigo aconteceu o mesmo quando me mudei para cá. Mas correu tudo bem.

– Tinhas o Ronan.

– E tu tens-me a mim.

– Sempre foste muito otimista.

– Não faz sentido ser pessimista – replicou Laura. – Se andas por aí a franzir a testa, à espera do pior, quando tudo passar terás sofrido mais do que o necessário.

– Vou pensar nisso – disse Georgia.

Laura sorriu.

– Espero que reconsideres a possibilidade de viveres aqui connosco. Temos muito espaço.

Georgia sabia que a sua irmã o dizia de coração e agradecia-lhe. Embora manter uma aventura em segredo fosse difícil quando se convivia com outras pessoas.

– Eu sei, e estou-te muito agradecida. Mas quero ter a minha própria casa, Laura.

– Está bem, eu entendo.

A luz da manhã banhava a sala naquele dia invernal.

– Ontem, o Sean disse-me que tinha duas casas na aldeia e que me pode vender uma.

– Ah! – sentenciou Laura com um gesto pensativo. – E já que puxas o assunto, o que há entre ti e o Sean?

– Nada – mentiu Georgia, baixando o olhar.

– Achas que sou cega? Tive um bebé, mas não me fizeram uma lobotomia.

– Laura...

Georgia estava à espera que aquele momento chegasse. A sua irmã tinha demorado a fazer-lhe a pergunta só porque estivera muito ocupada com Fiona. Mas Laura não era cega.

– Percebi que passam muito tempo juntos – observou Laura. – E ele olha muito para ti.

– O que tem isso de suspeito?

– Pois olha para ti como se estivesse morto de sede e tu fosses uma fonte de água fresca.

As suas palavras não deixaram Georgia indiferente, muito relutantemente. Na noite anterior, depois de fazer a sua proposta, Sean tinha-a beijado com paixão e tinha-a levado a casa de Laura, deixando-a tão excitada que não conseguira dormir. Naquele momento, só de pensar nele, o fogo do desejo ateou-se no seu interior.

– Deixa lá isso, Laura.

– Claro. Como se não fosse tua irmã – replicou Laura, chegando-se um pouco mais. – Querida, não me interpretes mal. Fico contente que te divirtas um pouco, já não era sem tempo. Demoraste bastante a deixar para trás aquele tipo com quem te casaste...

Ao ouvi-la mencionar o seu ex, Georgia franziu a testa.

– Ora, obrigadinha.

– Só não quero que te façam mal outra vez.

– O que se passou com o teu velho otimismo?

– Isto é diferente – afirmou Laura, franzindo a testa. – Se acabar mal, o que vão fazer? Viverás aqui e terás de ver o Sean quase todos os dias. Isso far-te-ia mal e não quero que sofras.

Georgia suspirou e deu uma palmadinha na mão à irmã.

– Eu sei. Mas isso não te diz respeito, Laura. E não vamos acabar mal, só...

– Sim?

– Ia dizer que só somos amantes.

– Para ti, isso de ser somente amantes não existe, Georgia. Para mim também não. Não somos assim.

– Eu sei – admitiu Georgia. – Mas depois de ser prudente durante muitos anos, não consegui nada. Pensei que o Mike era o homem certo, lembras-te? Fiz o correto com ele. Saímos durante dois anos e ficamos noivos durante um. Tive um casamento em grande estilo, comprámos uma casa bonita, propusemo-nos a construir uma vida a dois... E o que aconteceu?

Laura encolheu os ombros.

– O Mike foi-se embora com a Misty, uma cabeça oca incapaz de construir o que quer que seja.

Laura esboçou um sorriso cheio de amargura.

– Essa não é razão para manteres uma relação com um homem como o Sean.

Logo, Georgia sentiu-se impulsionada a defender o seu amante.

– O que queres dizer? É um homem maravilhoso e trata-me muito bem. Divertimo-nos juntos. E isso é a única coisa de que ambos andamos à procura.

– Por agora.

– Neste momento, só me interessa o presente, Laura – assegurou Georgia, abanando a cabeça. – Já estou cansada de ser prudente. Está na hora de aproveitar um pouco, de deixar de pensar no futuro e viver o aqui e agora.

Depois de uma longa pausa, Laura suspirou.

– Se calhar tens razão. O Sean é um encanto, mas...

– Não te preocupes – interrompeu Georgia. – Não me quero casar, nem ter uma família. Talvez essas coisas não sejam para mim.

– Claro que sim – replicou a sua irmã, olhando-a com compreensão. – És uma mulher de família. Mas, se o que precisas neste momento é uma aventura, estou do teu lado.

– Obrigada. E, já que falamos disto, deverias saber que ontem à noite o Sean pediu-me que o ajudasse.

Numas quantas frases, Georgia explicou o plano de Sean, enquanto a sua irmã ficava de boca aberta.

– Não estás a falar a sério.

– Acho que sim.

– Deixa-me explicar-te todas as consequências que isso pode ter...

– Faz-me um favor e não faças isso, sim? – interrompeu Georgia. – Tenho andado a pensar nisto e entendo por que o faz.

– Eu também. Ainda que isso não signifique que seja uma boa ideia.

– O que é que não é uma boa ideia? – perguntou Ronan, entrando na sala. Deu um beijo à esposa e serviu-se de um pouco de café.

– O idiota do teu primo quer que a minha irmã finja que se vão casar – informou Laura, olhando-o com uns olhos inflamados, como se ele tivesse culpa.

Enquanto Laura contava tudo a Ronan, Georgia recostou-se e bebeu o café.

Sim, sem dúvida, tinha-se metido num belo sarilho.

Uma proposta escandalosa - Recordações de uma noite

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