Читать книгу Romanceiro III - João Batista da Silva Leitão de Almeida Garrett Visconde de Almeida Garrett - Страница 6
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CONDE NILLO
So se incontrou este bello romancinho do ‘Conde Nillo’ na provincia de Tras-os-montes e nas ilhas dos Açores. Nas collecções castelhanas é ommisso. Não sei porquê, mas sinto que tem o ar francez ou proençal. Ou talvez normando? Da nossa Hespanha é que elle me não parece oriundo. Tudo isto porêm é sentir; julgar não, que não tenho por onde.
Nillo não é nome portuguez, nem sei que fôsse castelhano, leonez ou de Aragão. De donde será? Ou é corrupção, como tantas, de outro nome? Mas de que nome? Series e series de dúvidas e perguntas ás quaes confesso a minha completa inhabilidade de responder.
Seja como for, o romance é bonito, elegante e gracioso, tem todo o cunho antigo verdadeiro, e não parece dos que mais padeceram na sua transmissão até nós.
CONDE NILLO
Conde Nillo, conde Nillo
Seu cavallo vai banhar;
Em quanto o cavallo bebe,
Armou um lindo cantar.
Com o escuro que fazia
Elrei não o póde avistar.
Mal sabe a pobre da infanta
Se hade rir, se hade chorar.
—‘Calla, minha filha, escuta,
Ouvirás um bel cantar:
Ou são os anjos no ceo[7],
Ou a sereia no mar.’
—‘Não são os anjos no ceo,
Nem a sereia no mar:
É o conde Nillo, meu pae,
Que commigo quer casar.’
—‘Quem falla no conde Nillo,
Quem se atreve a nomear
Esse vassallo rebelde
Que eu mandei desterrar?’
—‘Senhor, a culpa é só minha[8],
A mim deveis castigar:
Não posso viver sem elle...
Fui eu que o mandei chamar.’
—‘Calla-te, filha traidora,
Não te queiras deshonrar.
Antes que o dia amanheça[9]
Ve-lo-has ir a degollar.’
—‘Algoz que o mattar a elle,
A mim me tem de mattar;
Adonde a cova lhe abrirem,
A mim me têem de interrar.’
Por quem dobra aquella campa,
Por quem está a dobrar?
—‘Morto é o conde Nillo,
A infanta ja a expirar[10].
Abertas estão as covas,
Agora os vão interrar:
Elle no adro da egreja[11],
A infanta ao pé do altar.’
De um nascêra um cypreste,
E do outro um laranjal;
Um crescia, outro crescia,
Co’as pontas se iam beijar.
Elrei, apenas tal soube,
Logo os mandára cortar.
Um deitava sangue vivo[12],
O outro sangue real;
De um nascêra uma pomba,
De outro um pombo torquaz.
Senta-se elrei a comer[13],
Na mesa lhe iam poisar:
—‘Mal haja tanto querer,
E mal haja tanto amar!
Nem na vida nem na morte
Nunca os pude separar.’