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DORMI MAL nessa primeira noite em Barnsley. Parecia que tinham passado anos desde a última vez que tinha dormido bem. Desde a chegada da carta da Sophia que eu sentia dificuldade em adormecer e, quando adormecia, era atormentada por sonhos fragmentados constantes. Na maioria das manhãs, acordava antes da madrugada, e naquela primeira manhã em Barnsley foi a mesma coisa. Tinha a cabeça a fervilhar. Queria saber porque é que a Sophia tinha escrito a carta. Queria saber porque é que a Agatha estava numa cadeira de rodas. Queria saber onde é que estava a Daphne. Queria saber o que é que aquilo tudo tinha a ver com a minha mãe. Queria saber o que tinha a ver comigo.

A combinação do jet lag e de tantas perguntas às voltas na minha cabeça fez com que voltar a adormecer fosse em vão. Em vez de tentar combater a insónia, decidi explorar o terreno e conhecer o local.

Já tarde na noite anterior, depois de todos termos comido, a senhora Mins tinha-me levado por um estreito corredor comprido para a ala oeste da casa. Semelhante a um claustro coberto, havia uma fila de cabides e cacifos baixos num dos lados, sendo que o outro dava para o que parecia ser um pequeno jardim de rosas. No final do corredor, uma porta pesada escondia outro pequeno átrio com uma mísera escadaria utilitária que levava até aos quartos no andar de cima.

O meu quarto, uma acomodação pequena, mas confortável, com uma casa de banho privativa, ficava ao lado dos quartos das crianças e do quarto principal. Estava decorado num estilo que eu acreditava ser do início dos anos 1990, com um ar de Laura Ashley, que resultava no facto de todas as superfícies lisas estarem cobertas de folhos de tecidos a condizer. O padrão repetido e o tamanho do quarto criavam um efeito ligeiramente claustrofóbico e perguntei-me se seria de propósito. Alguém tinha colocado lá o meu saco e eu apressei-me a verificá-lo assim que a senhora Mins fechou a porta. Os cadeados estavam intactos.

A ansiedade ainda era evidente na minha expressão na manhã seguinte quando examinei a casa de banho. O jet lag apanhou-me na noite anterior e não tinha sequer escovado os dentes antes de cair na pequena cama. Uma banheira, demasiado curta para estar lá deitada, e um pequeno lavatório de parede estavam encaixados ao lado de uma sanita. Verifiquei atrás da porta em vã busca por um chuveiro, mas não havia nenhum. O meu cabelo, no minúsculo espelho da casa de banho, já estava numa situação desesperada. Perguntei-me como é que iria ficar depois de ser lavado numa banheira. A minha pele tinha um ar macilento, como se já se tivesse aclimatado à pálida luz europeia, translúcida o suficiente para revelar o preto azulado da falta de sono debaixo dos meus olhos. Escovei rapidamente os dentes e tentei evitar o reflexo.

A luz malva filtrava-se pela galeria de janelas no corredor silencioso. Parecia que as crianças ainda estavam a dormir. O Max e a Daphne pareciam não ter apreensão em colocar alguém que mal conheciam em tal proximidade aos seus filhos adormecidos, mas agora enquanto percorria o corredor, vi que o Thomas estava enroscado na sua cama à porta dos seus quartos. Levantou a cabeça quando passei e decidiu que eu não era ameaça iminente.

O Robbie estava estiraçado na sua cama de casal de barriga para baixo, destapado e a ressonar baixinho. Aproveitei para examinar o quarto, que tinha todas as superfícies cobertas de recipientes e caixas meticulosamente etiquetadas. As paredes estavam cheias de pósteres de corridas de cavalos a passarem a linha de meta, do género que os proprietários dos cavalos de corrida eram capazes de comprar. Eu não tinha visto quaisquer estábulos quando entrámos, mas senti que havia bastante de que não me tinha apercebido no escuro.

O quarto da Sophia vinha a seguir. Era uma lixeira completa. Apesar das pilhas de roupa amontoadas em cima da colcha da cama, consegui ver imediatamente que estava vazia. Encontrei-a no quarto a seguir, profundamente enroscada à volta da irmã mais nova. A julgar pela noite anterior, tinha observado que a Sophia protegia ferozmente a Agatha. Observava-me com muita atenção quando eu estava ao pé da irmã mais nova. Perguntei-me se dormiam juntas todas as noites ou se tinha sido só devido à chegada de uma estranha à casa. Podia significar que seria difícil apanhar a Sophia sozinha. Nalgum momento, iria precisar de falar com ela sobre a carta.

Seria por isso que ninguém me tinha contado sobre a Agatha? A proteção não podia ser desculpa. Enquanto a senhora Mins empurrava a Agatha até à cozinha, ela não tinha tirado os olhos de cima de mim por um segundo e, em resposta, eu não tinha desviado os meus da cara da Agatha. Se ela achava que algo como uma criança numa cadeira de rodas me ia perturbar, então tinha-me subestimado. O que me enervou de facto foi o Max não me ter contado. Tinha de haver uma razão qualquer.

Ainda mais desconcertante era a ausência da Daphne. Fazia sentido que ela não estivesse ali para a minha chegada imprevista, mas contava que aparecesse para jantar.

O frio foi um choque depois do calor da cozinha. A apertar o casaco e a puxar as mangas da camisola por cima das minhas mãos, dirigi-me para uma ponta da casa e encontrei-me numa vasta extensão de relvado aberto que se estendia até ao mar. Daquele ângulo, a Casa Barnsley era verdadeiramente espetacular.

Levei a mão ao bolso à procura do telefone, por reflexo. Estava a enquadrar a fotografia, a ajustar o filtro, a pensar como ia ficar tão bem no meu perfil, quase a considerar a legenda antes de me ter lembrado.

Mesmo que houvesse cobertura de rede, não fazia sentido. Ninguém queria saber.

A minha publicação mais popular de sempre tinha sido no dia em que lancei a aplicação. Tive milhares de gostos. Outros influenciadores republicaram a minha fotografia. As mensagens diretas inundaram-me a caixa de correio. Foi incrível. A minha fotografia de Barnsley, cheia de grão e luz matinal, iria desaparecer no vácuo. A única pessoa que se iria importar seria o meu pai e por todas as razões erradas. Guardei o telefone.

Ainda não havia sinais de quaisquer hóspedes e parecia tudo calmo, demasiado calmo. Até àquela hora da manhã havia habitualmente atividade num hotel. Normalmente, os jardineiros estariam cá fora e os funcionários dos serviços de quartos estariam a abastecer os carrinhos para o trabalho da manhã. Ali não havia nada. O local estava deserto, silencioso, para além do som sempre constante das ondas a bater na muralha de rochas atrás de mim.

Todos os cortinados estavam corridos nas janelas do andar de cima viradas para mim, e perguntei-me se seriam os quartos de hóspedes. Encostei a cara contra o vidro da janela panorâmica. Era uma espécie de sala de estar, decorada de forma simples e com bom gosto, numa versão de casa de campo com estilo moderno. Uma grande lareira dominava a outra ponta da sala, de grelha vazia. Ou não havia lume nela há algum tempo ou alguém a tinha limpado recentemente de forma meticulosa. Havia revistas dispostas em cima de uma mesa de centro, mas eu não conseguia ver com clareza suficiente para ler as datas.

Esperando encontrar sinais de vida algures, recuei, a planear espreitar por outra janela. Todos os cortinados estavam corridos, mas um baloiçava ao de leve devido a movimento recente. Tinha a certeza de que estavam abertos apenas há instantes. Alucinação? Imaginação? Noite em branco?

Libertei-me da ideia. Disse a mim mesma que tinha sido só uma ilusão ou uma corrente de ar. Ou finalmente a Daphne. Ou que havia hóspedes, afinal de contas. Talvez alguém tivesse chegado tarde na noite anterior, a implorar por um quarto. Fazia sentido haver hóspedes num hotel. Mais sentido do que qualquer outra coisa que o meu cérebro estava a imaginar naquela manhã.

Havia muito para ver à medida que olhava os terrenos em redor, mas estava mais centrada nos pensamentos sobre as pessoas da Casa Barnsley do que sobre o local em si. Os jardins não eram de modo algum acessíveis a alguém em cadeira de rodas. Perguntei-me como é que a Agatha conseguia. Os caminhos eram constantemente interrompidos por lanços de escadas e os relvados estendiam-se à distância, com inclinações acentuadas. Não havia vedações nem quaisquer rampas.

Até a parte da casa onde ela vivia era apertada, com corredores estreitos quase intransitáveis. O Max tinha-a carregado para a cama na noite anterior, mas ele não podia estar por perto o tempo todo. Parecia que todos, incluindo a própria Casa Barnsley, estavam em negação acerca da imobilidade da Agatha.

Queria saber porque é que a Agatha estava numa cadeira de rodas e há quanto tempo, mas não sabia a quem perguntar. Ao Max estava fora de questão, e parecia desapropriado preocupar as crianças com tais assuntos. Mais do que tudo, queria era saber onde é que estava a Daphne.

A senhora Mins parecia a pessoa óbvia a quem perguntar, mas ela aterrorizava-me. Ao jantar, na noite anterior, tinha-me amplamente ignorado, fazendo-me apenas perguntas acutilantes de vez em quando, que pareciam destinadas a destacar as minhas lacunas mal disfarçadas.

Mesmo então, eu sabia que expor-me mais a ela seria tolo e possivelmente até perigoso. A Sophia não se lhe tinha referido especificamente na carta, e não fazia ideia do grau de proximidade dela com a família, mas tencionava descobrir. Até lá, iria mantê-la à distância.

Infelizmente, no meio daquela casa, eu não parava de ser atirada de novo para o seu caminho. E naquela manhã não foi diferente. Quando saí da ponta oeste do relvado e entrei na horta, lá estava ela, a tratar de um pedaço de terra que até a mim parecia incultivável, completamente inativo. Perguntei-me se estaria a observar-me, pois não havia outra razão para estar ali ao frio, completamente vestida e arranjada, àquela hora da manhã a revirar solo árido.

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