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Capítulo 2

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Houve um silêncio carregado de censura por parte de Zoe, que mal conseguia esconder o desprezo que sentia por Anton.

Ele esboçou um sorriso.

– Portanto, ouviu falar de mim.

Zoe esboçou um sorriso carregado de desdém.

– Teria de ser surda e cega para o ter evitado, senhor Pallis – disse, ao mesmo tempo que dava meia volta e ia para a parte traseira da casa.

Anton aproveitou para olhar à sua volta. A casa era pequena, uma construção vitoriana típica em cujo vestíbulo havia uma escada estreita e levantada e duas portas de pinho que davam acesso a outras divisões. Estava agradavelmente decorada e o chão estava coberto por uma carpete bege, mas Anton nunca teria imaginado que o filho de um multimilionário teria acabado a viver assim.

Sem falar, Zoe saiu pela porta do fundo e, respirando profundamente, Anton decidiu segui-la. Encontrou-a numa cozinha surpreendentemente ampla que servia de salão, com um canto de estar onde havia um sofá e uma poltrona azuis. Uma televisão ocupava um canto e, sobre a mesa de café, estavam desdobrados vários jornais. A outra metade da divisão era ocupada por uma grande mesa de madeira rodeada de móveis de cozinha de pinho. Nas prateleiras viam-se as coisas próprias de um bebé, e junto do sofá, um berço vazio.

– Está a dormir lá em cima – disse Zoe, ao seguir a direção do seu olhar. – O barulho que os jornalistas fazem incomoda-o – explicou, – portanto instalei-o no quarto que dá para o jardim, que é o mais silencioso.

– Não chamou a polícia para os impedir de a incomodar?

Zoe olhou para ele, perplexa.

– Não somos a família real, senhor Pallis. E os jornalistas não atendem à razão. Agora, se me desculpar…

Sentindo-se como se tivesse sido repreendido pela sua professora, Anton viu-a sair pela porta traseira. Por uma fração de segundo, pensou que ia fugir, mas pela janela viu que percorria o jardim até uma porta de madeira e a fechava. Nesse momento, apercebeu-se de que Zoe devia viver como uma prisioneira na sua própria casa e, ao mesmo tempo, não pôde evitar perguntar-se se a última pessoa que saíra por ali, mesmo antes de ele chegar, teria sido um amante.

Por alguma estranha razão, imaginar Zoe nos braços de um homem perturbou-o. Os planos que tinha para Zoe Kanellis não incluíam o incómodo de ter de se livrar de um amante.

Depois de fechar a porta que Susie deixara aberta, Zoe demorou alguns segundos a recuperar a calma. O aparecimento de Pallis e o facto de a sua voz o fazer pensar tanto na do seu pai deixara-a abatida e chorosa. Para ganhar mais tempo, apanhou a roupa que estendera naquela manhã. Não podia permitir-se ser vulnerável. Estava certa de que Anton Pallis estava ali para lhe fazer uma oferta que estava decidida a rejeitar e, para isso, tinha de se sentir forte.

Com olhos chorosos, pensou no seu pai, desejando tê-lo ao seu lado, com a sua amabilidade característica, a sua delicadeza e a sua elegância discreta. Ele teria sabido como lidar com alguém como Anton Pallis, sobretudo com o apoio da sua bonita mulher.

Mas Zoe recordou-se que não se encontraria naquela situação se não tivessem falecido e que só restava ela para proteger Toby das garras de Theo Kanellis, cujo emissário a esperava no interior.

Quando entrou na cozinha, Anton Pallis estava a guardar o telemóvel no bolso. A sua presença poderosa fazia com que o espaço à sua volta diminuísse. Tudo nele era perfeito: o fato que o envolvia sem formar uma só ruga, as suas feições equilibradas, o seu cabelo preto e brilhante, o seu queixo terminante, imaculadamente barbeado.

Nesse momento, olhou para ela e, ao sentir-se apanhada, Zoe sentiu um calafrio.

– Organizei um serviço de segurança para que mantenha os jornalistas afastados.

– Que bom! – exclamou Zoe, deixando a roupa sobre a mesa. – Agora Toby e eu vamos andar rodeados de valentões em vez de jornalistas. Muito obrigada!

Ao perceber a irritação que o seu sarcasmo causava nele, começou a dobrar roupa.

– Quer que faça mais alguma coisa? – perguntou ele.

Zoe apercebeu-se de que não era uma pergunta retórica, mas uma oferta genuína.

– Não recordo ter-lhe pedido nada – disse, encolhendo os ombros. – Quer um café antes de me dizer o que veio dizer?

Anton semicerrou os olhos, consciente de que se enganara ao considerá-la frágil. Embora a desgraça a tivesse enfraquecido fisicamente, Zoe Kanellis era uma mulher forte e com uma língua muito afiada, o que não devia surpreendê-lo, visto que, ao fim e ao cabo, era a neta de Theo.

Além disso, era óbvio que o odiava e que provavelmente odiaria Theo. Se, por outro lado, era tão inteligente como o seu curriculum mostrava, devia saber porque estava ali e estaria preparada para lutar.

– O seu avô…

– Um momento – Zoe virou-se para ele, observando-o friamente. – Deixemos uma coisa clara, senhor Pallis, o homem a que se refere como o meu avô não significa absolutamente nada para mim, portanto é melhor que se refira a ele pelo seu nome… Ou ainda melhor, que nem sequer o mencione.

– Isso poria fim a esta conversa sem sequer a começar – disse ele, com sarcasmo.

Zoe encolheu os ombros e continuou a dobrar a roupa enquanto Anton a observava, perguntando-se como resolver o problema, dado o desprezo que ela sentia por um homem que nem sequer conhecia.

– Pensava que enviaria um advogado – disse Zoe.

– Eu sou advogado – respondeu ele. – Ou, pelo menos, licenciei-me para o ser, embora mal tenha tido tempo para me dedicar a exercer.

– Está muito ocupado a fazer de magnata?

Anton sorriu.

– Vivo aceleradamente – admitiu. – Viajo demasiado para poder ter a concentração que a lei exige. Sei que o seu campo é a astrofísica… É surpreendente.

– Pelo menos, era – disse Zoe. – Mas antes que me conte como seria simples retomar os meus estudos, deixe-me esclarecer que não tenciono entregar o meu irmão, nem por todo o ouro do mundo.

– Não tinha a menor intenção de lhe fazer essa oferta, nem de lhe explicar o que já sabe.

– O quê?

– Que poderia pedir uma bolsa de estudo para cuidar do menino enquanto contínua os seus estudos. Também sei que não pode continuar nesta casa porque o seguro de vida dos seus pais não incluía o pagamento da hipoteca.

Zoe olhou para ele, indignada. Quem lhe dava o direito de falar da sua vida privada?

– O seu chefe disse-lhe para mencionar esse assunto?

– O meu chefe? – perguntou Anton, arqueando uma sobrancelha.

– Theo Kanellis. O homem que lhe proporcionou uma vida privilegiada, transformando-o no seu criado.

Zoe teve a satisfação de ver um resplendor de raiva nos olhos de Pallis.

– O seu avô está velho e doente e não pode viajar.

– Mas não suficientemente velho nem doente para deixar de se comportar como um déspota – indicou ela.

– Não sente a mínima compaixão?

– Nenhuma. De facto, nem sequer me importaria se tivesse vindo para me dizer que estava quase a morrer – disse Zoe, com firmeza, ao mesmo tempo que punha água a aquecer.

Anton aproveitou para a observar e medi-la como adversária.

– A verdade é que, noutras circunstâncias, não se teria incomodado em entrar em contacto comigo, pois não? – continuou Zoe, virando-se quando Anton desviava o olhar. – Agora quer moldar Toby para que seja mais digno de usar o apelido Kanellis do que o meu pai.

Zoe viu que Pallis abria a boca, mas se arrependia e voltava a fechá-la. Observando-a como se o hipnotizasse, perguntou-se quantos anos teria e calculou que não devia ter mais de trinta.

– Sente muita amargura – observou Anton.

– Em vinte e dois anos, não ouvi uma palavra dele – replicou ela. – E não diga que a culpa é do meu pai ou vou expulsá-lo desta casa.

Houve um silêncio durante o qual Zoe não conseguiu desviar o olhar do rosto imperturbável de Anton. Tinha o coração acelerado e sentiu pele de galinha enquanto esperava a sua reação. Quando ele deu um passo para a frente, ela ergueu o queixo em atitude desafiante, embora fosse consciente de que fora demasiado longe.

– Não me toque – deu um passo atrás, mas não conseguiu evitar que Anton a segurasse pelo pulso.

Só se apercebeu do que ia fazer quando estendeu a outra mão para lhe tirar cuidadosamente a faca que estivera a brandir sem se aperceber e a deixou na bancada.

O movimento aproximou-o dela, tornando-a ainda mais consciente da sua envergadura e permitindo-lhe inalar a sua fragrância masculina.

– Está bem, menina Kanellis – murmurou ele. – Visto que não gostamos um do outro, aconselho-lhe que se limite a magoar-me com as suas palavras e não com uma faca. Não gostaria que houvesse um derramamento de sangue.

Zoe corou.

– Não tencionava…

– Referia-me ao seu, Zoe – sussurrou ele, olhando para ela enquanto a mantinha presa por uns segundos antes de a soltar e recuar.

Zoe sentiu-se perturbada ao vê-lo relaxar e esboçar um sorriso.

– E agora, aceito o café que me ofereceu antes.

Atordoada com aquela demonstração de segurança em si próprio, Zoe ficou a olhar para ele enquanto ele se sentava pausadamente numa cadeira, como se quisesse sublinhar o contraste entre as suas maneiras corteses e a brutalidade insolente dela.

Zoe cerrou os dentes, zangada consigo própria por ter perdido o controlo e concentrando-se para recuperar a calma enquanto fazia dois cafés instantâneos.

– Leite e açúcar? – perguntou.

– Não, obrigado.

– Um bolo? – Zoe sorriu para si, pensando em como a sua mãe estaria contente por, apesar de tudo, se comportar como uma boa anfitriã.

– Porque não?

Zoe pôs sobre a mesa as duas chávenas e um prato com bolos e sentou-se à frente dele. O sol que entrava pela janela refletiu-se na pele dourada dos dedos de Anton quando seguravam a chávena.

Zoe sentia um nó no estômago cuja causa conhecia perfeitamente: ela, que evitava por regra todo o conflito, parecia empenhada em provocar uma discussão com Anton Pallis apesar de, no fundo, saber que ele não era culpado da situação.

– Bode expiatório – disse Anton. E Zoe levantou a cabeça, surpreendida. Ele olhou para ela fixamente: – Precisa de descarregar a sua raiva em alguém e eu estou à mão. Mas a sua luta não é contra mim, mas contra Theo.

Zoe olhou para ele com desdém.

– Diga-me, o que sentiu ao ocupar o lugar do meu pai?

Anton compreendeu a verdadeira razão por que ela o odiava tão profundamente, um sentimento que intuíra desde que lhe abrira a porta. Para ela, fora por causa dele que o seu avô não fizera nenhum esforço para se reconciliar com o seu pai.

O pranto de um bebé impôs-se sobre a tensão que eletrizava o ambiente. Zoe levantou-se com um salto e saiu.

Uma vez a sós, Anton ficou pensativo. Zoe tencionava insultá-lo ao mencionar que substituíra o seu pai e a acusação continha um pouco de verdade. Nunca saberiam o que teria acontecido se ele não estivesse presente para ocupar o vazio que Leander deixara.

Anton amaldiçoou a teimosia de Theo, que o punha numa situação tão incómoda e em tão má posição para se defender.

O quarto de Toby era quase tão pequeno como o berço que ocupava o centro, mas era bonito e confortável. Estava decorado em branco e azul, com um toque de vermelho intenso. Zoe tinha tentado convencer os seus pais a instalá-lo no seu quarto, visto que ela estava na universidade durante a maior parte do tempo, mas eles tinham insistido em mantê-lo intacto para ela.

Os seus pais tinham tentado ter aquele filho durante vinte anos e, quando se tinham dado por vencidos, aquele anjo fora concebido. E Zoe amava-o com todo o seu coração.

Quando lhe pegou ao colo, estava molhado e inquieto, mas tranquilizou-se assim que reconheceu a voz do Zoe.

– Ninguém nos vai separar, querido – sussurrou ela.

Depois de lhe mudar a fralda, desceu com ele. Ao chegar ao andar de baixo apercebeu-se de que aumentara o volume do ruído procedente do exterior e perguntou-se o que teria causado o rebuliço.

A razão, apercebeu-se, estava na cozinha, a olhar pela janela. Devia ter-se espalhado a notícia de que Anton Pallis estava ali. Só faltava que um helicóptero aterrasse no jardim e dele saísse Theo Kanellis para que os sonhos dos jornalistas se tornassem realidade.

Encontro de milionários gregos numa casa modesta de Islington!, pensou Zoe, ao mesmo tempo que tirava um biberão do frigorífico.

O milionário que estava na sua cozinha falava naquele momento ao telefone e, mais uma vez, ela sentiu um formigueiro no estômago ao olhar para ele, que se recusava a aceitar como atração embora não lhe custasse admitir que era um homem muito atraente.

Desviando o olhar, ouviu-o a falar em grego. Parecia zangado e, quando se virou para a ouvir, o seu rosto contraiu-se numa expressão de impaciência. Depois de acabar a conversa bruscamente, apoiou as costas no lava-loiça e marcou outro número.

Em vez de prestar atenção à conversa, Zoe sentou-se no sofá, pôs os pés ao alto e concentrou-se em dar o biberão a Toby.

Só conhecia aquele homem há meia hora e, no entanto, aquela cena pareceu-lhe de uma naturalidade inaudita: ela a alimentar o bebé enquanto ele dava instruções com firmeza no que parecia russo.

«Uma cena doméstica terna», disse-se, sorrindo para si com sarcasmo enquanto pegava na mãozinha de Toby e a beijava.

Anton acabou de falar e houve um silêncio em que se ouviu o ponteiro dos segundos do relógio da parede e o motor do frigorífico. Havia uma tensão no ar que Zoe atribuiu às suas últimas palavras, de que se arrependera imediatamente. Não tinha o direito de acusar aquele homem de ser o filho substituto de Theo Kanellis. Não era preciso ser um génio para calcular que devia ser um menino quando o seu pai fugira. E o seu pai sempre dissera que se fora embora por vontade própria e que não tinha o menor desejo de voltar.

Anton não recordava ter-se sentido tão incomodado como na casa de Leander Kanellis. O comentário de Zoe tinha-o afetado profundamente.

– A menina e o seu irmão podiam ter tudo o que quiserem – ouviu-se dizer, deixando que o negociador que havia nele tomasse as rédeas.

Zoe olhou para ele por cima das costas do sofá.

– A que preço? – perguntou, por pura curiosidade.

Anton aproximou-se da poltrona que havia junto do sofá e, depois de pedir permissão com o olhar, que ela concedeu encolhendo os ombros, sentou-se. Mas antes de falar, Zoe adiantou-se:

– Lamento o que disse antes. Fui muito injusta.

– Não se desculpe. Tem o direito de dizer o que sente. Além disso, sabe porque estou aqui.

– Talvez devesse dizer-mo claramente para que não haja mal-entendidos.

Embora não se tratasse de um cessar de hostilidades, Anton viu-o como uma via aberta para a negociação, um terreno onde se sentia muito mais confortável.

– Estou aqui para negociar os termos em que acederia a entregar o bebé a Theo. Pode acompanhá-lo ou, se o preferir, continuar com os seus estudos.

– Diga-lhe que agradeço, mas que Toby e eu não vamos a lado nenhum.

– E se Theo decidisse ir a julgamento para conseguir a custódia do menino?

– Sou a sua tutora legal e duvido que Theo queira a má imprensa que ganharia se me enfrentasse.

– Tem a certeza? – perguntou Anton, olhando para ela fixamente.

– Sim.

Anton era da mesma opinião. Cerrou os dentes e procurou outro ângulo de aproximação.

– Theo não é um mau homem. É teimoso e, às vezes, difícil, mas é honesto e nunca seria cruel com um bebé.

– Mas não foi capaz de enviar um representante ao funeral do seu próprio filho.

– Porque sabia que o expulsaria.

– É possível – disse ela, encolhendo os ombros.

Nesse momento, Toby queixou-se, e ela, deixando o biberão de lado, pô-lo sobre o seu ombro ao mesmo tempo que lhe esfregava as costas. Anton observou-os e, ao observar a fragilidade de ambos, sentiu-se como o mensageiro do diabo, enviado para roubar o bebé.

– O seu avô está muito doente e não pode viajar.

– Vê-se que está doente há vinte e três anos.

Anton não fingiu não a compreender.

– O seu pai…

– Nem pense em culpar o meu pai! – exclamou ela, com olhos cintilantes. – Não está aqui para se defender, portanto mencioná-lo é desprezível.

– Ofereço-lhe as minhas desculpas – disse Anton, imediatamente.

– Não as aceito – replicou Zoe, sentindo que o sangue lhe fervia.

Toby emitiu outro gemido e, deitando-o novamente, Zoe ofereceu-lhe o biberão.

Anton observou-os, fascinado por um instante. Não tinha nenhuma experiência com bebés, mas de onde o observava, aquele bebé era grego dos pés à cabeça: o cabelo preto, a pele cítrica…

– Esse menino merece a melhor vida possível, Zoe – Anton sabia por experiência que era verdade. – Impedir que a tenha porque se recusa a perdoar os pecados do seu avô é de um egoísmo extremo, para além de um erro profundo.

– Porque não fecha a boca e se vai embora? – gritou Zoe, fazendo com que Anton se assustasse e Toby começasse a chorar.

Legado de paixões - O homem que arriscou tudo

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