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A MAIOR MÁQUINA DE ESCREVER DO MUNDO

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Stephan estava há talvez um quarto de hora a guiar Žofie-Helene pelo subsolo quando chegaram a uma escada circular que levava a outra tampa de esgoto octogonal perto do escritório da sua mãe. Havia outra saída mais próxima, na mesma rua do seu apartamento, mas era apenas uns degraus metálicos que chegavam até um ralo que pesava demasiado para conseguirem levantá-lo. Saiu para a rua e deu-lhe a mão para a ajudar a subir, embora depois lhe custasse soltá-la. Voltou a tapar a entrada com um pontapé e seguiu-a até ao escritório do jornal da mãe dela, onde havia um homem a usar a maior máquina de escrever que alguma vez vira.

— É um linótipo — explicou Žofie. — É automático, como as máquinas do Rube Goldberg. Compõe os textos para a tiragem do jornal.

— É difícil de aprender? — perguntou Stephan ao tipógrafo, imaginando que conseguiria compor o texto de uma peça com aquela máquina. Para fazer cópias agora, usava papel de decalque e esmurrava as teclas com força, mas, como não podiam fazer-se muitas cópias dessa forma, tinha de escrever para elencos pequenos ou repetir o mesmo texto várias vezes. — Já sei escrever à máquina.

— É impressionante que saibas tanto, Stephan — disse Žofie-Helene.

— Eu sei muito?

— Sobre o subsolo, o fabrico do chocolate, o teatro e escrever à máquina. E gostas de o dizer. Quando falo, as pessoas olham para mim como se fosse um bicho-do-mato. Mas tu és um pouco como o professor Gödel. Às vezes, também dizes que me engano em coisas.

— Disse que te enganaste com alguma coisa?

— Disseste que não podia comer grãos de cacau. E falaste da cave — replicou ela. — Às vezes, digo coisas erradas só para ver quem se apercebe. Quase ninguém percebe.

No escritório da diretora, havia uma menina mais pequena do que Walter a pintar, sentada a uma secretária, enquanto uma mulher que devia ser a mãe de Žofie falava ao telefone.

— Jojo, pintaste-me alguma coisa bonita? — perguntou Žofie, pegando na irmã ao colo e girando com ela enquanto a pequena se ria às gargalhadas. Stephan também quis dar voltas em círculos, embora não gostasse muito de dançar.

A mãe indicou com um dedo que estava prestes a acabar a chamada, enquanto, pelo auscultador, dizia: «Sim, é evidente que o Hitler não vai achar graça, mas também não acho graça às suas tentativas de obrigar o Schuschnigg a levantar o veto ao partido nazi austríaco. E, dado que a minha opinião não vai travar as suas tentativas, tenho a certeza de que não devia permitir que nos impeça de publicar o artigo.» Acabou a chamada e pousou o auscultador. «Oh, Žofie, o teu vestido! Outra vez não.»

— Mãe, este é o meu amigo, Stephan Neuman — apresentou-o Žofie. — Chegámos até aqui da fábrica de chocolate do pai através de…

Stephan lançou-lhe um olhar de aviso.

— O pai dele fabrica os melhores bombons — concluiu ela, em vez disso.

— Ah, portanto, és esse Neuman? — perguntou Käthe Perger. — Espero que nos tenhas trazido alguns desses bombons!

Stephan sacudiu as mãos na aba da camisa e tirou as duas últimas trufas do bolso. Viu que estavam um pouco sujas.

— Meu Deus, era uma brincadeira! — exclamou Käthe Perger. Aceitou uma das trufas antes de conseguir guardá-las e pô-la na boca.

Stephan retirou a sujidade da outra e ofereceu-a à irmã de Žofie.

— Žofie-Helene — disse Käthe Perger —, acho que te superaste em inteligência ao escolher um amigo que não só anda por aí com bombons no bolso, mas, aparentemente, desfruta tanto de lavar a roupa como tu.

Stephan olhou para a roupa, coberta de porcaria. O pai ia matá-lo.

Depois de Stephan se ter ido embora, Žofie disse à mãe:

— É apenas um amigo, mas um é sempre melhor do que zero, embora o zero seja mais interessante em termos matemáticos.

A irmã mais nova entregou-lhe um livro e ela sentou-se e pô-la ao seu colo. Abriu-o na primeira página e leu: «Para Sherlock Holmes, ela é sempre a mulher.»

— Não sei se a Johanna está pronta para um Escândalo na Boémia — queixou-se a mãe.

Žofie adorava essa história, sobretudo, a parte em que o rei diz que é uma pena que Irene Adler não esteja ao seu nível e Holmes lhe dá a razão. O rei quer dizer que a menina Adler não é tão inteligente como ele e Sherlock Holmes quer dizer que é mais inteligente. Žofie também gostava do fim, quando Irene os vence a todos e Sherlock Holmes não quer aceitar o anel que o rei lhe oferece, mas quer a fotografia da menina Adler, para se lembrar de que foi vencido pela inteligência de uma mulher.

— É canhoto — disse Žofie. — Refiro-me ao Stephan. Achas que isso é estranho? Perguntei-lhe uma vez, mas não me disse.

A mãe riu-se e foi um som redondo como o zero lindo no meio de uma linha que se prolonga para o infinito em ambas as direções, a positiva e a negativa.

— Não sei, Žofie-Helene — disse à filha. — Achas estranho ser boa a matemática?

Žofie pensou nisso por uns segundos.

— Não exatamente.

— Talvez os outros achem que és diferente — continuou a mãe —, mas tu és assim, sempre foste. Suponho que aconteça o mesmo ao teu amigo.

Žofie deu um beijo no cocuruto de Jojo.

— Cantamos, Jojo? — perguntou. E começou a cantar, acompanhada de Jojo e também da mãe. — A lua nasceu, as estrelas douradas brilham no céu sem nuvens.

O último comboio para a liberdade

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