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ROSA BRANCA

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Eu amo a rosa branca das campinas,

A branca rosa que ao soprar do vento

Languida verga para o chão pendida.


Como a rosa dos valles, pura e bella

Nos campos da existencia ella floria,

Como a rosa dos valles que inda envolta

No orvalho da manhã, desdobra o calix

Ao sol nascente, perfumando as auras.

A idade das paixões mal despontava

Em seu meigo horisonte. Estava ainda

No declinar da melindrosa infancia,

D'essa quadra feliz em que a existencia

É sonho encantador, em que os momentos

Se deslizam na vida como as aguas

De brando arroio, humedecendo os prados.

Mas quão formosas já, quão seductoras,

Por entre as graças da mimosa infancia,

As graças juvenis lhe transluziam!

Com as socias da infancia ao vêl-a ás tardes

Vagando em seu jardim, vós a dissereis

A açucena viçosa entre as boninas,

Ou, entre os lumes da siderea noite,

A estrella da manhã. E, todavia,

Ignorava o poder de seus encantos:

No mundo que a cercava, outras imagens,

Outros amores não sonhava ainda,

Além de sua mãe que a idolatrava,

De seu pequeno irmão, de suas flôres.


E eu amava aquelle anjo como se amam

Os sonhos d'innocencia d'outra idade,

Ou como essas visões, que nos enlevam,

De mundos d'harmonia a que aspiramos.


Vi-a uma vez, ao descahir da tarde,

No jardim assentada ao pé da fonte,

Olhando o tenro irmão, que em seu regaço

Depozera as boninas que ajuntára.

No regaço tambem, junto das flôres,

Repousava, serena dormitando,

A pomba que ella amava, e que sem medo

Viera procurar tão doce ninho.

Nunca a meus olhos se mostrou tão bella,

Tão cheia d'innocencia. D'alvas roupas

Suas fórmas angelicas cingidas,

Se desenhavam, em gentil contorno,

Nas verdes murtas que o jardim ornavam:

Parecia qual cysne repousando

Entre a verdura, de seu lago á beira.

Uma rosa nevada, como as roupas,

Lhe adornava as madeixas côr da noite,

As formosas madeixas que n'essa hora

Contrastavam mais negras, e mais bellas,

Co'a leve pallidez que reflectia,

Em seu rosto adoravel e sereno,

O clarão melancolico da tarde.

Com terna languidez a face meiga

Recostava na mão, curvado o braço,

Em quanto com a outra ora afagava

Sua pomba querida, ora os cabellos

Compunha ao doce infante, que, sorrindo,

Uma após outra lhe mostrava as flôres.


Ao vêl-a assim formosa, ao vêr o grupo

Que fazia com ella o par mimoso,

A mente arrebatada afigurou-m'a

Celeste archanjo que baixára ao mundo

A recolher as orações da tarde,

E que o infante e a pomba achando juntos,

E a innocencia do céo vendo na terra,

Dos irmãos se esquecêra e alli ficára.


Archanjo d'innocencia, ai foge, foge!

Não te illuda este mundo onde poisaste,

Este mundo fallaz, de ti indigno,

Que tuas azas de brancura estreme

Com seu veneno talvez manche um dia.

Archanjo d'innocencia, ai foge! foge!

Procura teus irmãos, revôa á patria!


E fugiu, e voou. No mesmo sitio,

Uma tarde tambem junto da fonte,

A mãe a foi achar sósinha e triste.

A suas plantas uma rosa branca

Jazia desfolhada: era das flôres

A flôr que mais queria. Ao vêr ao lado

A mãe que idolatrava, estremecêra.

Pobre innocente! receiou acaso

Não poder por mais tempo disfarçar-lhe

Seu cruel padecer. A ardente febre

Lhe devorava o seio, e não gemia.

Mas seu dia chegava... A exhausta fronte

Lhe pendeu sem alento, e immersa em pranto,

No regaço da mãe sumiu a face,

Que já cobria a pallidez da morte.

Tres dias depois d'este a flôr mimosa

Que as grinaldas celestes invejavam,

Cahia desfolhada no sepulchro.


Eu amo a rosa branca das campinas,

A branca rosa que ao soprar do vento

Languida verga para o chão pendida.

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