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III

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O colono trabalhador que antes de partir para a America se occupava na cultura dos nossos fertilissimos campos, vae occupar no Brazil o logar de aguadeiro, carroceiro, catraeiro, ou na immensa deversidade de serviços que entre nós costumam fazer os filhos da Galliza. Estes colonos, cujo numero é limitadissimo, porque, como já dissemos, e nunca nos cansaremos de repetir, de 70 a 80 por cento não pódem resistir ao clíma pestilento d'aquella parte da America, ganham apenas para comer e vestir. E sendo economicos, isto é, mettendo na algibeira o que devem dar á barriga, podem juntar algumas dezenas de mil réis no fim de muitos annos. O dinheiro assim grangeado não se converte em letras de cambio, nem tão pouco faz subir os nossos fundos. Esses poucos haveres acompanham o expatriado quasi sempre exhausto de vida.

Ha outro colono—o artista,—que reune mais algumas economias, porque os lucros são outros. Ainda assim o seu salario não só não compensa os sacrificios que soffre no Brazil, mas essa compensação é menos proporcional do que na Europa, especialmente na actualidade.

Dir-nos-hão:—Mas o artista traz dinheiro.

É isso verdade, porque o portuguez que volta á patria envergonha-se de vir com as algibeiras vazias. Porém, por quantas privações passou elle com o fim de sustentar esse capricho?! Ainda assim o facto do artista trazer dinheiro por similhante systema, não é razão para dizermos que o Brazil remunera mais esta especie de trabalho. Se no animo do artista que prefere a patria tivessem actuado as mesmas circumstancias, nós viriamos que as suas economias seriam, quando não superiores, pelo menos iguaes, acrescendo ainda a vantagem que não é para despresar, de viver mais descançado e no goso de mais perfeita saude.

Este e aquelle outro colono, não são propriamente dito, os que induzem, quando voltam á patria, os nossos ambiciosos compatriotas a procurar as riquezas ephemeras do Brazil. Aquella pobre gente raras vezes apparece na povoação que os vira nascer, e quando apparecem é de visita, e por tal fórma ataviados que mais incitam os novos aventureiros.

É preciso notar que o trabalhador e o artista que vêem desilludidos do Brazil, procuram, longe do seu povoado, onde possam exercer a sua industria, sendo certo que o maior numero procura esconder o seu crime nas nossas possessões ultramarinas; porque é crime apparecer pobre na terra em que nascera!...

Ha ainda outro colono, além do trabalhador e do artista—o commerciante—que sae da sua aldeia com a ideia de ser caixeiro no Brazil. É justamente d'estes que não veem lá com bons olhos, porque os naturaes querem o commercio para si. Outros colonos ha, sahidos do commercio, que se fizeram senhores de engenho ou agricultores, a quem a escravatura em poucos annos fez centuplicar os haveres.

As fortunas trazidas para Portugal por estes colonos, tem sido em todas as epochas a varinha magica que tenta os trabalhadores. Esta pobre gente nunca pensou na diversidade de posição d'aquelles, posição que por circumstancias muito superiores ao entendimento do colono trabalhador, lhe traz os taes lucros fabulosos, que se não acham a cozer um sapato, a talhar uma calça, a construir um muro, a estucar uma sala, a carregar uma carroça ou a conduzir um passageiro a bordo d'um navio, ou mesmo a desbravar as terras brazileiras, caso o colono europeu podesse, como já dissemos, trabalhar debaixo do sol ardentissimo dos tropicos.

Porém, d'essas riquezas é que será difficil arranjar de futuro, porque a agricultura no Brazil, a alma do seu prodigioso commercio, tende a definhar-se de anno para anno em vista da falta de braços escravos, os unicos capazes de arrotear aquelles vastissimos campos.

Mas é preciso demonstrarmos essa difficuldade, para que se desilludam os portuguezes, que procuram no Brazil este meio de vida.

Eis o que vamos tentar em breves considerações.

O negro foi em todos os tempos o unico ente capaz de resistir á humidade venenosa que sae das terras brazileiras e ao calor excessivo que ao mesmo tempo sobre ellas assenta. Os primeiros colonos que se estabeleceram no Brazil, viram logo a dificuldade de empregar o europeu no desbravamento d'aquelles terrenos insalubres; por isso chamaram a si, como os mais capazes de resistir ao clima, os habitantes de Angola, Benguella, Cabinda, Moçambique e Congo. Pouco tempo depois começou o commercio da escravatura.

Os homens empregados n'este trafico, levavam os seus navios carregados de bijouterias, d'um valor puramente ficticio, com que na Africa illudiam os regulos. Estes davam em troca os seus subditos, que eram immediatamente mettidos nos porões dos navios. Das costas d'Africa seguiam para America, e não obstante morrerem 20 p. c. no transito! segundo a opinião de Ferdinand Diniz, ainda assim o escravo ficava por um preço excessivamente barato.

Na primitiva o senhor d'engenho comprava o escravo a 150 e a 200 patacas (48$000 e 72$000 réis fracos), ficando-lhe muitas vezes mais barato, se entre elle e o negreiro se estabelecia a permuta de productos agricolas em troca do preto. Nos ultimos tempos em que a escravatura era permittida, chegaram a duplicar e ás vezes a triplicar de preço. Não obstante, o trabalho em que era empregado o negro ficava excessivamente barato. Os productos agricolas devidos a esse trabalho, davam o sufficiente para enriquecer os governos e os senhores da agricultura.

Póde-se calcular, que o preto trabalha 20 anos para seu senhor. Custára-lhe 192$000 réis, quando muito. Junte-se-lhe as despezas que com elle fizera n'esse periodo de tempo—alimentação e vestuario;—aquella composta em geral de farinha de mandioca, carne secca e bacalhau, algumas aboboras e bananas para variar estes alimentos, não esquecendo a carne de baleia, a rapadura do açucar, feita em pão, etc; e este (o vestuario) de pano americano, e alguns riscados de algodão azul e branco, devidos á manufactura ingleza; despesas que podemos orçar em 20 vezes mais do que o custo do negro; isto é 3:840$000 réis, que reunidos áquela soma, prefaz 4:032$000 réis fracos. Estabelecidos assim os calculos, podemos ver quais eram os principais meios da riqueza passada, e quais são aquelles com que se póde contar para a riqueza futura.

Mas para illucidar mais o leitor, comparemos o trabalho do escravo com o do homem livre.

O homem livre não trabalha por menos de 2$000 réis fracos como já tivemos ocasião de dizer. Vinte anos de trabalho a 2$000 réis, representam 14.000$ réis; isto é, mais 9.568$000 réis, por cada trabalhador, contra o proprietario das roças do Brazil!

Havia roceiro que tinha 150 e 200 escravos e que vê em cada um que se liberta, e que vai substituindo pelo braço livre, o prejuizo d'aquela fabulosa soma e seus juros!

A agricultura, por consequencia, ha-de cair infallivelmente, e o commercio e a industria, que vivem exclusivamente d'ella, já vão começando a sentir-lhe os effeitos. Eis a razão da affluencia de capitaes no nosso paiz; capitaes que já não encontram no Brazil conveniente emprego; eis a razão porque o governo brazileiro subsidia, mais do que nunca, as companhias engajadoras; eis a razão porque a maior parte do nosso inexperiente commercio de Portugal e Brazil, que ainda não previu o seu futuro, auxilia tambem os engajadores; eis a razão, finalmente, porque combatemos a emigração para aquelle paiz, quer os colonos se dediquem ao trabalho braçal, ao commercio ou á industria.

Iamos terminar este artigo, quando por acaso deparámos com o seguinte telegramma expedido do Rio de Janeiro pela agencia Havas:

«As sessões das camaras serão prorogadas por mais 15 dias, a fim de se terminar a discussão do orçamento e da reforma da lei eleitoral, e sendo possivel, a da lei de soccorros á agricultura, que se resente da falta de braços e capitaes, e creação de engenhos a vapor centraes agricolas.»

Este documento veiu a tempo de fortificar a nossa humilde opinião a respeito da falta de braços e da saida de capitaes d'aquelle paiz.

O governo promette desde ha muito remediar o mal; mas nós é que não confiamos no seu auxilio, nem vemos que seja facil substituir o negro, ha pouco libertado pelo Brazil.

Portugal e Brazil: emigração e colonisação

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