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Capítulo Quatro
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— Sir William pediu para vê-la — anunciou Joan sem fôlego enquanto se apressava a entrar no quarto de Eleanor, onde ela se tinha escondido durante a maior parte do dia a jogar às cartas e a observar a chuva implacável lá fora a atirar-se contra a janela, como que a exigir entrar. Bateu outra carta em cima da mesa.
— Porquê? — Não levantou a cabeça. Desde que o seu primo chegou, há uma semana, tinha havido muitas entradas e saídas de pessoas que ela nunca tinha visto, mas ninguém a tinha incomodado. Esperava que se tivessem esquecido de que estava ali, mas claramente que não.
Joan encolheu os ombros.
— Não sei — respondeu a abanar os braços como se quisesse fazer a sua companhia mover-se com mais pressa —, mas foi mais uma ordem do que um pedido, por isso é melhor não o fazer esperar. Sabe como é importante para nós as duas mantermo-nos do lado certo. Estamos agora aqui como suas convidadas. Já não temos quaisquer direitos.
Eleanor aconchegou as madeixas rebeldes do seu cabelo ruivo espesso debaixo da touca de linho e empurrou os pés para dentro dos chinelos de couro macio antes de descer para o salão nobre com passos medidos e firmes. Não havia necessidade de temer um encontro com o primo, disse para si, embora todos os pelos da sua pele se tivessem eriçado em apreensão e a sua respiração trémula desmentisse a sua aparente confiança. Joan tinha dito palavras sábias: estavam agora à mercê do primo e, embora ela odiasse a situação, precisava de se lembrar disso. Sentiu uma tensão no ar como se todos estivessem em posição e à escuta, à espera de que algo de terrível acontecesse, e não gostou.
Encontrou o primo sentado diante da lareira com Lady Margaret. No outro canto da sala, estavam a ser dispostas bandejas sobre a mesa para o jantar e o seu estômago roncou alto. Desde que tinham chegado todos, tinha escolhido comer na cozinha depois das refeições, em vez de no salão nobre, e normalmente já não havia muita comida decente quando chegava a altura de comer. O cheiro acentuado a gordura queimada e a carne assada espalhava-se pela vasta divisão em direção a eles, fazendo-a salivar.
Eleanor fez uma vénia breve e ficou à espera de que William falasse, de olhos fixos no chão.
Ele contraiu ligeiramente a cabeça em reconhecimento.
— Eleanor, finalmente honra-nos com a sua presença.
Ela não conseguiu pensar numa resposta, duvidando que ele tivesse de facto notado, para além da missa, que ela estava ausente o mais frequentemente possível, por isso manteve os lábios cerrados e não disse nada. Estava sentado no cadeirão preferido do pai e Eleanor mordeu a boca por dentro para impedir que as lágrimas ferozes se derramassem enquanto ele indicava o banco ao seu lado e ela se sentava nele. Os juncos, as ervas secas espalhadas nas lajes para o asseio perto do local onde estava sentado estavam húmidas da cerveja derramada e começavam a cheirar mal. Eleanor não pôde deixar de enrugar o nariz em repugnância. O seu pai tinha sido sempre meticuloso em manter as ervas e a lavanda secas e frescas, com um cheiro doce, e aliviou-a ele já não estar ali para ver o que estava a acontecer à sua casa. William pigarreou ruidosamente e ela ficou contente por ver que até Margaret estremeceu com o som repugnante.
— Eleanor, o meu filho Robert chegará dentro de uma semana. É mesmo do que esta casa precisa, de uma família para a encher. Compreende que já não é a sua casa.
Ela abriu a boca para assinalar que ele era agora a família mais próxima que tinha e depois fechou-a de novo sem dizer uma palavra. Percebia pelo seu tom de voz que ela era uma inconveniência a ser descartada o mais depressa possível. Tal como tinha suspeitado. O convento pairava em grande plano no horizonte.
— Felizmente para si, fiz um acordo para que se casasse com Sir Greville Lutton. É um rico mercador e cortesão, com terras vastas em Norfolk e está preparado para a desposar, apesar da falta de dote deixado pelo seu pai.
Horrorizada, Eleanor não abriu a boca para argumentar, ficando em silêncio com o choque. Ficou sentada imóvel sem respirar durante alguns segundos. Casar? Ela? E quem era aquele Sir Greville Lutton de quem ele falava?
Sabia que muitas raparigas se tinham casado aos dezassete anos, mas esperava ser consultada, que lhe tivesse sido dada uma escolha, conforme a sua posição ditava, como o seu pai teria desejado. Como barão que se tinha distinguido na Batalha de Flodden, e que mais tarde tinha sido nomeado alto xerife, era de esperar que fizesse isso por ela. Se não tivesse morrido tão subitamente. Para seu espanto, Sir William acenou a um homem na periferia de um grupo no outro extremo do salão, que se levantou e se aproximou até estar diante de Eleanor, fazendo de seguida uma vénia profunda. Ele estava ali, naquele momento?
— Prima Eleanor, Sir Greville Lutton. — William fez as apresentações como se estivesse supremamente orgulhoso de si próprio. Provavelmente estava, tendo-se livrado com sucesso de uma parente que lhe atafulhava a sua nova casa. Levantou o olhar para o desconhecido. Era consideravelmente mais alto do que William e mais magro, com ombros fortes e largos. Tinha o cabelo preto cortado rente, tal como a barba, e olhava para ela com preocupação. As rugas espalhavam-se a partir dos seus olhos castanhos-escuros e ela quase conseguia distinguir as sobrancelhas pesadas. Parecia consideravelmente mais velho do que ela.
William e Margaret fizeram uma grande demonstração de magia ao desaparecerem para se juntarem aos amigos para jantar, mas de repente o apetite de Eleanor tinha-a abandonado. Em vez disso, achou que podia muito bem vomitar a qualquer momento. Greville sentou-se no lugar que William tinha acabado de desocupar e inclinou-se para a frente, de antebraços pousados sobre os joelhos. A sua jaqueta, gibão e meia-calça eram integralmente em preto, dando-lhe um ar ameaçador.
— Eu sei que isto é um choque para si. — Tinha uma voz profunda, mas surpreendentemente gentil e culta. Mais parecida com a do seu pai do que com a do primo. — Mas não tem nada a temer. Posso dar-lhe um lar seguro e uma boa vida. Sou viúvo e tenho uma filha pequena, a Jane. Tem quase três anos e vive na minha casa em Norfolk. Depois de casarmos, levo-a para lá e espero que aprenda a gostar dela tanto quanto eu. Infelizmente, não posso lá passar tanto tempo quanto gostaria. Tenho negócios a tratar em Londres. Tenho um negócio bem-sucedido de importação de tecidos e especiarias do Extremo Oriente e tenho de passar tempo na corte.
As suas palavras passaram por ela sem que tivesse assimilado nada. Aquele estranho ia ser seu marido e ela não tinha uma palavra a dizer sobre o assunto. Ninguém se importava se queria ou não casar com ele. Eventualmente, deixou escapar a questão mais prevalecente na sua mente.
— Que idade tem, senhor?
Deu um risinho profundo, a partir da garganta.
— Tenho vinte e nove anos — respondeu. — Casei com a minha falecida esposa aos vinte e quatro anos. Ela morreu ao dar à luz. Agora, preciso de uma nova esposa para gerir a minha casa e para me dar filhos. Você é… — Ele fez uma pausa e passou os olhos pela sua figura leve no seu vestido cortado de um monótono algodão pesado castanho-escuro usado deliberadamente para a tornar quase invisível entre os visitantes finamente vestidos, amontoados desoladamente diante dele. — É mais jovem do que eu teria preferido, dado eu ter uma casa e bens que têm de ser geridos na minha ausência, mas suspeito que seja mais forte do que parece. E organizou esta casa para o seu pai, por isso vai sair-se muito bem. Amanhã visitarei o prior, solicitarei a leitura das proibições e estaremos casados dentro de três semanas. Terei apenas tempo suficiente para a acompanhar a Milfleet antes de ter de regressar à corte. E agora, jantar. — Levantou-se e ofereceu-lhe o braço.
Eleanor abanou a cabeça.
— Não quero comer, obrigada, senhor. — Manteve um tom calmo, mas até ela conseguia ouvir a oscilação de angústia na voz. Levantando-se lentamente e mantendo as costas direitas, caminhou cuidadosa e serenamente até às escadas e ao santuário do seu quarto.