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VIII.

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—Esta senhora viveu em Lisboa até aos dezeseis annos. Hoje o mais que póde ter são vinte e dous.


—Só?! Eu calculava trinta e tantos bons, como diz minha tia, quando quer fazer todas as pessoas mais velhas que ella.


—Pois deixemos lá sua tia, que deve ser, pouco mais ou menos, como todas as tias... Vamos com a nossa historia, e depressa, senão adormeço, e o meu curioso amigo perde a occasião de saber quem é a snr.a D. Amelia...


—Isso de modo nenhum—atalhei eu com sobresalto—Prometto não interromper a historia.


—Pois bem. O pai d'esta senhora morreu em Lisboa, e o conselho de familia deliberou que a orphã viesse para a provincia, onde tinha tios, e o seu patrimonio em quintas.


Quando appareceu em * * *, os rapazes fizeram-lhe montaria, e disputaram a primazia no namoro. D. Amelia não aceitava, nem repellia a côrte de nenhum. Tinha o mesmo riso para todos, e fallava a todos com a mesma delicadeza.


Havia alli um rapaz que não frequentava a sociedade de Amelia, porque não frequentava sociedade nenhuma. Fôra educado em Genova, viera de lá aos quinze annos, vivera no Porto até aos vinte e cinco, e quando recolheu á provincia, d'onde sahira de tres annos, com a sua familia que emigrára em 1828, ninguem o conhecia, e elle mesmo não queria conhecer ninguem.


Chamavam-lhe celebre, exquisito, excentrico, orgulhoso, impostor, e não sei que muitas outras lisonjas do charco de certos espiritos, que não podem sahir da pequena esphera de lama, que a natureza lhes deu por homenagem.


D. Amelia viu este rapaz n'um cemiterio: leu um epitaphio que elle mandára abrir na sepultura de seu pai que o deixára em Genova no collegio, e viera morrer em 1836 á patria: comprimentou-o de passagem, respondendo a um distincto cortejo do melancolico poeta; e parece que, desde esse encontro, Amelia transfigurou-se para todos os homens, deu que pensar á sua familia, queria todos os dias visitar o cemiterio, e retirava quasi sempre mais triste, porque muito raras vezes encontrou alli o invisivel extravagante da opinião publica.


—Como se chamava elle? Eu conheço alguns rapazes de * * * que foram meus condiscipulos em logica.


—Não é nenhum dos seus condiscipulos. Já lhe disse que este sujeito veio do Porto para a provincia, com vinte e tantos annos pelo menos. O seu appellido é Côrte-Real, conhece?


—Nada, não conheço; mas ouço fallar todos os dias n'esse rapaz.


—Que ouve dizer?


—Que está em Lisboa, doudo, no hospital...


—O senhor afiança-me isso? Ha que tempo endoudeceu?


—Ha dous ou tres mezes...


—Quem lh'o disse?


—Um medico, meu parente, que o mandou conduzir para a enfermaria dos doudos.


O academico fez-me signal de silencio, e mandou-me ouvir.


—Não ouve?—disse elle.


—Ouço... é alguem que soluça...


—É ella...


—D. Amelia?


—Sim... Ouviu a nossa conversa... Tem ouvidos de tisica...


—É admiravel!... Pois o quarto d'ella não é longe d'este?


—Passam-se tres quartos, mas os repartimentos são de tabique, e eu não me lembrei de tal... Calemo-nos...


—E a historia?... Falle mais baixo, que ella não ouvirá mais nada...


—Agora, é impossivel... Aquelles soluços transtornaram-me a cabeça... Deite-se, e ámanhã fallaremos antes de nos despedirmos...


Scenas Contemporaneas

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