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XVI

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Desde essa noite, uma só preoccupação me dominou – dissipar do meu cerebro a imagem do que vira. Quiz, á custa de tudo, esquecer aquillo que me humilhava e esmagava o coração. Como eu me castigava do que fizera! Absurda cubiça de conhecer o que ella tão de siso me escondera, e que eu devia ignorar sempre!

– Oh! não – me dizia eu – nunca mais ouvirei fallar deste homem temivel; nunca mais lhe encontrarei os olhos dominantes; nunca os nossos halitos hão-de encontrar-se na atmosphera da mesma sala; nunca mais, deante de mim, ha-de a mão d'elle apertar a tua, ó mulher serena e docil!

Tres dias depois, quando veio a minha casa, não viu ella em mim mudança alguma. A colera, a pouco e pouco, enchera-me de suas fezes a alma; mas dôr era esta que simulava a quietação da paz.

Com apparencias de socegado, sentia-me ferido de morte. Golpeado no coração, conservava o meu aspecto antigo, como aquelles fructos escarlates cuja pele fina e tenra cobre carne que devora um verme invisivel. E assim, de nada suspeitou Fanny. Todavia, como eu lhe fallava d'ella, de mim, de tudo em summa, excepto do que mais a preoccupava, Fanny parecia esperar anciosa. Por ultimo, no extremo da minha contrafeita eloquencia, propellido pelo anceio de vingar-me d'uma dôr nunca experimentada e cuja causa innocente ella era, lhe disse com amargura:

– Tu queres saber o que eu penso de teu marido, e talvez que te dês por venturosa se o juizo que esperas não lhe fôr desfavoravel. Mas, Fanny, tu nunca has-de saber o sentimento que elle me inspira.

Pareceu-me que, ao ouvir-me estas palavras, todo o sangue do coração lhe refluiu á face. Pobre mulher conciliadora! tanta alegria em chamar-me a sua casa, para me vêr mais a miudo, para me unir a todos os entes doces e queridos que lhe decoravam o coração!..

– D'onde vem essa mudança, Roger? – murmurou ella com penoso esforço.

«D'onde vem?!» exclamei eu infurecido… mas vi-lhe então o rosto innundado de lagrimas; e logo, cahindo a seus pés, abraçando-a pelos joelhos, disse-lhe brandamente:

«É que eu sou horrivelmente desgraçado, Fanny!.. É porque me devoram ciumes…

Ergueu-se de subito, como estupefacta, sem me repellir. Reteve-me ajoelhado, pesando-me sobre os hombros com as mãos: eu permanecia de joelhos, sem a comprehender. Fitou-me por largo espaço, profundamente, explorando os intimos arcanos de minha alma inquieta. Depois ergueu ligeiramente os hombros; e, baixando-se para me apertar a face ao seio, exclamou:

«Filho, meu pobre e querido filho!»

E desde ahi, não tornou mais a fallar, por si mesma, neste assumpto.

Eu, porém, pensava n'elle incessante e dolorosamente, sem poder abster-me de o recordar. Affagava-me então ella, e reprehendia-me. «Perdes o tempo» – dizia-me, sorrindo-me, e abraçando-me, se me eu detinha muito na exposição das minhas tristezas. E seus braços se me inroscavam no pescoço com ameigadora volupia, com a fascinação dos olhos me violentava a olhal-a, com graciosa e morbida ternura collava aos meus seus labios. Mas tudo em vão. Já se não franziam meus labios para saborear beijos d'amor; agora era o confrangerem-se soluçando gemidos.

Fanny: estudo

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