Читать книгу Recordações de um amor - Uma amante temporária - Emma Darcy - Страница 8
Capítulo 4
ОглавлениеPeruzzi não ficaria contente. O neurologista pedira-lhe que respondesse com sinceridade às perguntas de Maeve, mas só sobre as questões que ela queria saber. E dissera-lhe que não devia ter pressa para retomar a relação…
Em teoria, todo isto parecia simples. Na verdade, aplicar os seus conselhos era como caminhar por um campo minado. E beijá-la apressava as coisas. Estava louco de desejo por uma mulher que não o reconheceria se se cruzasse com ele na rua e não sabia como responder àquela última pergunta.
Procurando tempo, disse-lhe:
– Porque é que achas que não fomos felizes?
– Foste tu que me disseste isso.
Infelizmente assim era e Dario desejou ter tido a sensatez suficiente para ter fechado a boca.
– Estávamos prestes a divorciar-nos? – insistiu ela.
Estavam? Só Maeve sabia a resposta a essa pergunta.
– Não – respondeu. Afinal de contas, nenhum dos dois apresentara o pedido de divórcio, não convocaram os advogados para dividir as suas posses ou estabelecer os direitos de custódia sobre Sebastiano.
– Então qual era o problema?
– Um casamento… – Dario procurou uma resposta que estivesse perto da verdade – passa por momentos difíceis.
– Mas estávamos casados há muito pouco tempo; ainda deveríamos estar na nossa lua-de-mel.
Falar da lua-de-mel e das circunstâncias do seu casamento não seria seguir o conselho de Peruzzi…
– Não penses que lá porque estávamos a passar por um mau momento o nosso casamento era um fracasso. Por cada desilusão havia mil alegrias e para mim ter-te de novo em casa é a maior de todas.
– Se te importas tanto comigo, porque é que não me foste ver ao hospital?
– Claro que fui, Maeve. Estive ao teu lado dia e noite durante semanas depois do acidente, rezando para que sobrevivesses.
– Mas depois deixaste de ir. Porquê?
«Porque temos um filho que também estava hospitalizado e que precisava de mim».
– Tu não sabias que eu estava ali e, como não podia fazer nada, concentrei-me no que podia fazer.
– Foste trabalhar para esqueceres o problema, queres tu dizer?
– Sim – mentiu Dario porque não podia contar-lhe a verdade.
– E quando despertei do coma?
– Teria ido ver-te imediatamente, mas o doutor Peruzzi recomendou-me que não o fizesse. Não queriam que nada interferisse com a tua recuperação.
– Desde quando é que ver o marido interfere com a recuperação de uma mulher?
– Desde que ela não se recorda dele.
– Ah, claro – murmurou Maeve.
Dario decidiu levar a conversa para áreas mais seguras.
– Embora te seja difícil, temos de ir devagar. A última vez que falámos, o doutor Peruzzi advertiu-me que não devíamos apressar-nos. Se ele estivesse aqui agora, garanto-te que ficaria horrorizado por ver que não estás na cama.
– Mas há tantas coisas que preciso de saber!
– E temos muitos dias para descobrir tudo isso. Agora tens que descansar.
Quando chegaram a casa, Dario deu-lhe um beijo casto na face, mas até essa carícia o excitou. O tecido do vestido sussurrava-lhe como um convite, recordando-lhe a pele suave e cremosa que havia por baixo dele. E a cor, tão rosada como a meia-noite nos trópicos, fazia com que os seus lindos olhos parecessem cor de ametista.
– Vou lembrar-me do nosso casamento mais cedo ou mais tarde, não é verdade? – perguntou Maeve, com a voz entrecortada.
– Sim, com certeza que sim.
– Prometes-me isso?
– Dou-te a minha palavra – ele sorriu. – Dorme bem. Vemo-nos amanhã.
Quando Maeve desapareceu, Dario entrou no seu escritório e serviu-se de um copo de grappa. O álcool queimou-lhe a garganta, mas não conseguiu saciar o desejo que o consumia.
Não chegara ao topo graças à indecisão, pensou depois, mas utilizando a sensatez e a habilidade para analisar os outros. Ele podia ver a fraqueza, detectar a falta de integridade no oponente. No entanto, Maeve deixava-o cheio de dúvidas.
Ter-se-ia rendido ao beijo porque o desejava tanto como ele ou era uma maneira de suplicar o seu perdão pelo que se passara antes do acidente?
Quando falara de cumprir as promessas e que ele lhe dera a entender que não era assim, a sua angústia teria sido sincera ou enganadora?
Não tinha respostas. Nem para Maeve nem para si mesmo.
Nessa noite sonhou com a sua casa… mas já não era a sua casa mas de outras pessoas. E ela estava em frente à campa dos seus pais, com todas as suas posses guardadas em caixas e baús.
– Parto para não voltar – disse-lhes, – mas estarão sempre no meu coração.
As folhas das árvores mexiam-se com o vento.
– Não podes ir. Este é o teu lugar.
– Tenho de ir – protestava ela, assinalando uma figura à distância. – Ele precisa de mim. Está a chamar-me…
– Não – os ramos das árvores inclinaram-se, enredando-se ao seu redor, afogando-a, retendo-a.
Maeve despertou banhada em suor e com o coração a pulsar descontroladamente. A luz do sol enchia o quarto…
Tentava agarrar-se ao sonho, intuindo que estivera prestes a recordar-se de alguma coisa. Com os olhos fechados, tentava ver essa imagem longínqua, mas as nuvens que ocupavam o seu cérebro depois do acidente fecharam-se de novo, impedindo a visão. Talvez no dia seguinte…
Então ouviu uma pancadinha na porta. Seria Dario?
Nervosa, saltou da cama e correu para a abrir.
– Espera um momento – murmurou, passando as mãos pelo cabelo. Outrora, a sua cabeleira ter-lhe-ia caído sobre os ombros, mas agora não passava de um monte de madeixas rígidas, como se tivesse recebido uma descarga eléctrica.
Quando abriu a porta não se encontrou com o seu marido, mas com Antonia, que trazia uma bandeja com café e fruta fresca.
A governanta sorriu amavelmente enquanto colocava a bandeja numa mesa do terraço. Falava num dialecto italiano tão cerrado que Maeve mal podia comunicar com ela mas, ajudada por gestos, conseguiu entender que o signor tinha tomado o pequeno-almoço horas antes e não estava em casa.
Maeve olhou para o relógio, surpreendida ao ver que eram quase onze horas. Ela estava habituada a levantar-se cedo, mas devia estar demasiado cansada.
Com a chávena de café na mão passeou pelo jardim, parando ocasionalmente para admirar o mar ou provar as uvas pretas e a fruta que Antonia lhe levara.
Onde estava Dario?, perguntava-se. E qual era o significado do seu sonho? Quanto tempo demoraria para recuperar a memória?
Suspirando, decidiu tomar um banho na piscina. Nem sequer tinha de usar biquíni porque estava sozinha na casa e os muros que a isolavam da estrada mediam mais de três metros de altura.
Rapidamente, antes de perder a coragem, tirou a camisa de dormir e lançou-se à água.
Era maravilhoso, como cetim a enredar-se nos seus membros. Maeve percorreu a piscina de um lado ao outro pelo menos oito vezes. Depois, esgotada pelo exercício, começou a flutuar, desfrutando daquela sensação de bem-estar.
Mas, de repente, intuiu que não estava sozinha. Não sabia porquê, talvez um reflexo na água ou por que a porta que dava para a piscina estava aberta quando ela a deixara fechada… ou o frio repentino no ambiente, como se uma sombra ameaçadora se interpusesse entre ela e o sol. Mas nada disso importava; o que importava era que alguém a estava a ver nua.
Maeve meteu-se debaixo da água e nadou para o lado onde estava o intruso. Uma vez ali, ficou numa esquina, ao lado dos degraus, com os braços cruzados sobre o peito e os joelhos levantados.
– É um pouco tarde para te tornares tão modesta, querida – disse a sua inesperada visita, tirando os óculos de sol. – Claro que a modéstia, um dia, foi o teu forte, não foi?
– Eu… não esperava companhia – Maeve sentia-se tão mortificada que desejaria que o fundo da piscina se abrisse, levando-a com ela.
– Aparentemente, não.
– Imagino que nos conhecemos.
A mulher suspirou.
– Infelizmente, sim.
– Estou a ver – murmurou Maeve. Fosse quem fosse, aquela estranha não era sua amiga, certamente. – Lamento dizer que não me lembro de si.
– Eu gostaria de dizer o mesmo, mas não é assim. Eu recordo-me demasiado bem.
– E por alguma razão, não gosta de mim. Posso perguntar-lhe porquê?
– Tu não és uma de nós e nunca serás. Nunca entenderei o que é que o meu filho viu em ti.
Aquela mulher era a sua sogra?
A indignidade do momento, ela a tentar tapar-se diante de um adversário que olhava para ela com ódio, Maeve reviveu um velho desespero.
– Importa-se de me passar uma toalha?
A mulher pegou numa toalha e atirou-a depreciativamente para a beira da piscina. Maeve, sem dizer nada, cobriu-se com ela para sair da água. Como traje não podia comparar-se com o elegante fato da sua sogra, mas era melhor do que estar nua.
– Lamento conhecê-la nestas circunstâncias mas, para evitar que volte a acontecer, talvez, no futuro, possa ter a amabilidade de não aparecer sem avisar com antecipação.
– Ou talvez no futuro – ouviram uma voz masculina – esperes que te convide para vir, mãe.
Ah, perfeito, caso o assunto não fosse já suficientemente humilhante, agora tinha de aparecer Dario.
As mulheres de carácter, lera uma vez, nunca escapavam a um desafio. Mas Maeve, a quem naquele momento não lhe importava o que faziam as mulheres de carácter, foi para a casa.
Tomando a sua mãe pelo braço, Dario levou-a para a entrada da villa, tentando conter a sua raiva.
– Estás zangado?
– Zangado é pouco, mãe. O que está a fazer aqui?
– Garanto-te que as minhas intenções eram completamente inocentes. Só passei para a cumprimentar…
– Disse-te que não viesses – interrompeu ele. – O que lhe disseste?
– Não tanto como deveria.
– Não tens o direito de lhe dizer uma única palavra. Não deves confundi-la. Depois de todas as minhas advertências, como podes fazer-me isto? Em que estavas a pensar?
– Que poderia tê-la julgado mal e, para te agradar, deveria dar-lhe outra oportunidade. Foi só isso, mas ela… estava nua na piscina, a mostrar-se sem vergonha. Podes imaginar?
Claramente. Maeve parecia uma ninfa e se ele tivesse chegado antes da sua mãe teria tirado a roupa para se meter na água com ela.
– Onde está o pecado, mãe? Esta casa é dela.
– Qualquer um poderia tê-la visto… a governanta, as criadas. E o que achas que teriam feito?
– O que tu deverias ter feito, partir e deixá-la em paz.
– Bom, como não tenho o menor interesse em voltar a ver este espectáculo, não penso incomodá-la de novo.
– Não, claro que não – Dario abriu a porta do seu carro. – Lamento muito ter de tomar medidas tão drásticas, mas enquanto a minha mulher estiver a recuperar ficas em tua casa e não vens aqui.
– Estou a ver.
– Estás mesmo? Tens algum interesse em saber o mal que lhe poderias ter causado vindo aqui? Se lhe falaste de Sebastiano…
– Não lhe disse nada sobre a criança. Mas se me desses ouvidos, Maeve partiria daqui sem saber que teve um filho…
– É precisamente por isso que não vais voltar aqui até a minha mulher recuperar a memória – interrompeu Dario.
– E tu, meu filho? Tu poderás afastar-te dela ou voltarás a deixar-te enganar pelos seus encantos uma vez mais?
A mãe dele foi-se embora e Dario abanou a cabeça. Sabia que ela tomara aquilo como um insulto, mas não tinha a menor intenção de deixar que sabotasse o seu casamento.
Maeve não respondeu quando bateu à porta do seu quarto, mas quando a encontrou sentada no terraço, com um vestido em vários tons de cor-de-rosa, parecia uma borboleta pousada sobre a cadeira.
– Bonito vestido – comentou, tentando aliviar a tensão – embora também me agradasse muito o que usavas antes.
Ela deixou escapar um suspiro.
– Lamento muito o que se passou.
– Porquê? Não foste tu que apareceste aqui sem seres convidada.
– Mesmo assim, receio ter causado má impressão. E também reforcei a má opinião que a tua mãe tem de mim. O que fiz para que me odeie tanto?
– Casaste-te comigo – suspirou Dario. – As mães italianas têm dificuldade em aceitar as mulheres dos seus filhos. Mas mudará de atitude quando te conhecer melhor.
– Talvez quando tivermos família…
Dario, que estava a tomar um gole de vinho, engasgou-se.
– Possivelmente – conseguiu dizer, – mas haverá tempo para te preocupares com isso quando estiveres bem.
– Sim, imagino que sim – Maeve mordeu os lábios. – Estive a pensar muito desde ontem à noite.
– Sobre o quê?
– Ontem disseste que gerias o sector da tua empresa na América do Norte. Isso inclui o Canadá?
– Sim, claro. Porquê?
– Alguma vez estiveste em Vancouver? Foi lá que nos conhecemos?
– Estive em Vancouver, mas não nos conhecemos lá.
– Então onde foi?
Dario hesitou. Menos de dez minutos na sua companhia e já estava de novo a atravessar um campo de minas.
– Tu estavas de férias em Itália.
– Sozinha?
– Não, com uma amiga.
– Em que zona da Itália?
– Em Portofino.
– Tu também estavas de férias?
– Poderia dizer-se que sim. Tenho um iate em Portofino e ia lá com frequência com os meus amigos.
– Antes de te casares comigo?
– Claro.
– E conhecemo-nos no teu iate? O que estava eu a fazer ali?
– Não, conhecemo-nos no casino – Dario sorriu ao ver a sua cara de surpresa. – Na mesa da roleta.
– O quê? Mas eu nunca gostei de jogar.
Também não gostava naquela noite, pensou Dario. Por isso pudera afastá-la da mesa e convidá-la para tomar um copo de champanhe. Nessa altura ele era um mulherengo e parecera-lhe divertido passar a noite com uma rapariga tão bonita. O que não esperara era ficar preso a ela para o resto da vida.