Читать книгу Portugal e Brazil: emigração e colonisação - D. A. Gomes Pércheiro - Страница 15

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Diz-nos o illustrado articulista assim com uns modos sentimentaes, em que bem mostra o seu desejo de proteger a Companhia Transantlantica, e por consequencia a emigração, visto que não descobrira ainda o remedio que lhe deva por termo:—«Que não é para admirar que os nossos compatriotas não encontrando trabalho bem remunerado na sua patria, por isso que a offerta é muito maior do que a procura, busquem longe do seu torrão natal onde empregar a sua actividade e receber em troco uma remuneração proporcional aos seus esforços e á sua iniciativa, mais ou menos intelligente e que dêem a preferencia ao Brazil,» etc.

Em vista d'isto vê-se claramente, que o articulista vive das taes phantasias, alimentadas pelos estudos theoricos, que cegam ás vezes as mais robustas intelligencias. O abalisado escriptor é dos taes que vêem um ataque á liberdade quando se escreve contra a emigração ainda quando nos termos em que nós escrevemos; é dos taes que offerecem contra esses ataques as milhares de libras sterlinas com que contribue o Brazil para a prosperidade do Portugal.

O articulista não sabe ou não quer discutir no campo da pratica, não só porque desconhece o grande prejuizo que está causando ao nosso paiz a falta de braços, como porque desconhece tambem a remuneração que se costuma dar ao trabalhador de Portugal e ao do Brazil. A remuneração que elle acha proporcional aos esforços do trabalhador de lá, é julgada apenas pelo principio natural de que os campos virgens da America são mais ferteis. Porém, contra esta verdade esquece outras, que inutilisam completamente os esforços do trabalhador europeu, no Brazil.

A remuneração offerecida ao trabalhador, ao contrario do que avança o articulista, é mais proporcional entre nós do que no imperio, como já tivemos ensejo de demonstrar em outro logar; porque alem da impossibilidade de poder trabalhar debaixo d'um sol ardentissimo, se o colono portuguez tem a felicidade de resistir ás epidemias do Brazil, que costumam atacar o europeu recem-chegado, falta-lhe com tudo os meios de poder estabelecer-se na lavoura, meios indispensaveis, como são os instrumentos agricolas e um pequeno capital para a compra de terrenos. Alem d'isso, a protecção que o Brazil offerece aos colonos é ficticia, porque as leis sobre a agricultura são essencialmente vexatorias. O colono n'esta parte da America, ao contrario do colono estabelecido nos estados do norte, trabalha apenas por supprir as excessivas exigencias do governo. O producto devido á trabalhosa exploração do colono, e que custa maior numero de sacrificios que em qualquer outro paiz, fica ainda assim sujeito a um sem numero de taxas, quando precisa exportal-o.

Essas leis que tinham a sua razão de ser no tempo da escravatura, porque então o trabalho era excessivamente mais barato, como mais adiante demonstraremos, não podem mais existir para o trabalho lívre, que ha de necessariamente subir de valor, e assim reunido aos direitos de exportação, tornarão o genero tão caro, que jámais poderá competir com outros iguaes nos mercados consumidores.

Já dissemos em outro logar, que o governo brazileiro pede pelas madeiras 14 p. c. de exportação;[15] e este é, sem duvida, o maior obstaculo que o colono encontra nas terras brazileiras. Por outro lado o governo devia auxiliar o explorador, abrindo-lhe estradas por o sertão, e sendo possivel desimpedir os rios, as melhores vias de communicação para o interior.

Mas os homens d'estado do Brazil nada mais enxergam a não ser a necessidade de dinheiro; e para obtel-o auxiliam os engajadores, na persuasão de que a muita quantidade de colonos europeus lh'o levará. Porém o engano é manifesto, porque o colono dos nossos paizes logo que chega ao Brazil, onde vê desenrolar-se o panorama de desgraças que os engajadores lhe esconderam, se a febre amarella lhe dá tempo para isso, só trata (e então o numero dos que escapam ao flagello é limitadissimo) de procurar o trabalho á sombra, despresando o que costumava ser desempenhado pelos filhos de Africa, trabalho que ainda assim não daria as riquezas que ahi vemos chegar quasi todos os dias do Brazil.

Não querem ouvir estas verdades os utopistas de lá não obstante terem visto crescer fortunas fabulosas á sombra da escravatura. São tão ignorantes como os utopistas de cá, que vêem em cada ricasso vindo do Brazil, qualquer cavador ou ceifador da canna de assucar.

Diz o articulista que a offerta do trabalho entre nós é maior do que a procura. Engano manifesto. Em qualquer ponto de Portugal acontece justamente o inverso do que avança o protector da emigração. E no Alemtejo especialmente a procura é permanente.

A viticultura, que n'esta vastissima provincia cresce de dia para dia, a cultivação de cereaes e de olivedo, entretem não só os alemtejanos, mas ainda muitas centenas de braços dos filhos das nossas provincias do norte. Não obstante, esta concorrencia é ainda muito diminuta, e por isso muito bacello ficou por plantar em 1876, em que os preços das cavas chegaram em muitos logares a 500 réis.

As ceifas foram morosas n'este mesmo anno, como quasi sempre, pela falta de braços, empregando-se, como tivemos occasião de vêr, muitas mulheres em tão arduo serviço. Em alguns pontos d'esta provincia os jornaes subiram a 500, 550 e 600 réis diarios e de comer!

Toda a gente sabe, que no norte a propriedade está mais dividida, e que o trabalhador destina alguns dias para o amanho d'um bocado de terreno que possue e lhe costuma dar um pouco de milho, legumes, vinho e carne, productos estes, que, juntos á pequena recompensa pelo trabalho que executára fóra de casa, lhe fazem augmentar a féria que é sempre mais proporcional que no Brazil. Os filhos das provincias do norte, que não possuem estas courellas, são geralmente aquelles que no verão procuram o trabalho nas provincias da Extremadura e Alemtejo, onde os lavradores lhes pagam bem para passar o resto do anno, como já fica demonstrado.

Por isso não vêmos qual é a desproporção apontada pelo articulista do Brazil.

Portugal e Brazil: emigração e colonisação

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