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— VAI TER DE ENTRAR para falar com o Max — disse-me, assobiando para o cão logo imediatamente a seguir.

O Thomas olhou desconfiado para a mulher e depois foi direito a ela, dando-lhe um encontrão à passagem. Ela soprou a franja loura para fora dos olhos, um gesto que pareceu tanto transmitir uma frustração bem-humorada como uma reação irónica à minha chegada. — Sou a senhora Mins. Espero que venha a ser um prazer conhecê-la.

Usava argolas douradas nas orelhas — maiores do que eu pudesse achar apropriado para o campo — e vestia um vestido cruzado num tecido de algodão justo. O castanho não seria cor que eu usaria, mas ficava muito bem à senhora Mins. Ela era muito mais velha do que eu, talvez estivesse no início da casa dos cinquenta anos, mas estava muito bem conservada para a idade. Senti um despeito deselegante, apesar de ser pelo menos vinte anos mais nova.

A vaga para ama. Eu não tinha vindo para trabalhar como ama. Tomei conta de crianças quando era adolescente — quem não tomou? — e não tinha qualquer intenção de voltar a fazê-lo. As birras, as refeições caóticas e os minutos a passarem devagar. Não, obrigada.

Mas à medida que os minutos passavam, ficava mais difícil dizer que não. Por que outra razão estaria eu ali? Não tinha de facto uma razão para ter vindo, pelo menos não uma que pudesse anunciar de imediato. Não esperava ser encostada à parede assim. Os avisos do meu pai ecoavam-me ao ouvido: É melhor deixar algumas coisas — algumas pessoas — no passado.

Os meus planos de pura e simplesmente aparecer e de falar com a Sophia pareciam-me débeis, agora que estava ali parada na cozinha. Ela era uma adolescente. Eu não podia simplesmente aparecer e pedir para falar com ela sem acionar toda a espécie de alarmes. Devia ter passado a noite na cidade e orientar-me. Devia ter um plano mais elaborado. Agora era demasiado tarde para isso.

A cozinha era acolhedora e muito mais pequena do que eu tinha esperado pelo tamanho visto de fora. Estava banhada por uma luz suave vinda de umas luzinhas penduradas sobre uma cómoda antiga. Não havia crianças à vista e, ainda assim, havia sinais delas por todo o lado. Era rústica, comparada com a cozinha comercial que eu costumava alugar para testar as minhas receitas, e sem qualquer sinal do equipamento caro e da tecnologia que outrora achava indispensáveis.

Os sinais de um lar feliz estavam por todo o lado: mochilas atiradas para o chão, um cesto de roupa lavada empurrado contra o armário, cadernos de trabalhos de casa abertos em cima da mesa da cozinha. Uma panela respingou ao lume, com a chama tão alta que o molho vermelho se borrifava sem se notar pelo topo do fogão a lenha. A senhora Mins estava à espera de que eu dissesse alguma coisa. — Sim, igualmente — respondi esticando a mão para apertar a dela.

— Vem por causa da vaga para ama? — perguntou com uma pequena faixa de cor a subir-lhe ao decote exposto. Havia medo no tom de voz ou teria sido alguma coisa que imaginei em retrospetiva? A voz do meu pai de novo: Está na hora de cresceres.

Um emprego era crescer, não era?

— Sim. Sim, vim — respondi. O alívio familiar da mentira espalhou-se pelo meu corpo, com o entusiasmo a trazer-me ousadia. Sempre trouxe. Dobro-me e abro o fecho da frente da minha mochila. — Tenho aqui algures algumas recomendações ou chegou a receber aquelas que enviei por email?

— Não se preocupe com isso. Tenho a certeza de que o Max as recebeu. Embora aqui entre nós, ele não lide muito bem com o email. Para além disso, não sei se ele a avisou, mas a ligação à Internet por aqui é um pouco duvidosa.

— Ah, sim, ele disse — respondi agradecida pelos avisos do taxista. Tinha-me ajudado de mais formas do que alguma vez imaginou.

— Venha por aqui para irmos ver o Max. Pode deixar aí a sua mala — disse ela.

Preparei-me para a reunião com o meu tio Max, a perguntar-me quanto é que ele saberia sobre mim ou se saberia sequer que eu existia. Depois do que o meu pai me contou, duvidava até que tivesse lido as cartas.

A agitação inicial da mentira desvaneceu-se e agora vinha a segunda fase: o medo da exposição. A terceira fase podia resultar em duas formas: euforia pela continuação do engano ou a humilhação devastadora de Ser Descoberta. Eram a primeira e a terceira fase que eu achava muito viciantes.

Que outra escolha é que eu tinha? A carta da Sophia levou-me a acreditar que a situação era bastante delicada. Que não tinha ninguém em quem confiar. A sua única opção era alguém que nunca tinha conhecido, do outro lado do mundo. Talvez fosse melhor manter a minha identidade só para mim até perceber qual seria o meu próximo passo, até descobrir porque é que ela se sentia tão desesperada. Esta era a minha única forma de entrar, por agora. Para além disso, eu tinha tomado conta da Ophelia e da Juliet desde que eram pequenas. Conseguia tratar de algumas crianças inglesas pequenas.

A senhora Mins encaminhou-me por um corredor alinhado com arte infantil emoldurada em molduras antigas em folha de ouro. Alguém, no passado, tinha tido o sentido de humor de remover o conteúdo original e substituí-lo pelos desenhos pintados com os dedos, esguichos abstratos de aguarelas, para além de outras fotografias de família. O resultado era uma massa turva de felicidade.

E ainda assim, a Sophia tinha-me mandado a carta. O hotel, outrora famoso e detentor de prémios, parecia estar encerrado. Não havia sinal da Daphne. Não havia sinal das crianças felizes das fotografias. Os alarmes estavam a soar-me naquilo em que me considerava especialista: havia mentiras em todo o lado, se se soubesse o que procurar.

A senhora Mins bateu ao de leve a uma porta fechada. Veio uma voz de dentro e ela abriu-a. A cabeça familiar do Labrador emergiu e voltou a desaparecer.

— Acabámos de receber uma reserva para um casamento em setembro — estava a senhora Mins a dizer enquanto eu fiquei parada atrás dela no corredor escuro.

— De quantos quartos? — perguntou o Max. Não conseguia vê-lo, por isso imaginei-o sentado à lareira a fazer festas na cabeça do Thomas.

— O hotel inteiro.

— Ótimo. Já é qualquer coisa. O que é que está a passar com as ervas daninhas?

— O senhor Mins diz que estão a crescer como loucas no relvado da frente. Mas ele tem um plano.

— Mais alguma coisa?

A esta altura, eu não tinha bem a certeza de que a senhora Mins fosse mencionar a minha presença, de todo. Imaginei-me a ficar presa no corredor, a rondar pela parede de fotografias num limbo nostálgico até que alguém para além do cão reparasse na minha presença.

A senhora Mins entrou no escritório e fechou a porta. Agora tinha ficado mesmo no escuro. Passaram dez minutos. Escutei com atenção, mas as paredes eram grossas e só um murmúrio baixo era percetível. Ainda não havia sinal — audível ou outro — das crianças. Perguntei-me onde estariam e depois lembrei-me de onde estava. Numa casa daquele tamanho podiam estar em qualquer lado. Podiam passar-se dias até me cruzar com elas. Ou será que as vão colocar em parada à minha frente, ao estilo Von Trapp, num hall de entrada qualquer ainda por descobrir?

Quando eu estava a sorrir de forma maliciosa com a ideia, a porta voltou a abrir-se e a senhora Mins mandou-me entrar.

A casa das noivas

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