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Capítulo 3

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– Odeio-o – sussurrou Zoe, antes de respirar fundo para conter as lágrimas e acalmar o bebé.

– Porque sabe que tenho razão – insistiu Anton. – Sabe que não pode manter esta casa e que terá de se mudar para uma ainda mais modesta.

Tocou o seu telemóvel e Anton, dirigindo-se para a cozinha, atendeu com um ar de impaciência. Tratava-se de Kostas, o chefe da sua escolta, que o avisava de que os ânimos começavam a aquecer no exterior.

– Os vizinhos estão indignados – disse Kostas. – Não aguentam a maneira como a sua vida está a ver-se afetada.

Tocou outro telefone. Anton viu Zoe a atender e como empalidecia à medida que escutava.

– Está bem, Susie – resmungou. – Sim, obrigada por me avisares.

– Cada dia é pior – disse Susie, do outro lado da linha. – Não podemos estacionar na nossa própria rua. Batem às nossas portas. Perseguem-nos assim que saímos. Lucy começou a chorar esta tarde porque nos perseguiram ao chegar a casa.

Toby suspirou sobre o seu ombro e Zoe sentiu que as pernas tremiam. Com as pálpebras e o coração pesados, tentou pensar em alguma coisa para dizer a modo de desculpa, mas não encontrou nada. Finalmente, agradeceu que umas mãos de dedos largos tirassem o auscultador da sua mão e desligassem por ela.

– Vá sentar-se – disse Anton.

Em vez de discutir, Zoe voltou para o sofá e ouviu-o a falar atrás dela. Parecia idêntico ao seu pai e Zoe não conseguiu conter o pranto por mais tempo. Nunca se sentira tão desesperada nem tão sozinha. Sentia a falta dos seus pais. Sentia a falta do seu pai a chegar todas as tardes com o fato-macaco de mecânico, sempre sorridente. Sentia a falta da sua mãe, que corria para o receber e para se fundir com ele num abraço. Sentia a falta da alegria e do bem-estar de estarem sentados no sofá, a ver televisão. Mas sobretudo, sentia a falta do amor que tinham partilhado naquela casa modesta e quase sempre desarrumada. Um amor que Toby nunca chegaria a conhecer.

O sofá afundou-se quando Anton se sentou ao seu lado. Passou-lhe um braço pelos ombros e puxou-a contra ele. Toby dormia profundamente.

– Ouve, Zoe – disse ele, adoçando o seu tom e tratando-a por tu pela primeira vez. – Sabes que não podes continuar aqui. A situação é insustentável.

– Manda-os embora – Zoe chorou sobre o seu ombro.

– Eu adoraria poder fazê-lo, mas não tenho poder.

– A tua presença piorou-o ainda mais.

– Então, deixa-me oferecer-te ajuda. Tenho uma casa isolada e protegida à qual podemos chegar numa hora. É uma oferta sem nenhuma condição e sem compromisso de nenhum tipo da tua parte – esclareceu, quando ela se afastou dele. – Considera-a como um refúgio temporário enquanto recuperas antes de continuarmos a negociar.

Anton soube que o ouvia, apesar de não reagir, portanto continuou:

– Pensa bem – ofereceu-lhe um lenço. Proporcionou-lhe um primeiro pequeno triunfo ao aceitá-lo. – Isto não tem nada a ver com Theo. Será o teu refúgio. Eu nem sequer estarei lá porque vou de viagem. Estarás sozinha com Toby.

Anton sabia que não estava a dizer toda a verdade. O seu instinto de predador entrara em ação assim que Zoe Kanellis se mostrara vulnerável.

Zoe tentava convencer-se de que não devia aceitar a oferta de Anton. Odiava-se por não ter contido o choro. Anton sabia como encurralar a sua vítima. Não era suficientemente parva para confiar na sua promessa de que lhe daria um refúgio «sem compromisso» de nenhum tipo. Tinha a certeza de que a atitude compassiva que tinha adotado era fingida e de que o que procurava era ter o controlo da situação.

Mas tinha razão ao dizer que era impossível continuarem naquela casa submetidos à perseguição da imprensa. Bastou pensar no mau momento que Lucy tinha passado para voltar a chorar.

– Tens de me prometer que não me pressionarás – disse, secando o nariz com o lenço.

– Prometo-te.

– E que não dirás ao meu avô onde estou.

Saberia que pronunciara a palavra proibida pela primeira vez: «avô»?

– Isso vai ser difícil, mas tentarei na medida do possível.

– E quando quiser voltar para casa, não me impedirás.

– Palavra de escuteiro – disse Anton.

Zoe levantou o olhar e olhou para ele através das suas pestanas humedecidas. Ele respondeu com uma piscadela e Zoe riu-se. Anton pensou que gostava de Zoe Kanellis e da sua valentia face à adversidade. E também gostava dela noutros sentidos, embora devesse ignorá-los por serem totalmente inadequados.

Mesmo assim, não conseguiu resistir à tentação de lhe fazer outro gesto afetuoso, retirando-lhe uma mecha de cabelo para trás da orelha. Zoe não se alterou. E Anton apercebeu-se da ironia de dois inimigos terem acabado sentados no sofá, entreolhando-se como se fosse impossível quebrar o contacto visual.

Foi ele que desviou o olhar primeiro e levantou-se pausadamente.

– Diz-me o que tenho de fazer – disse, com ar decidido e recuperando a capacidade de reação.

Zoe viu-o a ver as horas e a tirar o telemóvel do bolso.

– Tenho de arrumar algumas coisas de Toby e minhas e preciso de um duche e de mudar de roupa – disse ela, imitando-o para ignorar a confusão súbita que a invadiu.

– Vai e organiza-te – disse Anton. – Eu cuidarei de Toby.

Zoe ia pôr em dúvida as suas habilidades como ama, mas Anton já falava ao telefone novamente. Encolhendo os ombros, saiu da cozinha. Uma parte dela questionava a sensatez de se pôr nas mãos do inimigo, mas não estava em condições de o analisar mais profundamente. Portanto, preparou a bagagem e tomou um duche.

Quando voltou à cozinha, um homem corpulento com fato preto acompanhava Anton. Ambos se calaram assim que ela entrou. Zoe olhou para eles, passando do rosto impassível do recém-chegado, ao de Anton, igualmente ininterpretável. Até os seus olhos pareciam velados.

Aqueles olhos inspecionaram-na de cima a baixo e Zoe pensou ver um nervo a tremer na comissura dos seus lábios, que esboçaram um breve sorriso.

– Este é Kostas Demitris, o meu chefe de segurança – disse Anton.

Voltando o olhar para o outro homem, Zoe inclinou a cabeça a modo de saudação e ele imitou-a.

– Kostas vai assegurar-se de que a tua casa fica segura depois de nos irmos embora – continuou Anton, reclamando a sua atenção. – Se houver alguma coisa que precises e que não possamos levar connosco, diz-lhe e ele pode enviar-ta. E será melhor levares qualquer documento de caráter pessoal.

Zoe queria pedir uma explicação, mas ele adiantou-se.

– Por muitas medidas que tomemos, não podemos ter a certeza de que os jornalistas não tentem entrar à procura de um exclusivo.

Zoe tentou protestar, espantada com a ideia de alguém procurar entre as suas coisas, mas Anton voltou a adiantar-se:

– Só por precaução. Kostas é muito meticuloso.

Ele assentiu com a cabeça e disse:

– Anton está habituado a este tipo de medidas. É o inconveniente de ser uma figura pública.

Os dois homens olharam para ela à espera do seu consentimento e Zoe voltou a questionar-se se fazia bem em ceder o controlo, mas recordou Lucy e, à beira das lágrimas, assentiu. Depois, foi buscar Toby e alegrou-se por, ao baixar-se para pegar nele ao colo, o cabelo lhe esconder o rosto.

Anton inalou o cheiro fresco a maçãs do cabelo brilhante de Zoe e foi-lhe quase impossível manter a sua libido sob controlo, um exercício em que tivera de se concentrar desde que ela entrara na cozinha.

A criatura pálida e abatida de há meia hora não tinha nenhuma semelhança com a beleza espetacular que tinha à sua frente. A blusa de lã feia, as calças de ganga gastas e o cabelo mortiço tinham sido substituídos por um vestido cinzento que deslizava sobre o seu corpo e acabava a meio das suas coxas torneadas e esbeltas. O resto das suas pernas estava coberto por umas meias finas e os seus tornozelos delicados elevavam-se sobre uns sapatos pretos.

– Espero que saiba o que faz – resmungou Kostas a Anton em grego que, com a sua capacidade aguda de observação, percebera o efeito que Zoe tinha sobre ele.

– Concentra-te no teu trabalho – replicou Anton.

– É uma…

– Penso que chegou o momento de dizer que sou bilingue – disse Zoe, num grego fluido, fixando neles os seus olhos azuis como dois dardos. – E espero que saibas o que fazes, Anton, porque se achas que estás a conseguir fazer com que me renda, estás muito enganado.

Zoe viu o rosto de Kostas a toldar-se, enquanto Anton, sem se alterar, se apoiou em atitude relaxada contra o lava-loiça e pôs as mãos nos bolsos. O movimento ajustou o fato ao seu peito musculado, que estava coberto por uma camisa branca imaculada e reluzente de cuja gola pendia uma fina gravata de seda. Uma pontada sensual atravessou a barriga de Zoe à medida que deslizou o seu olhar pelas suas ancas estreitas e pelas suas longas pernas, que acabavam nuns sapatos de couro feitos à mão.

– Então, não odeia todos os gregos? – perguntou ele, divertido, fazendo com que Zoe levantasse o olhar para os seus olhos pretos.

Desviou o olhar com a respiração ligeiramente alterada.

– Isso significaria odiar o meu pai.

– E a ti própria, visto que tens sangue grego – disse ele. E sem mudar de tom, acrescentou: – Kostas, começa a trabalhar.

Ele começou a mexer-se e, como se temesse ficar a sós com um animal selvagem, Zoe apressou-se a perguntar:

– Posso indicar-lhe o que terá de levar? Está tudo no andar de cima, juntamente com a pasta com documentos pessoais.

E saiu atrás de Kostas, deixando Anton, sozinho, com um sorriso a dançar-lhe nos lábios.

Todo o rasto de humor abandonara-o quando se encontraram novamente no vestíbulo meia hora mais tarde.

Kostas estava à frente da porta enquanto ele se encostava à parede e observava Zoe, que tentava abotoar um casaco preto com dedos trémulos. Toby, alheio à tensão que o rodeava, dormia na sua cadeirinha.

Anton sentia um formigueiro constante nos dedos e o desejo de tocarem Zoe para a tranquilizar. Era evidente que agia contra a sua vontade, que na meia hora que passara a assaltara a dúvida e que a única razão por que não mudava de opinião era a perspetiva de um refúgio seguro.

Kostas falou brevemente ao telefone e fez um sinal a Anton. Ele assentiu com a cabeça sem deixar de pensar que estava a mentir, mas desculpando-se na convicção de que fazia o melhor para Zoe e para o bebé.

– O meu carro está estacionado à frente da porta – disse, num tom tranquilo. – Os meus empregados abrirão um corredor para que o alcancemos. Suponho que os jornalistas te assustam, mas o truque é manter o olhar fixo na porta do carro e dirigires-te para ela.

Zoe cerrou os dentes e assentiu para lhe dar a entender que compreendia.

– Tenta recordar que se irão embora assim que nós formos e que os teus vizinhos recuperarão a calma.

Depois de olhar para Toby, que dormitava na sua cadeirinha, Zoe voltou a assentir.

– Posso ocupar-me do teu irmão? – perguntou Anton.

Ela olhou para ele e Anton viu que os seus olhos ardiam de ansiedade e de medo. Sem conseguir conter-se, pousou um dedo sob o seu queixo e levantou-lhe o rosto.

– Confia em mim – disse.

– Muito bem – disse ela, trémula.

A expressão de Anton endureceu ao mesmo tempo que se baixava para pegar na cadeirinha de Toby. Ao levantar-se, olhou para Kostas que, depois dar algumas instruções por telefone, abriu a porta.

Zoe sentiu o coração a acelerar, mesmo antes de sair. Kostas bloqueou a luz que se projetava sobre o alpendre. Anton passou-lhe um braço pelos ombros, puxou-a para si e saíram juntos com passo decidido e a cabeça encurvada. Zoe agiu como lhe tinha instruído e concentrou-se no homem que abria a porta da limusina.

Viu flashes, ouviram-se gritos e sentiu uma multidão a formar redemoinhos.

– O que sente por ser a neta de Theo Kanellis?

– Anton, quando descobriu que não herdaria a sua fortuna?

– É verdade que Theo Kanellis quer o bebé?

Anton protegeu o corpo de Zoe até a deixar sentada, depois tratou da cadeira de Toby e sentou-se. O homem fechou a porta. Zoe abriu os olhos, angustiada e assustou-se quando as pessoas começaram a bater nos vidros, voltando-se para um lado e para o outro para evitar que os flashes a cegassem.

O carro começou a andar, ao olhar para a frente, Zoe viu que o conduzia um motorista que estava separado deles por um vidro.

– Meu Deus! – exclamou, quando ouviu o som das sirenes à frente e atrás. – Temos escolta policial?

– Era a única maneira de sair – explicou Anton.

Zoe agarrou a cadeirinha de Toby e olhou para Anton com os olhos esbugalhados.

– És assim tão importante?

– Somos – corrigiu ele.

Zoe compreendeu pela primeira vez a volta que dera a sua vida. Virando-se, olhou para trás.

– A imprensa vai seguir-nos.

– Não poderão fazê-lo quando estivermos no ar.

– No ar? – perguntou ela, perturbada.

– Sim. Um helicóptero vai levar-nos ao nosso destino. Diz-me o que temos de fazer para que o teu irmão viaje seguro…

«Manobra de distração.» Anton não se sentiu particularmente bem por usar táticas de negociação empresarial, mas tivera de renunciar ao seu sentido do jogo limpo quando tomara a decisão de não deixar a casa sem Zoe e Toby.

Zoe concentrou-se na tarefa, centrando a cadeira do menino e pondo-lhe o cinto de segurança.

– É um menino muito tranquilo – comentou Anton, que observava a manobra.

– Só tem três semanas. Os bebés só comem e dormem, a não ser que se passe alguma coisa – disse ela, baixando-se para beijar o nariz do menino.

Anton admirou mais uma vez a qualidade de ouro líquido do seu cabelo e os seus dedos longos e magros.

– Quem é o homem que há na tua vida? – perguntou, deixando-se levar pela curiosidade.

Zoe recostou-se e deitou o cabelo para trás antes de responder.

– Quem diz que há um homem?

– Fechaste o portão do jardim atrás de alguém que se foi embora precipitadamente e perguntava-me que homem era capaz de fugir em vez de ficar a proteger-te.

Ao pensar em Susie, Zoe sorriu. Embora tivesse tido vários namorados, não tinha mantido nenhuma relação importante nem chegara a sofrer por amor. Mas não tencionava dar essa informação a Anton Pallis.

– Não penso que a minha vida pessoal seja da tua incumbência.

– É se alguém puder vender uma história sobre ela à imprensa.

Zoe apercebeu-se de que se referia à informação que podia ter dado a um amante sobre os segredos familiares.

– E a mulher com quem sais? – perguntou Zoe, contra-atacando. – Seria capaz de vender um exclusivo?

Anton sorriu com desdém.

– Eu não conto segredos. Além disso, perguntei primeiro.

– Eu também não – disse ela, irritada com o efeito que aquele sorriso teve sobre ela. – E se houvesse algum homem, penso que se consideraria deslocado depois de me ver a entrar neste carro contigo.

– Porque não poderia competir com a minha beleza e o meu encanto irresistível? – brincou ele, embora Zoe pensasse que tinha ambas as coisas em abundância.

– Pensava no teu dinheiro e no de Theo. Têm demasiado para surgirem adversários. Embora tenha de admitir – acrescentou, – que os teus atributos físicos te tornam um adversário difícil.

Anton deixou escapar uma gargalhada profunda e Zoe riu-se com ele.

Era a primeira vez que se ria desde o início daquelas semanas terríveis e sentiu-se culpada.

– É a tua vez – disse ela, concentrando a sua atenção nele. – Sais com alguém?

– Não.

– A imprensa diz outra coisa. E a modelo de Nova Iorque?

Anton deu um suspiro fingido de resignação.

– Algumas mulheres adoram publicidade. Acabámos depois de conceder essa entrevista.

– O meu pai diz sempre… – Zoe calou-se bruscamente e olhou para o chão.

– O que costumava dizer o teu pai? – perguntou Anton, com delicadeza.

Zoe ia dizer que o seu pai dizia sempre que os bens materiais não importavam, só o amor. Mas tinha um nó na garganta.

– Encontrei-me com ele algumas vezes – disse Anton. E ela levantou a cabeça. – Eu era muito pequeno e pensava que ele era muito velho, embora só tivesse dezoito anos. Levou-me a jogar futebol, algo que nunca ninguém tinha feito…

Zoe engoliu em seco.

– Nem com o teu pai?

– Tinha morrido no ano anterior. Mal me lembro dele. Viajava muito por negócios e era demasiado importante para brincar comigo. Já chegámos – disse, parecendo aliviado por ter uma desculpa para interromper aquela conversa.

Zoe olhou para a frente a tempo de ver que o carro de polícia que os precedia virava para a direita ao mesmo tempo que a limusina diminuía a velocidade e atravessava um portão. Olhando para trás, viu que os dois carros de polícia bloqueavam o vazio. Atrás deles, viu parar uma caravana de jornalistas que os seguira e viu a frustração nos rostos deles, que saíram dos seus carros a protestar. Aliviada, virou-se para a frente. Mas o alívio desapareceu imediatamente.

– O que é isto? – perguntou, alarmada.

– O nosso próximo meio de transporte – disse Anton.

– Mas… é um avião!

Observando o perfil aerodinâmico do seu avião privado, Anton respondeu:

– É o que parece.

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