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AS FRENTES EM ANOS DE SECA NO SERTÃO

A indústria da seca no Nordeste já foi tema repetido de estudo, questionado, repudiado, julgado, mas nunca punido. Até o início dos anos oitenta era frequente os períodos de seca com o consequente sofrimento do povo nordestino, especialmente dos áridos sertões, Cariri e Curimataú.

Além do estigma da seca tinha o castigo do homem pelo homem. Não era a natureza que maltratava o povo da terra quente e seca. O governo, federal ou estadual, se encarregava de agigantar a miséria humana de um povo.

No início dos anos oitenta a fome transformava gente em vulto, crianças em santos, governos em demônios ou em deuses. A falta do que comer e beber era a Via Crú cis dos exércitos de civis marginalizados pela miséria, onde mergulhavam em atos de saqueamento dos comércios e depósitos públicos de alimentos. Felizmente ninguém era preso ou espancado por tais ações, estava explícito o porquê de assim agir.

O governo enfim ficava “generoso, salvador e bem feitor do povo”. Instituía então as frentes de trabalho, as chamadas emergência, que se iniciava com um saco de feijão-preto, arroz furado, leite em pó, óleo e açúcar.

Em seguida havia o alistamento de homens, mulheres e maiores de 14 anos para trabalharem na construção de barreiros ou açudes em propriedades particulares, isso mesmo, nas propriedades dos amigos do governo, apoiadores do sistema autoritário que vigorara naquele tempo.

Os trabalhadores alistados não eram chamados de operários e sim de cassacos. O vencimento após trinta longos dias de fome eram algumas dezenas de cruzeiros. A condição de emergência perdurava enquanto não houvesse chuva no sertão.

As verbas federais eram administradas pelo exército brasileiro e pelos governos dos estados nordestinos em seca. A SUDENE, que seria a responsável pelo planejamento das frentes de trabalho, só servia para repassar parte das verbas para os estados, pois boa parte delas era desviada pelos políticos corruptos arquitetos e patrocinadores da indústria da seca.

Nos imensos barreiros a multidão de trabalhadores, senhoras, estudantes secundaristas e flagelados da seca cavavam o barro vermelho, transportavam em carrinho de mão até o “balde do açude”. A poeira era tanta que mal se via o que estava a poucos metros à frente. Gripe, pneumonia, alergia e tuberculose eram algumas das doenças que, junto à fome, afligia o sertanejo.

Um trabalho quase escravo, onde a sistemática ruptura do contrato era a chuva, esta, a única e certa indenização que o nordestino tanto esperava.

Em várias regiões havia o alistamento meeiro, o cassaco dava metade do vencimento ao dono da terra e não precisava trabalhar (só em casos de “fiscalização”).

Os políticos que promoviam essa cultura tirana de exploração do homem pelo homem são os mesmos que hoje criticam os programas sociais do governo do PT, onde o socorro social é destinado às crianças que frequentam escolas e sob os cuidados da mãe.

Esses programas sociais não resolveram a pobreza, mas diminuíram e muito a miséria no Nordeste e em outras regiões do País. Milhões de famílias sentem atualmente as mudanças que aconteceram em suas vidas, a cada dia de luta pelo melhor futuro.

As chuvas vieram, as emergências paravam, as correntezas levavam as paredes, ou baldes, dos açudes, não se juntava água e o nordestino continuava pobre, desempregado e as crianças com poucas escolas e de baixa qualidade.

Tempo, o ancião recontando a história

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