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IV
Thadeu Maria d'Almeida Furtado
Оглавлениеpalavras ditas á beira da campa do fallecido professor
Não é, o que vou dizer, uma biographia, nem um necrologio; representam simplesmente estas despretenciosas palavras como que um
Thadeu Maria d'Almeida Furtado
punhado de saudades espersas sobre a campa, ainda mal fechada, do illustre morto.
Conhecendo-o desde ha muito, tive sempre por elle uma d'essas venerações respeitosas de consideração e amisade, que se tem por aquelles que vivem sempre de cabeça levantada e aos quaes não podem attingir nunca as settas envenenadas da má vontade e da calumnia. E é por isso que hoje não posso deixar de vir dizer aqui algumas palavras a respeito de quem, sempre se fez querido de todos quantos, uma vez só que fosse, d'elle se aproximaram.
Thadeu Furtado foi um dos mais antigos professores de desenho do Porto e dos de mais nomeada; cumpridor dos seus deveres, como poucos, recto nas suas apreciações, como ninguem, quantas vezes fez elle rebentar essas bolhas de balofa vaidade, com que muitos mediocres se julgavam notabilidades, e a quem o publico inculto tecia os mais rasgados elogios; mas, sincero como era, nunca se pejava de dizer as verdades por mais duras que ellas fossem.
Trabalhador incançavel, até ao ultimo dia, em que um desastroso acontecimento o impossibilitou, foi regularmente occupar o seu logar na Academia, onde hoje era secretario e onde em outros tempos fôra professor sapiente.
E inegavelmente é a este trabalhador indefeso, a este morto illustre, que se devem os melhoramentos ultimamente feitos n'aquella casa de ensino artistico.
Quantas e quantas vezes, reclamados esses melhoramentos ao governo, foram elles lançados no rol dos esquecimentos, rol lendario, onde são archivadas todas as cousas uteis do nosso querido Portugal. Mas, Thadeu Furtado, com a sua vontade de ferro, ao saber no Porto o conselheiro Elvino de Brito, então Ministro das Obras Publicas e antigo discipulo da Academia das Bellas Artes do Porto, a elle foi e depois de lhe mostrar, provando de visu a necessidade urgente d'aquelles melhoramentos, conseguiu o que até ali ninguem tinha conseguido. E é portanto a este querido morto que se deve o ser hoje a Academia de Bellas Artes, senão um modelo de escolas para o seu genero, pelo menos um estabelecimento que não nos envergonhará quando mostrado a estrangeiros profissionaes.
E, doa a quem doer esta minha affirmação, mas Thadeu Furtado vae fazer muita falta á nossa Academia.
Como professor foi sempre correctissimo, muito sabido no seu métier, e a prova d'isso está, em que, todos os nossos grandes pintores de ha sessenta annos para cá, foram todos seus discipulos e todos teem manifestado esta mesma opinião.
Não fui seu discipulo, mas fui seu amigo e é unicamente como tal que venho aqui depôr tambem a minha eterna saudade, que é tão grande, como foi a minha consideração e a minha amisade.
E, para terminar esta minha sincera e triste despedida, consenti, meus senhores, que vos manifeste tambem aqui um grande desejo:—Como todos bem o deveis comprehender, uma divida tem a Academia a pagar ao seu respeitavel professor e ao seu incançavel secretario; e essa divida só poderá ser paga perpetuando-lhe a memoria com um monumento digno d'elle. Grato me seria, portanto, saber que os alumnos da Academia de Bellas Artes, reunidos aos professores, lançaram mão da ideia de que seja collocado o busto de Thadeu Furtado nos claustros da mesma Academia.
E, para realisar tal ideia, não terão mais do que fazer fundir em bronze um busto, que a familia do fallecido possue, feito, salvo erro, pelo brilhante estatuario Teixeira Lopes. E assim, como preito de homenagem ao professor morto, ficará ligado ao seu nome o nome d'um professor vivo que é inegavelmente a primeira gloria da esculptura portugueza.—Disse.
Março 1901.
Lenço em rendas—d. maria augusta bordallo pinheiro