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O sol oriental que ora bate ridente no pavimento da igreja afflige a minha alma, porque me parece que, alumiando esta terra condemnada, se assemelha a homem cruel que viesse dar uma risada juncto ao leito do moribundo.


Porque te havia eu de amar, oh sol, se tu és o inimigo dos sonhos do imaginar; se tu nos chamas á realidade, e a realidade é tão triste?


Pela escuridão da noite, nos logares ermos e ás horas mortas do alto silencio a phantasia do homem é mais ardente e robusta.


É então que elle dá movimento e vida aos penhascos, voz e entendimento ás selvas que se meneiam e gemem á mercê da brisa nocturna.


É então que elle collige as suas recordações; une, parte, transmuda as imagens das existencias que viu passar ante si e estampa nas sombras que o rodeiam um universo transitorio, mas para elle real.


E é bello esse mundo de phantasmas aereos, por entre cujos labios descorados não transpiram nem perjurio nem dobrez e a cujos olhos sem brilho não assoma o reflexo de animos pervertidos.


Ahi ha o repouso, a paz e a esperança que desappareceram da terra; porque o mundo das visões cria-o a mente pura do poeta: ella dá corpo e vulto ao que já só é ideal, e o passado, deixando cahir o seu immenso sudario, ergue-se em pé e, pondo-se diante do que medita, diz-lhe:—aqui estou eu!


E este o compara com o presente e recúa d'involuntario terror:


Porque o cadaver que se alevanta do pó é formoso e sancto, e o presente que vive e passa e sorri é horrendo e maldicto.


E o poeta atira-se chorando ao seio do cadaver e responde-lhe:—esconde-me tu!


É lá que esta alma, arida como a urze, sente, quando ahi se abriga, refrescá-la um como orvalho do céu.



Eurico, o presbytero

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