Читать книгу Recordações de um amor - Uma amante temporária - Emma Darcy - Страница 10
Capítulo 6
Оглавление– Dario? Ele abanou a cabeça, tentando voltar para o presente.
– Desculpa… disseste alguma coisa?
– Em que estavas a pensar? – perguntou Maeve.
– Estava a recordar uma coisa…
– A recordar o quê?
– Nada de especial.
– Nada agradável a julgar pela tua expressão. Vais dizer-me em que estavas a pensar?
– Não – respondeu Dario. – Não te interessaria.
– Porque não deixas que seja eu a julgar?
Ele levantou-se para se servir de outro copo.
– Há meses que não uso o iate e estava a pensar que deveria ir a Portofino para ver se está tudo bem.
Maeve não acreditou, mas sabia que ele não ia contar-lhe a verdade. Evidentemente, o assunto estava encerrado.
De momento, talvez. Mas não seria assim para sempre.
Os dias seguintes passaram com total tranquilidade. Demasiada tranquilidade. Embora amável e atento quando estavam juntos, que não era tanto tempo como Maeve desejaria, Dario recusava-se a revelar-lhe detalhes do seu passado.
No entanto, dispunha de algumas informações. Ele tinha um MBA em Direcção de Empresas tirado na Universidade de Harvard e a sua irmã Giuliana frequentara o curso de História na Universidade de Sorbonne. E como se isto não fosse suficiente, o seu cunhado estudara Economia na Universidade de Oxford.
De certo modo era compreensível que a sua mãe se mostrasse tão hostil, pensou Maeve. Uma licenciatura numa universidade pública, que era a única coisa que ela podia mostrar, não se compara a tão impressionantes créditos.
Teria chegado Dario à mesma conclusão?, questionou-se. Pensaria que fora um erro ter-se casado com ela? Seria por isso que não voltara a beijá-la?
O máximo que se permitia era um beijinho na face para lhe desejar boa noite e o resto do tempo mantinha-se distante física e emocionalmente. Por vezes parecia-lhe ver um brilho de desejo nos seus olhos, mas conseguia sempre apagá-lo quando se apercebia de que ela estava a olhar para ele.
De manhã tomava o pequeno-almoço sozinha no terraço, passeava pelo jardim e dava uma olhadela a alguma revista. À tarde dormia uma hora ou duas e, às cinco, tomava um chá com mostazzoli panteschi, uns pastéis recheados que a cozinheira fazia especialmente para ela porque uma vez dissera que os adorava.
De facto, por muito descontente que estivesse com outros aspectos da sua nova vida, a comida era uma coisa da qual não se podia queixar.
À noite vestia-se para jantar com Dario, com uma mistura de nervos e medo. Seria aquela a noite em que descobriria a razão por que sentia aquele vazio no seu interior, como se lhe tivessem arrebatado alguma coisa?
Mas isso nunca acontecia e normalmente ia para a cama antes da meia-noite, esgotada. Ou procurava um escape no sono para não ter de enfrentar os demónios que a perseguiam?
Perguntas, tantas perguntas. E nenhuma resposta.
Além de almoçar e jantar com ela, Dario passava o tempo todo no seu escritório, agarrado ao computador, ou a discutir assuntos da empresa com os seus familiares. Pelo menos, era isso que ela pensava porque nunca lhe contava onde ia nem a convidava para o acompanhar.
Embora também não a deixasse totalmente sozinha porque o pessoal de serviço estava constantemente atento às suas necessidades. Mas, finalmente, farta de esperar, Maeve decidiu pôr as cartas sobre a mesa e deu-lhe a desculpa perfeita durante o almoço.
– Tenho de ir a Milão amanhã.
– Vais a Milão? Óptimo, quero ir contigo.
– Não – respondeu ele. – Acabarias por ficar esgotada. Precisas de repouso…
– Mas se temos um apartamento…
– Aqui temos uma casa e só estarei fora alguns dias. Não quero ter de me preocupar contigo enquanto estou em reuniões.
– E o que é que eu devo fazer entretanto?
– Relaxar e recuperar…
– Não fiz mais nada do que relaxar e recuperar desde que aqui cheguei e estou farta. Não faço mais nada além de deixar passar o tempo quando o que quero é retomar a minha vida onde a deixei antes do acidente.
Dario encolheu os ombros.
– Estás de volta a casa com o teu marido. Isso não é isso suficiente?
– Não, falta-me alguma coisa.
– Imagino que não queiras ter relações com um homem com quem não te recordas de te teres casado.
Na verdade, isso não era de todo verdade. Não se recordava de se ter casado, mas quanto mais tempo estava com ele mais entendia por que se casara com Dario. O seu sorriso fazia com que as pernas lhe tremessem, a sua voz vibrava por todo o seu corpo. E quando a tocava, o seu interior transformava-se em lava ardente.
Depressa percebera que, além de ser um homem muito bonito, também era um homem inteligente, íntegro e decente. Tratava-a com paciência e respeito, esperando que recuperasse completamente a sua memória.
– Não acredites que é fácil viver contigo e não me deixar levar pelos meus instintos mais básicos, Maeve. Sou um homem, não um santo.
Ah, aleluia! Então não era apenas ela, que cada noite na cama desejava não estar sozinha.
– Há mais uma coisa – começou a dizer. – Uma coisa que anda às voltas na minha cabeça, mas que não consigo entender… – ficou com a voz enfraquecida nesse momento e não conseguiu continuar.
– Calma, Maeve.
– Sinto um vazio que nada, nem sequer tu, podes preencher – conseguiu dizer ela uns segundos depois. – Senti-o desde que cheguei a esta casa.
Dario tomou-a entre os seus braços, acariciando o seu cabelo.
– Esforças-te demasiado e, no final, sentes-te frustrada.
– E o que queres que faça? Há um limite e penso que eu cheguei ao limite.
– Tu não gostas que cuidem de ti?
– Será que Napoleão gostava de estar exilado na ilha de Elba?
– Tu não és uma prisioneira, Maeve.
– Mas é como se fosse. Não posso pestanejar sem que alguém se dê conta. E não posso passear livremente pela casa ou discutir o menu semanal com a cozinheira porque «eu não devo fazer tais coisas». Basicamente, estou confinada ao quarto a menos que esteja contigo. É como viver num acampamento militar!
Dario riu, tão relaxado, tão encantador.
– Não pode ser assim tão mau.
Pior, na verdade. Tratavam-na como se fosse uma visita e esse era o problema. Ela não era uma visita, era a senhora da casa ou pelo menos deveria sê-lo. Mas, a única vez que lhe ocorreu entrar na cozinha, a cozinheira tirou-a dali amavelmente, como se fosse uma menina.
– Hoje, por exemplo, quando decidi dar um passeio até ao outro lado do imóvel, uma criada disse-me que não deveria cansar-me tanto. E depois fui encontrando gente… jardineiros, empregados de manutenção, todos me advertiam que não deveria aproximar-me da falésia.
– E o que fizeste?
– Cheguei até ao portão, mas estava fechado. E quando perguntei a um jardineiro porque é que estava fechado, o homem fingiu não me entender, embora lhe falasse em italiano.
– Não me surpreende – disse Dario. – Certamente só fala o dialecto local, que é muito diferente do italiano que tu conheces. Inclusive os italianos têm problemas para se entenderem com as gentes da ilha.
– Dario…
– Queres um campari?
Maeve abanou a cabeça.
– Olha, entendo que queiras evitar que os estranhos entrem no imóvel, mas eu deveria poder sair. Mas até a porta da piscina está fechada agora!
– Eu sei, eu pedi que a fechassem depois da visita da minha mãe.
– Estou aqui há uma semana e estou a sufocar – protestou Maeve. – Sinto-me como um hamster, a correr na roda sem chegar a lugar nenhum.
– O que te parece se tirar a tarde livre e formos dar um passeio de barco pela ilha? Até poderíamos parar na tua gruta favorita para mergulhar. Gostas da ideia?
Gostaria que fosse sincero com ela em vez de ganhar tempo. Porque tinha visto um brilho de angústia nos seus olhos quando lhe contara que sentia um vazio estranho no seu interior e intuía que ele sabia o que o causava. E se pensava que nadar eliminaria a sua angústia, estava muito enganado. Ou Dario lhe dava as respostas que procurava ou encontraria outra pessoa que o fizesse.
Mas depois de se queixar que estava aborrecida e confinada não podia rejeitar o seu convite e talvez indo àquele lugar que, segundo Dario, fora importante para ela, despertasse alguma lembrança.
– Muito bem – suspirou, engolindo a frustração. – De acordo.
Ver Pantelleria do barco deu-lhe uma nova perspectiva da ilha, rodeada de falésias. Algumas das praias eram de pedras, noutras havia enormes rochas de lava que saíam do Mediterrâneo criando lagoas naturais.
Montagna Grande guardava os vales férteis e nas suas colinas cresciam juníperos e urzes.
– Quando o vento sopra de oeste cheira tudo maravilhosamente – disse Dario.
Passaram à frente de várias quintas isoladas e uma minúscula vila pendurada numa falésia com uma gloriosa vista panorâmica. Mas, embora tudo aquilo fosse fabuloso, o homem que estava junto dela fazia-lhe ferver o sangue.
Dario com umas calças escuras e uma camisa branca era uma visão que aceleraria o coração de qualquer mulher, mas com uns calções de banho, com o vento a despentear-lhe o cabelo, era o suficiente para a pulsação de qualquer elemento do sexo feminino disparar.
Sentada ao seu lado no barco, Maeve quase tivera de se beliscar para acreditar que aquele homem era mesmo o seu marido. E que de todas as mulheres que ele poderia ter escolhido, escolhera-a a ela.
O seu peito bronzeado brilhava ao sol enquanto navegava pela costa de Pantelleria, dirigindo o leme do barco com aquelas mãos grandes. Umas mãos que uma vez a tocaram intimamente, pensou.
E a sua boca… teria feito o mesmo? Ou aquela repentina excitação devia-se aos seus próprios desejos?
– Relaxa, Maeve – Dario deve ter interpretado mal a sua expressão pensativa. – Sei o que faço, não vamos encalhar.
– Não estava a olhar para ti, estava a admirar a paisagem.
– Então estás a olhar para o lado errado. Olha para ali – disse ele então, assinalando com a mão para a direita.
Maeve virou a cabeça e deixou escapar um grito de surpresa. A vinte metros do barco havia um grupo de golfinhos a saltar na água.
– Adorava ser como eles. São tudo o que eu queria ser: elegantes, lindos, divertidos.
– Tu também és linda, Maeve. Disse-te isso na primeira noite e não mudei de opinião desde então.
– Não, não entendes. Estou a falar do espírito. Eles têm uma alegria de viver que eu perdi. Estou no limbo… sou uma estranha dentro da minha própria pele.
– Para mim, não és – murmurou Dario, aproximando-se tanto que Maeve podia sentir a sua respiração na cara. – Tu és a mulher com quem me casei.
– Conta-me como nos casamos… foi muita gente ao casamento?
Ele hesitou durante um segundo.
– Não, foi um casamento íntimo.
– Porquê?
– Porque nos casámos em Vancouver. Eu só podia estar lá alguns dias antes de voltar para Itália, de modo que não pudemos organizar uma grande cerimónia.
– Foi uma decisão repentina?
– Mais ou menos. Apanhou-te de surpresa… portanto só tiveste tempo de ir comprar um vestido.
– De que cor?
– Azul, o mesmo tom dos teus olhos.
– E as flores?
– Levavas um ramo de lírios brancos e cor-de-rosa.
– As minhas flores favoritas!
– Claro.
– Quem foi ao casamento?
– Houve duas testemunhas, uma antiga colega tua cujo nome não me recordo e um dos meus sócios.
– Trocámos alianças?
– Sim, de ouro branco, a tua com diamantes.
– E onde estão agora?
– O gerente da clínica deu-me a tua para que a guardasse.
– E a nossa lua-de-mel?
– Foram só alguns dias no iate. Eu não tinha mais tempo.
Maeve olhou para a mão direita.
– Eu gostaria de usar a aliança outra vez. Está em casa?
– Não, estão em Milão. Mas trago-as quando voltar. Por agora temos coisas com que nos entretermos por aqui.
Dario continuou a mostrar-lhe a ilha e, finalmente, ancoraram numa baía tranquila.
Colocaram as máscaras e as barbatanas de mergulho, lançaram-se à água cristalina para desfrutar da fauna marinha da zona: cardumes de peixes moviam-se entre as rochas, estrelas-do-mar agarravam-se às rochas vulcânicas, minúsculos crustáceos escondiam-se nas algas…
Quando se aproximaram da entrada da gruta, Maeve viu uma ânfora antiga, relíquia de algum naufrágio que tivera lugar séculos antes.
Depois de mais de uma hora a mergulhar, o sol começava a esconder-se no horizonte e, cansada e contente envolta numa toalha, Maeve apertou-se contra o ombro de Dario enquanto levantavam a âncora e voltavam para casa.
Como sempre, jantaram no terraço. Nessa noite Maeve vestira-se com particular cuidado antes de se juntar a ele. Embora se tivesse divertido, não conseguira o resultado que esperava. Não se recordava de ter estado ali antes, assim como não se recordava de se ter casado com Dario e estava decidida a não deixar passar outra noite sem fazer algum progresso.
E se para isso tivesse de seduzi-lo, fá-lo-ia. O fim justificava os meios no seu caso… embora não necessitasse de justificação. Afinal, Dario era o seu marido e praticamente admitira sentir-se tão frustrado como ela por não ter relações.
Para essa noite escolhera um vestido verde-jade de corte império. Em contraste com a modéstia da manga longa, o decote em bico, preso por um alfinete de pérolas, era muito atrevido. Simples, mas sofisticado, só teria de acrescentar uns brincos de pérolas e umas sandálias de salto como complementos.
– Lei è una visione, mia bella – Dario sorriu ao vê-la.
– Obrigada.
Era evidente que alcançara o seu objectivo porque Dario esteve prestes a derramar o champanhe que tentava servir em dois copos.
– Imagino que estejas cansada. Senta-te enquanto esperamos pelo jantar.
– Porque é que não tomamos um copo na piscina? – sugeriu ela. – Está uma noite linda; a lua parece uma enorme safira.
– Como queiras – murmurou Dario, pegando-lhe na mão e levando-a para o jardim. – Mas tem cuidado com os degraus, não quero que escorregues.
De repente, teve a visão de uma noite e uma rua empedrada. Mas tal como apareceu, desapareceu com a mesma rapidez. Teria sido a sua imaginação?, questionou-se Maeve, com o pulso acelerado. Ou seria um retalho de uma lembrança, de alguma coisa que ocorrera antes do acidente?
Só havia uma maneira de souber.
– Tenho a impressão de já ter ouvido essa frase.
Dario riu-se, dando-lhe o braço.
– Imagino que a ouviste centenas de vezes.
– Porquê? Não costumo escorregar e cair… pois não?
– Não, claro que não. Andas sobre os saltos altos melhor do que ninguém, mas isso não significa que não tenha de cuidar de ti.
Chegaram à piscina e Maeve aproximara-se da prancha de saltos.
– Onde estavas no dia em que tive o acidente?
– A trabalhar – respondeu ele, depois de aclarar a garganta.
– Não te estou a culpar a ti, Dario.
– Mas eu culpo-me a mim mesmo – disse ele, com voz rouca.
Maeve abriu a boca para dizer que não devia fazê-lo, mas fechou-a imediatamente quando lhe ocorreu uma coisa…
– Estás a dizer que ias a conduzir o carro?
– Não, se fosse eu a conduzir, não teríamos tido um acidente e…
– E o quê?
– E não estaríamos aqui sentados… assim.
– Assim como?
– Como irmãos – respondeu ele. – Como amigos, estranhos que se mostram amáveis um com o outro.
– Não gostas desta situação?
– É claro que não gosto da situação! Que homem gostaria?
Maeve aproximou-se um pouco mais, pondo-lhe uma mão no joelho.
– Então porque é que não fazes nada para mudar isso?