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Historia
ОглавлениеOs historiadores não são concordes sobre a data precisa em que a bahia do Rio de Janeiro foi entrada pelo primeiro europeu.
Emquanto uns fixam o anno de 1501 como o da descoberta da magnifica perola fluminense, outros affirmam que só no anno seguinte as aguas da poetica Guanabara foram sulcadas por embarcações portuguezas.
Parece mais acceitavel a versão de que o dia 1 de Janeiro de 1502 auxiliou o almirante lusitano Gonçalo Coelho a lançar as ancoras dos seus tres navios nas profundidades guanabarinas.
O navegador dirigia-se da Bahia de Todos os Santos a explorar a costa meridional da Terra de Santa Cruz. O facto do almirante não dar o nome de um santo ou santa á nova descoberta, como fizera a outros pontos da costa, anteriormente visitados, explica-se, talvez, pela supposição de que a bahia, que occupava, fôsse a foz de um rio, devido á sua configuração e amplitude.
D’ahi o nome de Rio de Janeiro, com que Gonçalo Coelho a baptisou e que ninguem, depois d’elle, se atreveu a mudar.
Tanto no littoral como nas principaes ilhas que enfeitam a bahia, o almirante portuguez encontrou estabelecidos os tamoyos, indios da raça tupy, cujas tabas, ou aldeias, estendiam-se em maior e mais densa quantidade, de Uruçumirim, hoje praia do Flamengo, até Paranapuan, ou seja a actual ilha do Governador.
Gonçalo Coelho continuou a navegar no rumo do Sul, e só 17 annos depois da sua descoberta, a bahia de Guanabara foi entrada por outra expedição europeia, commandada ainda por um portuguez, Fernão de Magalhães, mas ao serviço da Hespanha. D. Manoel, que ao tempo reinava em Portugal, tinha muito que fazer na Europa e para os lados do Oriente, não lhe sobrando o tempo para occupar-se de novas e longinquas descobertas.
Só no reinado de D. João III, seu filho e successor, entrou no Rio de Janeiro a primeira expedição militar portugueza, porque ao rei constára que, desde 1528, os francezes occupavam a bahia e as margens circumvisinhas.
Christovão Jaques commandava a esquadrilha lusitana, de reconhecimento, a que seguiu-se o grosso da expedição, sob as ordens de Martim Affonso de Souza, em 1531. Este desembarcou na pequena praia, fóra da barra, que se estende do morro da Babylonia ao da Urca, e que ainda hoje é conhecida pelo nome de porto de Martim Affonso.
Expulsos os intrusos, o commissario de D. João III, voltou, com as suas caravellas, para a Bahia de Todos os Santos, ficando novamente Rio de Janeiro desguarnecido.
Foi preciso que, vinte e quatro annos depois, em 1555, os francezes voltassem á carga, sob o commando do almirante Nicolas Durand de Villegaignon, para que o rei de Portugal, passados cinco annos, ordenasse a Mem de Sá, terceiro governador geral do Brasil, que expellisse os invasores.
Villegaignon, que sonhára fundar a França Antartica em terras de Santa Cruz, desembarcou á entrada da barra, na ilha da Lage, hoje fortificada, passando a occupar e a guarnecer a ilha de Serygipe, que, desde então, é conhecida pelo nome do almirante bretão, não obstante elle havêl-a baptisado Fort Coligny.
Quando, em 1560, Mem de Sá entrou, com onze navios, o porto do Rio de Janeiro, encontrou os francezes na melhor harmonia com os tamoyos, e reforçados por uma esquadrilha, ao mando de Bois Le Comte. Batidos, os invasores fugiram nos destroços dos seus navios, porém voltaram quatro annos, mais tarde, e estabeleceram-se na actual ilha do Governador, então Moracaia, ou Paranapuan.
D’esta vez foi um sobrinho de Mem de Sá, Estacio de Sá, que partiu directamente de Portugal ao Rio de Janeiro, a fazer frente aos obstinados usurpadores.
Foi em Abril de 1565 que a nova expedição deu entrada na bahia de Guanabara, e depois de reconhecer as fortes posições dos francezes, desembarcou no porto de Martim Affonso. Ahi, entre os morros da Urca e de Babylonia, o oceano Atlantico e a enseada de Botafogo, fundou Estacio de Sá uma povoação, Villa de S. Sebastião, Durante dois annos conservou-se o commandante portuguez n’esta posição, em continuas escaramuças com os francezes e os tamoyos, seus alliados, até que em 18 de Janeiro de 1567, appareceu Mem de Sá com cinco galeões e seis caravellas, bem guarnecidas, em auxilio do sobrinho. Logo tres dias depois, em 20 de Janeiro, os indios e os francezes fôram atacados e destroçados por mar e por terra. Em pleno combate, Estacio de Sá, teve o rosto varado por uma flexa, morrendo trinta dias depois e sendo sepultado na ermida de S. Sebastião.
Para celebrar a victoria, Mem de Sá, elevou a nascente povoação á cathegoria de cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro, resolvendo transferil-a para o actual morro do Castello, sitio mais central e menos accessivel aos ataques dos inimigos.
Realisado este intento, e depois de cercar a nova cidade de muralhas e de fazer erigir no cume da montanha uma capella sob a invocação do orago da localidade, o governador geral regressou á Bahia, entregando o governo do Rio de Janeiro, a outro sobrinho seu, Salvador Corrêa de Sá. Este, alguns annos depois, fez trasladar a ossada do primo, da velha ermida, junto do Pão de Assucar, para a capella-mór do novo santuario. Cobre o tumulo uma lapide, com os seguintes dizeres:
«Aqui jaz Estacio de Sá Capitão e conquistador d’esta terra e Cidade. E a campa mandou fazer Salvador Corrêa de Sá, seu primo, segundo capitão e Governador, com suas armas. E esta capella acabou no anno de 1583».
A inscripção esquece-se de mencionar o principal titulo e a gloria immortal da pessôa a quem se refere—a de fundador do Rio de Janeiro. Da sua leitura conclúe-se que Estacio de Sá conquistou a cidade, o que não é verdade.
Salvador Corrêa de Sá, que governou durante trinta annos e morreu na idade de 113 annos, teve a habilidade de transformar os tamoyos em amigos dos portuguezes, e a tal ponto que o chefe indigena Ararygboia, foi o seu principal auxiliar nas luctas que teve de sustentar com os francezes, que não podiam conformar-se com a ideia de dar de mão á sua sonhada colonia Anctartica.
Taes foram os progressos da nova cidade, e tambem das suas immediações que, em 1608, o governo de Lisbôa elevou-a á cathegoria de governo geral, comprehendendo as capitanias de S. Paulo, do Espirito Santo e do Rio de Janeiro.
Depois da audaciosa tentativa de Villegaignon, o mais sério ataque dos francezes contra a preciosa perola de Portugal, realisou-se em 1710, sob o commando de Duclerc. Tendo desembarcado, em 11 de Setembro d’esse anno, na praia de Guaratiba, o inimigo conseguiu penetrar até ao centro da cidade, onde foi batido pela pequena guarnição militar, poderosamente auxiliada pelo povo e, especialmente, pelos estudantes. Dos 1:100 invasores, 400 pagaram, com a vida, as velleidades de conquista, entregando-se os restantes á benevolencia dos vencedores.
Quanto a Duclerc, foi assassinado por um desconhecido, seis mezes após estes acontecimentos.
O celebre Duguay-Trouin foi encarregado de vingar a derrota do collega, o que conseguiu, ganhando um combate naval, nas aguas guanabarinas, contra a armada lusitana e obrigando os habitantes da cidade a pagar-lhe um tributo de 610:000 cruzados, cem caixas de assucar e 200 bois.
Quando, em 1733, o conde de Bobadella, general Gomes Freire de Andrade, foi nomeado governador do Rio de Janeiro, esta cidade entrou em activa phase de prosperidades, sendo, em 1762, elevada a capital do Brasil, e recebendo o conde de Bobadella o titulo de vice-rei. No seu governo foi importada, de Cayenna, a planta do café e construido, entre outros melhoramentos, o famoso aqueducto da Carioca.
Desde 1763, anno em que falleceu Gomes Freire de Andrade, até 1808, data da chegada de D. João VI ao Rio de Janeiro, governaram o Brasil, o conde da Cunha, o conde de Azambuja e o marquez de Lavradio.
Com a presença e demora da côrte portugueza, pelo espaço de treze annos, desenvolveu-se extraordinariamente a capital brasileira.
O fugitivo monarcha começou por franquear os portos do Brasil ao commercio de todo o mundo, em 1 de Junho de 1808, memoravel data, cujo centenario foi, no anno passado, celebrado pela Exposição Nacional. D. João VI fundou, no Rio de Janeiro, a Côrte de Justiça, a Academia de Marinha, o Supremo Conselho Militar, a Fabrica de Polvora, o Banco do Brasil, a Escola de Medicina, o Tribunal do Commercio, os Archivos Militares, a Imprensa Real, o Jardim Botanico, a Bibliotheca Nacional, etc. Em 10 de Setembro de 1808, publicava-se a «Gazeta do Rio de Janeiro», primeiro jornal fluminense, impresso em uma typographia da rua dos Barbonos. Foi de 1:200 contos de réis o primeiro capital do Banco do Brasil, inaugurado em 12 de Outubro de 1808, data inolvidavel na prosperidade e grandeza da nação brasileira.
O rei tabaqueiro, na phrase dos seus detractores, que na metropole fizéra má politica e pessima administração, acabando por abandonar a patria ao jugo dos invasores, com a mudança de hemispherio, mudou de temperamento e quiçá de ideias politicas e administrativas, a tal ponto, que a sua viagem forçada á grande colonia sul-americana, assignalou um periodo de assombroso desenvolvimento para o Brasil.
O rei cercou-se de gente de grande valor e de prestigio, tal como Lebreton, membro do Instituto de França, os irmãos Taunay, João Baptista Delbret, Zeferino Ferrez, sabios e artistas do pincel e do escopro e, acima de todos, Grandjean de Montigny, que nos legou a admiravel concepção architectonica da Academia das Bellas Artes, álem de outros trabalhos de que teremos conhecimento.
Em 26 de Abril de 1821, D. João VI regressou a Lisbôa, deixando na regencia do Brasil, o principe D. Pedro, seu filho. Logo no anno seguinte, em 7 de Setembro, andando o regente a viajar por S. Paulo, taes noticias recebeu da côrte de Portugal, inadmissiveis pelas suas exigencias, que alli mesmo, nas margens do Ipyranga, proclamou a independencia do Brasil.
A 30 d’esse mez, apresentou-se o principe no Rio de Janeiro, em um camarote do theatro S. Pedro d’Alcantara, ostentando a legenda—Independencia ou Morte.
Este acto é especialmente notavel por antecipar acontecimentos que forçosamente teriam de realisar-se em breve futuro, devido ao gráu de prosperidade da mais preciosa joia de Portugal e ás absurdas medidas adoptadas pelas côrtes portuguezas, no intuito de contrariar os desejos de independencia, que já começavam a manifestar-se no Brasil. Foi a antiga colonia transformada em imperio e o seu regente em imperador. Este facto teve logar no Rio de Janeiro, em 12 de Outubro de 1822.
Em 7 de Abril de 1831, D. Pedro I foi obrigado a abdicar a corôa em seu filho D. Pedro d’Alcantara, criança de 5 annos, e a retirar-se para a Europa. As principaes causas d’esta resolução foram os actos absolutistas do novo imperador, entre os quaes avultaram a dissolução da Assembleia Constituinte e um vergonhoso tratado celebrado com Portugal. Á abdicação precederam as noites das garrafadas, ou de motins populares, sangrentos para a população do Rio de Janeiro.
Durante o reinado de D. Pedro II, e álem do facto capital da guerra do Paraguay, muitos acontecimentos politicos se deram na capital do imperio, que seria longo e fastidioso enumerar, e augmentariam demasiadamente este capitulo.
Não podemos, todavia, deixar de mencionar o 13 de Maio de 1888 e o 15 de Novembro de 1889, datas, respectivamente, da abolição da escravidão em todo o territorio nacional e da proclamação da Republica dos Estados Unidos do Brasil.
O aureo e glorioso decreto de 13 de Maio, foi assignado por D. Izabel, regente do imperio, ex-princeza imperial e ainda hoje condessa d’Eu, na ausencia de seu pae, o imperador D. Pedro II, que viajava pela Europa. Não obstante os protestos dos conservadores, interessados e tradicionalistas, tal acontecimento foi motivo de grande regosijo para a população fluminense, e teve por immediata consequencia a mudança de instituições politicas, em 15 de novembro do anno seguinte, pelo exercito e pela armada, com o tacito consentimento do povo brasileiro, em geral, e muito especialmente dos habitantes do Rio de Janeiro.
Na presidencia do marechal Floriano José Vieira Peixoto, 2.º presidente da Republica e successor do marechal Manoel Deodoro da Fonseca, teve logar, na bahia de Guanabara, de 1892 a 1894, a revolta da armada, sob o commando do contra-almirante Custodio José de Mello. No espaço de muitos mezes, a cidade do Rio de Janeiro foi bombardeada e muito damnificada, se bem que com a hostilidade da esquadra mais soffresse a sua visinha fronteira, a cidade de Nictheroy, capital do Estado do Rio de Janeiro.
No Arsenal de Marinha, um soldado de infantaria tentou assassinar o dr. Prudente José de Moraes Barros, presidente da Republica, de 1894 a 1898, conseguindo trespassar, com a bayoneta, o marechal Machado Bettencourt, ministro da guerra, que se interpuzéra. Desde então, a paz não tem sido perturbada, na capital da Republica, que Municipio Neutro, por decreto de 1884, e Districto Federal, pela Constituição de 24 de Fevereiro de 1891, conta hoje uma população superior a 900 mil habitantes e, concluidos os melhoramentos que a transformam, por completo, será, indiscutivelmente, a primeira cidade da America do Sul e uma das mais bellas e importantes metropoles do mundo.