Читать книгу Eurico, o presbytero - Alexandre Herculano - Страница 19
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ОглавлениеMais de sete seculos são passados depois que tu, oh Christo, vieste visitar a terra.
E as tuas palavras foram escutadas pelos indomaveis filhos da Gothia, e elles ajoelharam aos pés da cruz.
Era que nessas palavras divinas havia uma poesia celeste, a qual as almas rudes mas virgens do septemtrião sentiam casar-se com as suas primitivas virtudes.
Tu evangelisavas a liberdade e condemnavas todo o genero de tyrannia: tu restituias ao valor a sua generosidade, á generosidade a sua modestia; tu revelavas inauditos mysterios no esforço do morrer: a constancia dos teus martyres escurecia a dos nossos guerreiros quando, debaixo do punhal de inimigo victorioso, recusavam confessar-se vencidos.
Tu convertias o amor, esse sentimento delicioso, até então limitado ao goso material da mulher, em um grande e sublime affecto: alargavas o ambito do coração por toda a terra, por tudo quanto nella vive e respira, e davas-lhe para conquistar todas as existencias dos céus.
A generosidade, o esforço e o amor, ensinaste-os tu em toda a sua sublimidade: só nas almas dos barbaros estavam elles em germen. Não para os romanos corrompidos, mas para nós, os selvagens septemtrionaes, era o christianismo. Para estes o evangelho assemelhava-se ao sol que rompe d'além das serras e que illumina, aquece e alegra; para os escravos abjectos dos cesares assemelhava-se ao sol mergulhando-se no mar, que só deixa nos campos escuridão, frialdade e tristeza.
Por isso, emquanto elles voltavam as costas á tua cruz ou a lançavam d'envolta com os idolos nos seus mesquinhos lararios, nós quebravamos no fundo das selvas ou no topo das montanhas as imagens d'Odin, de Thor e de Freda e corriamos a abraçarmo-nos com ella.
Tem compaixão de nós, oh Christo: lembra-te de que os ossos dos que assim o fizeram ainda não são inteiramente cinzas debaixo das lousas; porque só quatro seculos tem passado por cima delles.